II

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Mazu soube que chegara ao destino quando dois guardas vieram buscá-lo na cela, o levando até a plataforma de desembarque da nave-mãe do pirata Dukrah. Como esperado, o capitão, juntamente com outros piratas, estavam esperando pelo príncipe.

— Onde estamos? — Mazu indagou.

A resposta veio logo depois da pergunta, quando a enorme porta da plataforma repartiu-se em duas, revelando uma paisagem tomada por construções gigantescas. Era dia, mas o sol não estava vívido como era em Volair-C; nuvens cinzas cobriam o céu como um manto, sufocando a paisagem.

Um lance de escadas se materializou até o chão. Dukra vinha à frente de Mazu e dos dois guardas que o acompanhavam.

Olhando mais atentamente, pôde perceber que estavam no terraço de uma torre. Ao redor, mais torres se erguiam até o céu. Nuvens cinzas passavam como nevoeiros pelo terraço, ofuscando a visão de todos. As torres eram espelhadas, mas não refletiam a beleza do ambiente em volta, pois não havia nada belo ali. Apenas a mais densa cor cinza em vários tons.

Em seu planeta, a natureza sempre foi muito presente; os estelares respeitavam e adoravam a natureza, por isso o reino fora construído de forma que respeitasse o espaço das árvores, plantas e animais. Adorar a natureza era uma forma de lembrar da criação que fora deixada para todos após o sacrifício de Lux quando matara Tenebris.

No entanto, naquele ambiente cercado por torres e fumaças, a natureza não havia sido respeitada — ela foi estrupada e morta, depois enterrada abaixo de toneladas de cimento.

Próximo dali, havia uma torre com uma antena pontuda apontada para as nuvens. Acima dela, uma estátua. Era uma selva de torres de cimento, pensou Mazu.

— Eles estão atrasados! Odeio trabalhar para gente nada pontual — desabafou Dukrah, impaciente. — Detesto ficar em algum planeta do sistema HP-X23, são todos industriais e poluídos. Em pensar que, décadas atrás, esse sistema costumava ter os planetas mais belos da galáxia.

Era a chance perfeita para escapar.

Mazu olhou mais uma vez em sua volta. Seria arriscado, mas poderia pular de prédio em prédio, já fizera isso antes escalando uma montanha durante o torneio. Respirou fundo e preparou-se.
No entanto, um detalhe chamou a atenção do príncipe: acima da antena, na torre ao lado, a estátua continuava erguida. Quando firmou sua visão para enxergá-la melhor, notou algo estranho. A estátua estava se movendo de forma contida, como se estivesse tentando não revelar o elemento surpresa.

Era tarde demais. Aquela sombra escura, que Mazu pensara ser uma estátua, pulou do alto da torre e caiu em pé diante de Dukrah e seus homens. As sombras que cobriam aquele misterioso ser eram, na verdade, vestes militares escuras. Mesmo sob as nuvens que passavam silenciosamente pelo terraço, a figura daquele ser obscuro era visível. Dois pontos vermelhos, como os olhos de um demônio, brilhavam no capacete que cobria o rosto daquela figura misteriosa.

— Ferrou, chefe... — Falou um dos guardas, esquecendo-se que estava vigiando Mazu e dando passos medrosos para trás; todos fizeram o mesmo.

— Isso foi uma armadilha? — Dukrah não desviou seu olhar em nenhum momento; continuou a olhar para o ser sombrio.

— Antes que seus compradores fugissem, garanti que fossem embora com alguns ossos importantes do corpo quebrados — a voz ameaçadora do ser o respondeu.

— Hoje não será seu dia de sorte — Dukrah falou, rispidamente —, Space Hunter.

Quando Space Hunter ameaçou dar um passo para frente, todos os piratas sacaram suas armas e atiraram contra ele ao mesmo tempo. O ser se pôs em modo defensivo atrás de seu escudo de energia. Os disparos de plasma das armas dos piratas não causavam sequer um dano no escudo. Alguns recuaram, correndo até a nave.

Aproveitando-se da situação, Mazu correu no sentido contrário da batalha. A borda do terraço estava próxima, no entanto, havia uma torre ao lado.

— Eu posso fazer isso. Eu posso fazer isso!

