No outro dia, depois da aula, resolvemos ficar um pouco mais no colégio, a meu pedido. O pequeno Thiago fora buscado por seu Ivo no portão e levado de carro, pois precisava chegar no horário marcado em seu dentista.
E o motivo de eu ter pedido para ficar um pouco mais foi o jogo treino do time feminino. E mais uma vez, como em outras ocasiões, fiquei com o rosto colado na grade do alambrado, encantado com o talento de Luz, a capitã do time. A camisa 14 continuava se destacando, como sempre, comandando o time de titulares em um jogo difícil, contra um adversário mais forte, que defendia as cores de um colégio da capital.
Um adversário, inclusive, que já havia participado várias vezes do cobiçado campeonato nacional, um feito que a equipe da casa nunca conseguiu.
O time visitante tinha um conjunto mais forte e vencia a partida. Mas o talento da nossa camisa 14 não permitiu uma vantagem mais elástica das adversárias. O jogo estava 2 x 1, sendo que o gol do nosso time fora marcado por ela.
Até que houve um contratempo para o nosso time quando a atleta que vestia a camisa 8 acabou se machucando após uma entrada mais dura.
Usando o curioso nome de Flecha às costas, a menina lesionada ainda tentou se levantar e continuar no jogo, mas a dor não permitiu. Então, com um semblante triste pelo imprevisto, ela saiu de campo mancando, amparada pelas companheiras, até se sentar no banco de reservas.
Mas a adversária que a machucou foi até ela e se desculpou, demonstrando que eram apenas adversárias, e não inimigas.
O grande problema, no entanto, era que não havia ninguém para substituí-la no momento.
Ou, seja, teriam que prosseguir com uma jogadora a menos. E a vitória se tornaria ainda mais fácil para o time visitante.
Mas Vanna, que acompanhava o jogo ao meu lado, teve uma grande ideia, gritando para as garotas no campo:
— Ei! Coloca a Tai no lugar dela!! A Tai joga muito!! — E apontava para mim durante a gritaria.
— Cala a boca, sua doida...! — murmurei para ela, quase entrando em pânico. — Não fala isso...!
No entanto, Vanna me ignorou totalmente e continuou:
— Coloquem ela! Ela pega uma vaga fácil no time!!
— Para, Vannaaa!! Por favor! — segui tentando impedi-la, chegando a tapar a boca dela. Mas ela se desvencilhou de mim.
— Coloquem ela!
Para o meu desespero, algumas atletas do nosso colégio acabaram se aproximando de nós, levando a sério a sugestão.
— Ei, eu te vi ontem brincando com o mendigo! — disse uma delas, a zagueira chamada Rose. — Você tem um bom domínio de bola.
— Pois é — acrescentou outra, a que trazia o nome Fernanda Helena às costas. — Por que nunca disse pra gente que sabia jogar?
— Ela sempre foi tímida — respondeu Vanna por mim. — Mas agora ela está querendo entrar no time.
— Não...! — acabei soltando, ainda assustado com tudo aquilo.
— Não quer? — perguntou Rose. — A gente precisava de, pelo menos, mais uma menina pra completar o nosso elenco. Metade do nosso time não leva isso a sério e falta aos treinos. Seria legal se fizesse um teste. — E virou-se para trás, acompanhando a capitã Luz, que acabava de chegar junto ao alambrado. — O que acha, Luz? Não seria bom dar uma chance a ela?
Com os olhos fixos na boca da companheira de time, a camisa 14 fez a leitura labial e gesticulou em resposta:
<< Seria ótimo! Vi ela brincando com o senhor Douglas ontem. E percebi que ela sabe jogar. Tem bastante habilidade. >> — Em seguida, ela se virou diretamente para mim, continuando com a língua em libras. — << Seria bem-vinda ao time.>>
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Consciência Viajante
Fiksi Remaja(Classificação +14) Ele despertou na beirada de um prédio, prestes a cair. E após enfrentar momentos de tensão para impedir uma queda fatal, acabou descobrindo que acordar naquela situação aflitiva não era o maior de seus problemas. Logo se deu cont...