Queda Livre

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 Lara levantou as mãos em defensiva, os olhos arregalados de inocência. Não tive tempo de analisar a veracidade da expressão, eles estavam a dois passos de nós. Em combustão, voltei-me para o lado. Com o ar preso na garganta, pensei que não conseguiria dizer uma palavra, estado piorado quando pude contemplá-lo outra vez. Ele resplandecia bom humor, os lábios — meu Deus, aqueles lábios rosados e chamativos — se abriam num sorriso largo, brilhando tanto quanto o cabelo bem penteado da cor dos olhos na luz de fim de tarde. Ele vestia jeans claro, camisa azul escura da Toronto Maple Leafs e um tênis branco grande. A testa se vincava um pouco de curiosidade e o os olhos ternos e empolgados ainda se fixavam em mim.

— Lia — ele murmurou com prazer e estendeu a mão em direção a minha cintura.

Antes que eu pudesse me recompor desse conjunto de percepções abaladoras, ele apalpava a base de minhas costas, puxando-me para perto. O contato com seus dedos firmes acordou as cobrinhas em meu estômago que partiram numa missão homicida de estrangular todos os meus órgãos. Quase sem conseguir reagir, levantei uma mão para apoiar em seu ombro enquanto trocávamos um beijo de cumprimento no rosto — o que na verdade se baseava mais em um breve afagar de bochechas. As minhas injustamente preenchidas por um fluxo maior de sangue.

A tensão física de estreitar o contato era palpável e eu fiquei surpresa com sua intensidade. Fechei a mão livre para manter o autocontrole e me afastei contendo um suspiro, o aroma que partia da pele dele despertava o desejo de tocá-lo com propriedade e inspirar em seu pescoço. Ele manteve o olhar em mim, a profundidade que assumiu fez minhas pernas tremerem.

— Gostei da rosa — gesticulou em direção a minha cabeça, a voz baixa e contida — E da cor — ele fez questão de deixar evidente a atenção às minhas bochechas e repuxou o canto do lábio de maneira adorável.

Franzi o cenho em desaprovação e Justin conteve o riso. Então ele olhou para o meu lado esquerdo, onde Danilo estava, e gradualmente endureceu a expressão.

— Ei — cumprimentou, um breve gesto com o queixo em sua direção para complementar.

Danilo, como sempre, lhe apresentou um sorriso simpático. Só percebi a tensão no movimento porque o conhecia.

— Como vai? — Respondeu.

Justin replicou num singelo aceno de cabeça.

Para me livrar daquele desconforto, que não tinha muita justificativa para acontecer, voltei minha atenção para Ryan, que acabava de abraçar Lara.

— Oi, Julia — passou o braço desajeitadamente pelos meus ombros por breves segundos.

— Ryan.

Nos afastamos e eu olhei diretamente para ele e minha irmã enquanto perguntava num tom de conversa forçado:

— Que coincidência, hein? O que fazem por aqui?

Lara permanecia na fachada da surpresa ingênua, mas Ryan repuxou o lábio como uma criança arteira. Ele apoiou uma mão no ombro de Justin.

— Estávamos querendo sair pra jantar. Eu sugeri esse lugar sabendo que é muito bem frequentado. E aí, cara — ele apertou a mão de Danilo.

Olhei de soslaio para Justin e ele arqueava uma sobrancelha para o amigo. Quer dizer que se dirigira ao local para averiguar "os" clientes que tornavam o espaço "bem frequentado"? Pelo desacordo visível entre os dois, Justin não devia saber que eu estaria ali. E se Ryan combinara apenas com Lara? Espiei minha irmã mais uma vez. Ou, ela desconvidara, mas já havia comentado onde seria e ele resolvera vir mesmo assim.

Cruzei os braços, sentindo certa irritação se sobressair na tempestade de emoções.

— Entendi. Então acho que... — ensaiei uma despedida, mas Lara enroscou o braço no meu.

Litigious LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora