Venice Beach

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— Suas sobrancelhas estão coçando tanto assim, Lia? — Justin cochichou com deboche, acotovelando-me.

Por reflexo eu me afastei mais um passo longe dele e olhei-o de esguelha entre meus dedos. Ele estava me olhando diretamente com uma expressão hilária da junção de "qual é o problema dessa mulher?!" e "que criatura bizarra e exagerada".

— Acho que é alergia ao clima — retruquei carrancuda pela provocação enquanto eu tentava inutilmente cobrir o rosto de forma sutil.

Ele riu, jogando a cabeça para trás em puro regozijo.

Tentei desfazer minha careta e puxar meu cabelo mais para a frente. É claro que ele não se preocuparia em andar no calçadão cercado de uma pequena multidão que tirava fotos, filmava, chamavam seu nome e vez ou outra faziam uma ou outra pergunta corajosa. Patrick estava ao seu lado com um braço estendido na frente como um divisor de águas, ordenando espaço com uma carranca mal encarada.

Eu estava numa situação difícil, não queria chegar muito perto para não dar asas a imaginação fértil da mídia ou atrair ódio para cima de mim — se é que já não havia atraído —, mas não podia ficar muito longe para não ser engolida pela massa que tentava a todo custo se aproximar dele. Num geral, todos deviam estar muito confusos com a minha presença ali e com nosso frequente contato — algumas vezes mais positivo do que em outros — nos últimos dias.

— Ei, por favor, se puderem dar licença — Justin às vezes intervia ao perceber que eu estava mais para trás, fora da sua bolha privada.

Assim, Patrick, o segurança branco alto, com a careca brilhante, olhos castanhos e queixo anguloso, dançava um pouco ao redor da gente, fazendo gestos para tentar proteger também os meus flancos, mas sem nunca deixar Justin totalmente desprotegido. Dali a pouco o homem entraria em colapso, não podia dar conta de fazer tudo sozinho. Eu definitivamente não queria estar ali.

Eu não quisera parar para comermos o bagel quando percebi que estarmos parados na barraca na calçada da praia estava atraindo pessoas, mas eles não se dissiparam depois que voltamos a andar, mastigando o alimento recém adquirido. Para mim foi simplesmente desconfortável estar diante de várias câmeras furtivas enquanto tentava comer a coisa. Eu não sei ser tão elegante assim para me alimentar, tive que redobrar minha atenção.

O clima estava ligeiramente melhor, Justin até puxara sua camisa até o cotovelo. O céu estava praticamente azul diluído em cinza, e embora eu não pudesse identificar claramente o sol, sua luz se infiltrava pela névoa que não deixava nenhuma nuvem se distinguir. A brisa que vinha do mar, contudo, estava gelada, quase atravessava o tecido de minhas roupas para arrepiar meus pelos. Mas o aroma de água salgada e areia fresca era pungente e delicioso, como sempre. As boas vindas cantadas pelas ondas também.

Se eu não estivesse tão apavorada teria realmente aproveitado o passeio. Venice é uma praia extensa, o calçadão grande o bastante para que cinco pessoas possam andar lado a lado, intrometendo-se por vezes entre a areia branca que antecede o mar em longa distância. As palmeiras altas plantadas nas beiradas, lojinhas enfileiras e artistas de rua vendendo bijuterias, pinturas e sua música. Justin dissera que podíamos caminhar até o píer de Santa Monica em 45 minutos. Eu não me importaria de fazer isso, em outras circunstâncias. Eu sabia que havia uma pista de skate em algum lugar por ali também, mas Justin não fizera menção de visita-la.

Ele se aproximou de mim outra vez e eu automaticamente me retraí. Se percebeu o movimento, fingiu ignorar.

— É só mudarmos o ritmo que eles vão ficando para trás — murmurou, tentando me tranquilizar — Quer andar de riquixá? — Apontou para os carrinhos enfileirados nos cantos. Parecia um mesclado débil de bicicleta com uma carroça de duas rodas grandes. Imaginei quanta força o condutor precisaria ter nas coxas para pedalar com o peso de duas pessoas na sua "garupa".

Litigious LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora