Odeio quando a campainha toca na melhor parte da novela!
— Já vai, já vai! — gritei, enquanto me levantava do sofá e começava a caminhar na direção da porta, mas com o rosto ainda virado para trás, focando na TV, tentando não perder nenhum detalhe. E, felizmente, consegui acompanhar a esperada cena, onde aquela vagabunda era desmascarada com o amante.
Toma, sua vadia!
Quando finalmente abri a porta, tive que olhar para baixo, pois a baixa estatura da visitante tornou difícil percebê-la num primeiro momento.
— Oi! — cumprimentei-a, já com um sorriso no rosto.
— Oi — ouvi em resposta, de maneira tímida.
Era apenas uma criança. Uma menina que não devia ter mais do que cinco anos. Com o corpo quase sumindo dentro de um casaco de moleton com capuz, a pequenina deixava apenas o rosto visível, onde se destacavam os seus grandes olhos amendoados, que me fitavam com aquela doçura típica da infância.
— Meu nome é Elisa — disse ela, ainda contida, fazendo com que eu me apaixonasse ainda mais por aquela sua voz doce.
— Oi, Elisa. O que eu posso fazer por você, meu anjo?
— A Tainara mora aqui?
— Sim, ela mora. E eu sou a mãe dela. Meu nome é Suzana. Prazer em conhecê-la. — Estendi a mão para cumprimentá-la. E, logo após ela retribuir ao gesto, não resisti e a puxei para mais perto, emendando um abraço naquela figura encantadora que parecia ter caído do céu diretamente na minha porta. — Desculpa, mas eu tinha que te dar esse abraço — falei em minha defesa durante o gesto inesperado. — Mas a Tai não está em casa — avisei, enquanto o abraço se desfazia e eu me mantinha agachada para igualar a altura. — Ela está treinando no colégio. E, infelizmente, acho que ela vai demorar um pouco.
— Tudo bem. Eu posso conversar com ela outra hora. Mas eu queria que a senhora fizesse um favor para mim. Poderia entregar essa cartinha pra ela? — Dizendo aquilo, ela me estendeu um envelope branco, que tinha o nome Tainara escrito à caneta em um dos lados, com uma bela caligrafia.
— Sim, eu entrego, sim — prometi, pegando a carta na mão. — Nossa! Olha que cartinha linda! — elogiei, recebendo um sorriso agradecido da menina.
Mas antes que eu pudesse estender a conversa ou oferecer alguma coisa para ela comer, a menina se despediu e saiu correndo, aparentando estar com pressa.
Minutos depois, meu marido chegou do trabalho. E quase não percebi sua entrada já que estava entretida com a carta, girando-a na mão à procura de uma maneira de abri-la sem danificá-la.
— O que é isso aí? — perguntou ele, enquanto se sentava no sofá para tirar os sapatos.
— É uma cartinha para a Tai.
— Para a Tai? — repetiu ele, já desconfiado. — E quem mandou essa carta?
— Foi uma menina de uns cinco anos. Ela acabou de me entregar e saiu apressada. E era a criança mais fofa que eu já vi!
— E quem era essa menina?
— O nome é Elisa. Mas esqueci de perguntar onde ela mora.
— E por que você está tentando abrir a carta?
— Eu não estou tentando abrir — neguei. — Estou só... olhando.
— Claro...
E continuei olhando, até que a curiosidade impulsionou meu dedo de um modo mais descuidado e a beirada da cartinha foi puxada com muita força, o que acabou rasgando a aba colada, provocando um leve ruído.
— Eu não acredito que você abriu a cartinha dela, Suzana!
— Ih, foi sem querer — desculpei-me, forçando um sorriso.
— Claro que foi sem querer...! — ironizou ele. — Depois ela não confia mais em nós e aí você reclama!
Olhei para ele com uma expressão arrependida e ele apenas balançou a cabeça, resmungando mais uma crítica à minha atitude.
Mas como o estrago já estava feito, resolvi ler o que estava escrito no papel guardado no interior do envelope.
E...
Hã?
Mas o que significa isso?
Reli mais duas. Três.
Quatro vezes.
E continuei não entendendo direito o que dizia aquilo.
Mas a expressão se ela morrer, escrita em uma das últimas frases acabou fazendo com que eu quase entrasse em pânico.
— O que foi? — perguntou meu marido, após perceber minha reação de espanto.
— Eu não estou entendendo o que está escrito aqui...! — confessei. — Mas estão falando em matar aqui nessa carta!
— Deixa eu ver isso — Preocupado, ele se levantou e se aproximou. E quando estendeu a mão, eu lhe passei o papel para que também pudesse ler.
Assim como eu, ele fez a leitura mais de uma vez, mantendo o cenho franzido durante as repetições do texto.
Até que sua expressão suavizou:
— Ah, já saquei o que isso aqui quer dizer! Fica sossegada. Não é nada do que parece.
— O que quer dizer? — questionei, ainda angustiada.
— Isso aqui é um tipo de código — afirmou ele, balançando a carta na mão. — Cada uma destas expressões escritas aqui tem um significado, mas só faz sentido para eles.
— Para eles quem?
— Para a Tai, que ia receber essa carta, e para a pessoa que escreveu isso para ela!
— Mas por que teriam tanto trabalho para elaborar uma carta escrita em códigos?
— Para o que mais? Para se protegerem, caso a mãe sem noção da Tai abrisse a carta antes de ser entregue a ela! — alfinetou ele, me fazendo baixar o rosto, envergonhada. — Porque isso aqui é informação sigilosa deles! E eu já tenho quase certeza de quem mandou isso! — ele prosseguiu afirmando. — Deve ter sido aquele tal de Miguel. Ela deixou escapar sobre ele esses dias, lembra? O amigo dela que ajudou no problema de física.
— Lembro sim — assenti, concordando.
— Com certeza, Suzana! Aqui ele deve estar combinando algum tipo de encontro com a nossa filha!
— O quê? Um encontro?
— Ah, mas se eu pego esse pilantrinha...! — ameaçou por fim, me devolvendo a carta antes de retornar para o seu lugar no sofá, onde ainda ficou resmungando.
Reli a carta mais uma vez. Mas agora, já sabendo que aquelas expressões fortes foram usadas apenas para nos despistar, fiquei mais tranquila.
Infelizmente, eu demorei para encontrá-lo. Mas ainda há tempo para consertar tudo. Não saia de casa. Suas vidas correm perigo. Jonas também veio e está à nossa procura. E ele vai revirar a cidade até nos encontrar. Tive alguns imprevistos, mas logo entrarei em contato pessoalmente. No entanto, achei prudente enviar este aviso antes: NÃO SAIA DE CASA. Esse é o único jeito de se manterem seguros por enquanto. Se ele os pegar, poderão ser mortos. E se ela morrer, você morre junto, pois não poderá mais voltar para o seu corpo. PS: há o risco de você não se lembrar de nada. E se isso aconteceu, basta saber que eu sei o seu segredo. Sei que está 'dentro' dela. E sei como te levar de volta ao seu corpo. Portanto, não saia de casa até eu entrar em contato pessoalmente.
continua...
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Consciência Viajante
Teen Fiction(Classificação +14) Ele despertou na beirada de um prédio, prestes a cair. E após enfrentar momentos de tensão para impedir uma queda fatal, acabou descobrindo que acordar naquela situação aflitiva não era o maior de seus problemas. Logo se deu cont...