STARBOY ✩ O Chamado | VOL. 1

💫 Capítulo 1: Vozes

Mazu

As vozes vinham através do vento. Não havia uma hora exata, elas apenas surgiam chamando de um lugar muito, muito distante. Eram baixas, quase irreconhecíveis; o garoto nunca escutara aquelas vozes antes.

Até tentara ignorar quando pequeno, mas era difícil fingir não escutar vozes sussurrantes tão próximas para serem escutadas, mas tão distantes para serem vistas.

Mazu

Ele deixava claro inúmeras vezes sobre como as vozes o tiravam do foco, mas ninguém acreditava em suas palavras.

Sua mãe, a rainha Stellae, era a única que acreditava no garoto. Todas as noites quando ele não conseguia dormir por conta dos sussurros, Stellae se deitava com o filho e lhe contava histórias de guerra dos estelares. Isto o inspirava a ser um grande guerreiro, assim como ela fora um dia.

Mas as vozes...

Mazu

...As vozes não paravam. Surgiam aleatoriamente, quase sempre quando o garoto precisava estar focado. Não que elas o ajudassem a manter o foco em uma tarefa importante; elas o deixavam totalmente perdido, como se o transportasse para outro mundo, outra dimensão.

— Mazu!

A voz da general Hella o atingiu como um balde de água gelada, despertando-o do transe.

Hella era uma mulher alta e ostentava braços musculosos. Entre os fios brancos de sua cabeça, havia uma trança atada por linhas. Listras douradas de nascença se destacavam entre os fios de cabelos próximos das orelhas de Hella.

O olho direito da general fora atingindo por uma fera há muito tempo atrás, por isso ela só tinha a visão de apenas um olho. Um corte cicatrizado, porém visível, percorria sua bochecha, passava pelo olho direito e subia até a testa. A marca de guerra de Hella.

Todos ali no campo olhavam para Mazu atentamente. Não eram olhares de admiração: estavam caçoando do príncipe mais fraco entre os três do reino. Ainda sentado sobre a grama, evitou focar nas faces em sua volta.

O campo onde os jovens de pele dourada estavam treinando naquele fim de tarde era próximo do templo de treinamento, acima dos montes que circulavam o reino. Estátuas de antigos guerreiros acompanhavam silenciosamente o treino.

— Pegue sua arma e levante-se, o treino ainda não acabou — falou a general em seu típico tom duro. — Anda se distraindo muito, jovem. Como planeja desenvolver suas habilidades estelares se não consegue focar no treino?

— São as... — Ao erguer a cabeça, notou o olhar desaprovador de Hella. — Deixa para lá.

Mazu se recompôs e endireitou-se, pegando a starshine do chão e preparando-se para o próximo round.

O príncipe acabara de ser derrotado pela terceira vez em um dia por Hella no treino matinal dos jovens estelares. Os outros jovens estavam se desenvolvendo bem: Dakris, o irmão mais velho de Mazu, era considerado um dos maiores lutadores estelares; Mellak, o irmão do meio, era inteligente e usava seu talento para aprimorar suas habilidades na luta. Quanto à Mazu, o caçula da família, tentava, e tentava, mas suas tentativas sempre geravam inúmeros fracassos.

Os estelares eram uma raça de guerreiros universais. A extensão dos poderes de um estelar era enorme, porém para explorá-las era necessário estar apto a conhecer a si mesmo e seus limites.

Mazu não conhecia a si mesmo e nem seus limites. Toda a sua vida era uma grande incógnita, como se cortinas espessas ocultassem todos os fatos, deixando-o na escuridão da incerteza; e uma mente incerta é incapaz de descobrir o próprio potencial.

— Dakris, venha até aqui — Hella deixou o centro do círculo e juntou-se aos alunos em volta; ainda olhava fixamente para Mazu. — Foco, Mazu.

Dakris se colocou em posição e girou a starshine reluzente no ar, enquanto olhava de forma desafiadora para seu irmão. Mazu conhecia aquele olhar. Ao longo de sua vida, já fora derrotado várias vezes por Dakris. E para piorar a situação, Dakris gostava de constranger Mazu.