O príncipe acumulou estímulo suficiente em seus pés para pular alto o suficiente ao ponto de alcançar a torre ao lado. Seu reflexo era visível na superfície espelhada daquela torre. Antes de atingir com seu corpo na janela, Mazu notara que não estava sozinho. Logo atrás dele, Space Hunter repetira o mesmo trajeto: pulando da borda do terraço e vindo com o corpo contra a janela.

Milhares de estilhaços de vidro voaram para todos os lados quando Mazu aterrissou no interior do que parecia ser um escritório. Em sua volta, haviam seres de variadas raças sentados atrás de mesas. Alguns olhavam para Mazu espantados, outros não tiraram os olhos de uma tecnologia que Mazu não conhecia.

— Você é um... Estelar?! — Indagou, assustado, um ser de quatro olhos próximo onde Mazu aterrissara.

Outra janela próxima dali explodiu em pedaços. Space Hunter aterrissou habilidosamente, rolando no chão apenas uma vez antes de endireitar-se já com sua arma apontada para o príncipe confuso à sua frente.

— Parado!

Do outro lado do escritório, outro paredão de janelas. Mazu não pensou duas vezes, correu o máximo que pôde, atentando-se em permanecer próximo das colunas de sustentação que estavam espalhadas pelo escritório. Os disparos de Space Hunter atingiam a superfície de cimento das colunas. Mazu continuou a correr, ofegante. Os seres do escritório se jogaram para baixo de suas mesas.

Quando chegou perto o suficiente, Mazu jogou seu corpo contra a janela. A claridade cinzenta do dia atingiu seus olhos, fazendo suas pálpebras tremerem. Space Hunter cessou seus tiros. O misterioso ser andou até a borda da janela e observou a queda do príncipe.

Seus cabelos balançavam furiosamente enquanto o vento atingia seu rosto. Mazu conseguia enxergar com clareza as estradas logo abaixo. Não havia outra torre para se apoiar, agora teria que aguentar a queda.

Uma cratera acabou sendo formada ao Mazu cair na rua. Poeira e fumaça se espalharam pela rua. Pequenas naves de solo que estavam seguindo reto tiveram que frear bruscamente, caso contrário iriam atropelar o ser dourado deitado no chão. Alguns pilotos saíram de suas naves e colocaram-se ao redor da cratera.

— Mas o que é isso? — Disse alguém entre eles.

Mazu levantou-se do chão e emergiu da fumaça em sua volta. Todos os seres próximos dali gritaram, assustados.

Não se importou com as reações, continuou a caminhar até sair de dentro da cratera. O príncipe mancava, sua perna direita estava machucada. Ferido e cansado, Mazu andou em passos lentos e esforçados até o interior de um beco escuro longe das ruas. Gotas de água começaram a cair do céu; depois, uma chuva agressiva.

Mazu notou que vapor quente saia dos bueiros das ruas, deixando toda a cidade enevoada. Cheiro de enxofre podia ser sentido em cada metro. Mas, os seres que estavam parados na rua não pareciam se importar, estavam acostumados com a poluição.

Mazu apoiava suas mãos na parede enquanto forçava-se a caminhar. Não sabia o que fazer e nem para onde ir. Seu lar, há milhões de anos luz de distância, estava fora de alcance; sua família, agora atormentada pelo ocorrido no torneio, não era mais o refúgio de Mazu; seu querido irmão, Mellak, estava sofrendo — ou morto.

Assim como a chuva que caía do céu, lágrimas escaparam dos olhos do príncipe, juntando-se às poças de água do chão imundo do beco. Não conseguia mais andar, suas forças o deixaram, assim como ele fizera com seu povo.

— Sou um covarde!

Sentou-se, mantendo suas costas próximas da parede.

O ecoar estrondoso de um trovão abalou o céu; segundos depois um raio azulado iluminou o beco onde Mazu estava, em lágrimas. Por um momento, quando a escuridão daquele beco fora substituída pela claridade do raio, Mazu enxergou ele, Space Hunter, caminhando em sua direção.

O príncipe tentou levantar-se e correr, mas Space Hunter desenrolou do coldre em sua cintura um chicote com adagas conectadas às pontas e lançou contra Mazu. O chicote enrolou-se como uma cobra no pescoço do príncipe, o puxando para trás violentamente. A dor era insuportável.

Mazu teve tempo de observar Space Hunter se aproximar antes de mergulhar na escuridão da inconsciência.

STARBOY ✩ O Chamado | VOL. 1Onde histórias criam vida. Descubra agora