—Mãe! —Gritei ao ver que ela tinha chegado. — Precisamos conversar.
Minha mãe que estava com sacolas em suas mãos me olhou estranho, principalmente pelo fato de estar tomando chá, coisa que eu só tomo quando entro em pânico.
— Tá tudo bem, amore? — largou as sacolas no chão. — Tomando chá de maçã? Já vi que não é coisa boa. — Mamãe trancou a porta e se aproximou de mim.
— Primeiro, desculpa por não ter falado com você e papai ontem, eu dormi e só fui acordar agora. — Meus dedinhos batiam na xícara. — Segundo, saíram os dias de ensaio nas peças e são nas terças e nas quintas. — Mamãe pegou a xícara de mim antes que o líquido quente acabasse me queimando. — Terceiro, acho que tô ficando maluca.
Mamãe estava meio espantada enquanto me olhava.
— Tudo bem por ontem, depois conversamos sobre o ensaio, mas... — Deixou a xícara no balcão e me guiou para sentar ali no sofá. — Como assim está ficando maluca?
Não vou mentir que meu coração só acelerava mais e mais a cada momento, nem sei como estava conseguindo falar na verdade.
— Eu acho que estou vendo coisas, mãe. — Engoli em cedo. — Não coisas estranhas, apesar que são.
Mamãe parecia não entender nada com nada.
— Além disso, meus sonhos estão sendo sinistros de uns dias pra cá.
— Yeh Shuhua... — Mamãe me repreendeu como se achasse que eu estivesse fazendo algo de errado. — Tá usando drogas?
Arregalei os olhos no mesmo momento, dando um pulo no sofá.
— Não! Nunca! — Me apressei em explicar. — É que de uns dias pra cá, eu ando vendo algumas coisas que eu não entendo.
Mamãe me olhava tão curiosa quanto uma criança.
— Uma amiga minha perdeu a irmã a cinco anos em um massacre que teve na escola, e bom... Eu estou conseguindo ver a irmã dela. — Mordi o lábio. — Além disso, consegui saber de coisas sobre essa minha amiga antes mesmo dela comentar, através de sonhos.
Por um momento mamãe ficou séria, não falava nada, travou na posição que estava, o que era muito engraçado mas ao mesmo tempo preocupante, será que eu acabei causando um trauma em mamãe?
— Mãe? — Estralei os dedos na frente dela.
Mamãe piscou três vezes seguidas, antes de respirar fundo e soltar uma risada aliviada.
— Eu achei que fosse mais sério, meu Deus Shuhua! — Me apertou.
— Uai, não vai me dizer nada? — Fiquei confusa.
— Não é novidade nenhuma que você vê espíritos, ficava conversando com a sua tia no quarto, todo mundo te olhava torto enquanto você ria feito uma condenada olhando pro nada. — Por incrível que pareça, mamãe contava isso como se fosse uma coisa extremamente normal.
— E quanto aos sonhos?
Mamãe parou de sorrir, ficando séria e sem saber o que dizer.
— Eu não sei direito te falar como é isso. — Levou a mão ao queixo. — Espíritos, eu vejo também, então posso te ajudar, agora sonhos... Talvez seja uma maneira de se comunicar com eles, talvez, esse espírito que está vendo, não consiga se comunicar no mundo com você, mas consegue te passar as coisas em sonhos, entende?
Eram muitas informações, confesso que tudo aquilo era macabro.
E como assim eu falava com minha tia?
— Muita coisa pra um dia só...
— Mas se esse espírito está tentando falar com você, quer ajuda. — Mamãe tocou meu ombro. — Alguma coisa tá prendendo ela nesse mundo, e deve estár começando a sentir muita dor ou solidão.
— Mãe, eu não entendo essas coisas da sua religião. — Respondi cansada. — Como assim ajuda? Comunicação?
Mamãe respirou fundo antes de disparar a falar.
— Espíritos costumam buscar ajuda quando algo está dando muito errado, como disse, ela já morreu a um tempo, e já era para ter deixado essa conexão e reencarnado, mas algo ou alguém está prendendo a alma aqui, impedindo de voltar para o corpo e descansar em paz. — Mamãe apontou para o antigo local onde ela preservava o espírito do vovô. — Pode ser que alguém esteja fazendo igual eu fiz com seu avô.
Então me lembrei sobre o que Hui disse, Soojin costumava fazer um ritual na casa dos tios, mas quando foi descoberta acabou sendo proibida, e agora mantêm um quarto fechado em sua casa, sem deixar ninguém entrar.
Eu vou entrar, e vai dar muito ruim, anotem isso.
— Entendi. — Parei para pensar um pouco.
— Minha florzinha está virando igual a mamãe! — Se abaixou para apertar minha bochecha. — Minha mini cópia.
Comecei a rir quando ela fez bico, amo demais minha mamãe.
— Obrigada, mãe. — Lancei meu olhar de admiração pra ela.
— Eu te amo, minha filha — Beijou minha testa. — Vai passear um pouquinho, esfriar a cabeça, ok?
Concordei em sair um pouco de casa, colocar os pensamentos no lugar iria fazer bem.
Deixei o celular no quarto, fui de vestido e chinelos mesmo, pouco me importando com meu coque bagunçado e o rosto sem maquiagem alguma.
Caminhei pela pracinha de pedras que tinha ali na frente de casa, sentindo a brisa balançar meus cabelos e desmanchar meu coque.
Algumas pessoas que passavam por ali me olhavam um tanto impressionadas, acho que pela roupa ridícula que usava.
A verdade é que depois daquela conversa, me sentia mais leve, claro que agora teria que consultar minha mãe mais vezes, porém não era problema, minha relação com ela é a melhor possível.
Queria que a da Soojin também fosse assim.
Eu nem percebi quando o sol abaixou, deixando um lindo céu alaranjado, eu me sentei em um banco de frente ao pôr do sol, estava tudo bem tranquilo.
Até que ouvi o som de um ukulele.
E ai eu vi ela novamente, dessa vez, ela não sangrava.
Na árvore um tanto distante do banco que eu estava, Minnie tocava um ukulele.
Sua roupa era outra, tocava uma música romântica, ela sorria enquanto olhava para o nada, parecia um tanto triste, tinha certeza que ela tocava aquela música para sua namorada.
Eu sorri um pouco triste vendo Minnie ali, parecia cansada daquele mundo, mas também estava feliz, pelo menos até o último refrão da música.
Assim que começou a melodia final, alguma coisa começou a se projetar na frente dela, uma imagem de outra pessoa, mas não por completo, estava falhando.
Minnie reconheceu na hora, e parou de tocar, até ela estava assustada com aquilo.
Vi o exato momento em que uma lágrima escorreu de seus olhos, e sua boca fez o movimento exato do nome dela.
"Miyeon"
Então eu entendi que Miyeon não iria mais acordar do coma.
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Lost - Sooshu
FanfictionNÃO ACEITO ADAPTAÇÕES Não recomendado para menores de 16 anos Yeh Shuhua se vê sem amigos ao se mudar para Coréia do Sul, tendo apenas a mãe e o pai para recorrer quando precisa de ajuda, sem ter com quem conversar ou alguém para passar o tempo, Shu...