Depois que Gabo saiu do quarto me joguei de costas na cama, ainda sem acreditar que o mesmo teve a coragem de ditar as tais regras sem ao menos parecer acanhado.Foi como dizem por aí, a cara nem tremeu. Acredita?
Mas nem tudo é girassóis, eu não tive tempo para me recuperar pois mais uma vez bateram na porta, e como eu esperava alguém me chamar para o jantar me levantei animada, estou com fome ué, a mesma morreu depois de meus olhos ver quem era.
Virgínia ainda vestida no vestido preto de saia lápis marcando cada curva magra de seu corpo, reparo que seu salto scarpin branco parece esmagar seus dedos.
Uma única pergunta para você, antes de vir as bombas para cima de mim é claro. Quem usa salto alto em casa? A pessoa tem que ser muito rica ou... não vou ser mal educada.
- Olá, senhora Virgínia. - Digo recebendo um olhar enojado da mesma.
Ela entra no meu quarto antes mesmo que eu dê espaço para tal coisa, esbarrando em mim.
- Esse é nosso melhor quarto de hóspedes. - Ela constata.
- Obrigada por me cederem o mesmo. - Agradeço.
- Não cedi nada garota. - Ela ralha enquanto anda de um lado para o outro, parando para me olhar dos pés a cabeça. - Eu achei que esse estilo tinha ficado no século passado. - O desdém em sua voz ao julgar claramente minhas roupas me deixa nervosa, ao ponto de sentir o meu rosto queimar em raiva.
- Precisa de alguma coisa? - Pergunto tentando manter o tom mais educado possível.
- Vim lhe entregar isso. - Ela me estende uma folha A4 com algumas coisas escritas em uma tabela. - Essas são as regras que você vai ter que seguir se quiser viver aqui, a maioria delas devem ser seguidas à rigor quando o meu marido não estiver em casa, e me chame de senhora Borges. - A mesma sai do meu quarto batendo os pés.
Me encontro um tanto atônita, e com o papel na mão o qual eu ainda não li nenhuma palavra, por alto vejo regras como não poder sair sozinha, não poder usar a piscina, eu nem sei nadar, não falar com os funcionários, essa tem grifado mais a frente quando o doutor Miguel não estiver, assim como a não poder comer sobremesa também.
Uma regra mais maluca que a outra, quem é que nega um docinho?
Depois de um tempo uma mulher que não reconheço finalmente me chama para ir jantar, ela me guia até a cozinha, confesso que quase corro atrás dela pois a mesma anda rápido demais, até cheguei a tropeçar descendo os degraus da escada.
Assim que chego, não na cozinha como pensei, mas sim na sala de jantar que possui um grande lustre e uma mesa com no mínimo doze lugares, um espelho suspenso com uma bancada de fotos da família e aparentemente amigos logo abaixo.
- Boa noite. - Digo assim que os três presentes percebem a minha presença.
- Venha Lola, sente-se, estávamos à sua espera. - Ele aponta para a cadeira ao lado do seu filho que está sentado à esquerda dele.
Logo a mesma mulher que foi me chamar, vem nos servir, mas é claro que não deixei que ela fizesse tudo, não tenho nenhum problema em por a minha comida. Mesmo recebendo um olhar reprovador da Virgínia não me acanho em começar a comer, pois minha fome está maior que o meu medo no momento.
- Já estou cuidando da sua matrícula na escola onde o Gabo estuda, se tudo der certo você começa na segunda. - Doutor Miguel me avisa, então quer dizer que depois desse final de semana estarei indo pela primeira para a escola.
Com conversas paralelas, o jantar ocorre tranquilo, peço licença assim que acabo de comer e meu prato é levado mesmo que a contra gosto, por Karen, sim eu descobri o nome dela.
Sigo o caminho até o quarto que estou ocupando, o decorei mesmo que eu tenha passado correndo pelos cômodos.
Antes de chegar na escada escuto passos atrás de mim, reconheço pelo menos não ser da Virgínia, então me viro para constatar que é o Gabo mexendo no seu celular despreocupadamente, como uma pessoa normal que sou praticamente saio correndo.
Mas o destino adora me tombar, digo, minhas pernas adoram me tombar, pois caio de cara no tapete da sala de estar.
- Uou! - Escuto Gabo soar bem atrás de mim, sorte minha não cai de pernas abertas. - Não sabia que o tapete era tão confortável assim. - Ele riu soprado.
Não digo nada me pondo de pé em um impulso só, respiro fundo, estufo o peito, empino o nariz, mas não sem me certificar que não vou cair novamente no chão, e saio ereta com o Gabriel vindo logo atrás.
- Se não prestar atenção, vai cair novamente. - Ele me alerta.
- Isso te preocupa? - Digo me virando bruscamente em sua direção, mas ele tá tão próximo que bato com a testa sem seu peitoral. - Aí! - Reclamo pondo mão onde bati.
Quando foi que ele chegou tão próximo assim?
- Desastrada, deveria ser o seu nome. - Sua voz bem humorada me deu nos nervos.
- Me poupe. - Exclamo voltando a andar para o quarto.
- Você é sempre estressada assim? - Ele pergunta se acomodando agora ao meu lado.
- Não, só para as pessoas que me odeiam, talvez assim temos um sentimento recíproco, sabe? - Falei sarcástica.
Gabo para de abrupto no meio do corredor me assustando, olho em sua direção, mas o mesmo fita o chão.
- Boa noite Gabriel, se quer que eu siga suas regras à risca não fique fazendo perguntas. - Digo quando vejo que ele não vai me olhar.
Uma porta a frente é onde vou dormir pela primeira vez longe de casa. Entro no quarto, procuro entre as minhas coisas o meu pijama amarelo com uma camiseta de botões e um shorts curto. Me jogo na cama macia depois de escovar os dentes no banheiro o dobro do tamanho do que tinha na casa dos meus avôs.
Mesmo me sentindo cansada, enrolei um pouco para dormir pensando em como o meu avô deve está, se ele tá bem, se minha mãe está conseguindo com a sua rotina pesada de trabalho ir visitá-lo e lhe fazer companhia.
Preciso de um celular urgente, não eu não tenho um, eu falava com a minha mãe e fazia ligações de emergência pelo telefone fixo.
Eu ao menos sei mexer nessas tecnologias, claro que deve ser mais um empecilho na escola para ter amigos.
Eu não quero ir, será que não posso continuar tendo minhas aulas de casa?
Um suspiro junto a um resmungo sai de mim, por fim me forço a dormir, mesmo que demore uma eternidade para acontecer.
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Ele me "odeia" ama
Genç Kurgu《Livro único》 Entre girassóis e outras coisas... Lorena Bernard de Lara, ou Lola para todos, é uma garota que viveu a vida inteira com os avós, enquanto sua mãe trabalhava na cidade mais próxima. Ela vê tudo mudar quando seu avô fica doente, depois...