— Preparado, irmãozinho? — Ele sorriu. — Ou já está escutando as vozes?

Cabelo ralo, olhar penetrante e físico avantajado. Este era Dakris, um dos jovens estelares mais fortes de Volair-C. Os cabelos do príncipe mais velho eram brancos, ondulados e chegavam até o ombro. Três listras de nascença douradas se alongavam sob as bochechas do príncipe.

Mazu respirou fundo e partiu para a luta.

Desferiu golpes rápidos com sua starshine enquanto se aproximava de Dakris. No entanto, Dakris conseguiu bloquear os golpes de seu irmão, chocando ambas espadas diversas vezes em intervalos curtos. Mazu continuou a golpeá-lo, tentando de todas as formas atravessar o bloqueio.

As espadas giravam em sentidos opostos, mas seus olhares estavam fixados um ao outro. Dakris ainda sorria cinicamente. Mazu bufou. O príncipe agachou-se sobre uma das pernas, pôs as mãos no chão e atirou a perna vaga contra as de Dakris, fazendo-o cair de bunda na grama.

Antes que pudesse retornar a posição de ataque, Dakris fora mais rápido e golpeou Mazu, deixando um corte no braço do mesmo. Sangue dourado escorria pela pele de Mazu.

— Percebi que andou treinando mais, até aprendeu truques novos — Dakris levantou-se e apontou sua starshine em direção ao irmão. — Mas, ainda não é páreo para mim. Você não é um guerreiro, mestiço.

Mestiço. Mazu não entendia o motivo de Dakris o odiar tanto. Antes, achava que o motivo de tanto ódio era pelo fato de Mazu ser adotado, mas não parecia ser isto. Parecia haver muitos outros motivos os quais Dakris não estava nem um pouco afim de compartilhar com seu irmão.

Desde pequenos, a relação de ambos nunca foi boa, sempre acabavam brigando - brigas sempre iniciadas por Dakris.

Tinha momentos em que a ignorância de Dakris o incomodava mais do que as vozes.

— Não me chame assim!

Mazu manteve seus músculos rígidos enquanto golpeava Dakris, que bloqueava os golpes com extrema agilidade. Ambas starshines chocavam-se uma contra a outra, produzindo um show de luzes, impressionando os jovens em volta do campo que assistiam o treino que acabou virando uma batalha.

Seus golpes acabaram adquirindo mais força enquanto mais focava em sua raiva. Os bloqueios de Dakris já não estavam mais causando efeito; Mazu iria conseguir o atingir. Porém, inesperadamente, Dakris desfez o bloqueio ao mesmo tempo que moveu rapidamente a palma de sua mão em direção ao peito de Mazu. Os pulsos de Dakris brilharam intensamente, assim como seu punho. Ao atingi-lo, Mazu acabou sendo arremessado para longe, caindo próximo da extremidade do campo de treinamento.

— Já chega, garotos — Hella interveio, colocando-se ao meio dos dois. — Eu lhe disse antes de iniciar o treino, Drakis. Nada de usar o estímulo durante a luta! Por acaso você quer matar seu irmão?

Ele apenas resmungou, ainda sorrindo, vitorioso.

Hella aproximou-se de Mazu, o ajudando a se levantar do chão.

— Você está bem?

— Eu... estou. Estou bem. Ainda posso lutar! Deixe-me mostrar a ele o que... — Mazu tornou a se levantar, mas Hella segurou seu braço.

— Nada disso, já chega por hoje.

— Eu consigo, Hella! — Ele exclamou, segurando firmemente a starshine.

— Um guerreiro deve saber a hora de encerrar uma luta. Não lute movido pela raiva. Lute com honra. Apenas assim você conseguirá se tornar um verdadeiro guerreiro estelar.

— Eu não sou o suficiente... Nada que eu faço é suficiente.

Hella ergueu o queixo do garoto e o fez olhar para ela.

— Está tudo aqui - Hella encostou levemente seu dedo indicador na testa de Mazu. — Não deixe elas dominarem. Jamais deixe.

Hella encerrou o treino dos jovens e todos se retiraram do campo de treinamento.