Os gêmeos apareceram no portão, cada um carregando uma grande caixa térmica, o portão se abriu, eles entraram e o portão se fechou.
Já faziam duas semanas que estavam ali dentro da jaula, sem que acontecesse uma caçada. A comida era entregue apenas para os filhotes fora da jaula. Carne crua. Honor não se importava, ele só queria matar a fome, mas Quinze e os filhotes nunca tinham comido carne sem cozinhar, então Quinze já estava friccionando uns galhos para fazer fogo.
"Se nos dessem um pouquinho só de sal..." Dezessete disse.
"Eu gosto sem sal." