IV

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Qui-va não chorava, mas seu coração sangrava por todas as vidas perdidas de seu povo. Principalmente pela vida do homem mais importante que pisara em sua vida: Gahro. Seu querido pai. 

Não queria deitar na cama e chorar. Permanecer sentada no chão frio com as costas apoiadas naquela parede imunda lhe parecia mais condizente. Ela não se importava. Tudo estava perdido. E não havia esperança. 

Não até aquele momento. 

Quando pequena, além de treiná-la, Gahro costumava ensinar a Qui-va táticas usadas no círculo da revolução, uma delas era o assobio. Em muitos momentos de sua vida, Gahro acabara sendo preso, e todas as vezes ele fora solto pelo círculo da revolução. Quando combatentes do círculo estavam próximos da área de resgate, eles assobiavam. Um ruído baixo, apenas ouvidos treinados poderiam captar o assobio. 

Mesmo indisposta e desfocada, Qui-va escutou o sinal. Lá fora, além da barreira de proteção da cela, ruídos de naves e vento preenchiam o ambiente. Apenas ela conseguia escutar aquele assobio se sobrepor entre todos os outros ruídos da prisão. Ela se levantou para se certificar de que não estava enlouquecendo. 

Raízes de esperança envolveram seu coração. Estaria ele… vivo? 

Qui-va se aproximou da barreira de proteção energética da cela. A transparência da barreira permitia que Qui-va pudesse enxergar os outros blocos de celas e alguns guardas passarem em suas naves. Procurou por algo, alguém. Nada. Mas o ruído distante e familiar daquele assobio continuava. 

Dois guardas da L.D.A, trajados em seus uniformes azuis, surgiram em frente à cela de Qui-va. Ambos usavam capacetes com visores escuros. Um deles pressionou um botão no visor próximo da cela e a barreira se dissipou. Qui-va continuou parada, observando-os atentamente. 

— Precisamos ir. Agora! — Anunciou um deles. 

— Quem são vocês? — Ela indagou, desconfiada. 

O guarda posicionado à direita tirou o capacete, revelando uma face de cor arenosa, um típico noriniano, assim como Qui-va. Aquele tinha cabelos escuros com dreads em tons de vermelho jogados para o lado em um topete perfeito. Como uma serpente avermelhada, uma das tranças do cabelo do homem repousava sobre sua testa. Ele estava completamente sério. Quase com um pesar no rosto. 

— Provavelmente você não me conhece, Qui-va, mas eu a conheço. Sou Akyra, velho amigo de seu pai. Eu soube do que aconteceu com ele e com todos de Wongor. Eu sinto muito — Akyra deu três batidinhas no peito com seu punho, um sinal de respeito e luto na tradição dos norinianos. — Vim tirá-la daqui junto com os outros que restaram do círculo da revolução. Todos querem vingança. Também querem um líder. A sucessora da revolução.

— E eles terão — ela falou, ignorando toda a sua dor e mágoa e os substituindo por força. 

— Precisamos ir, antes que alguém nos flagre —o ser ao lado de Akyra falou. 

Akyra entregou uma pistola de plasma para Qui-va. 

— Primeiro vamos tirar daqui outro aliado de meu pai. Este é novo, e inesperado — Qui-va recarregou a arma e saiu de sua cela. 

STARBOY ✩ O Chamado | VOL. 1Onde histórias criam vida. Descubra agora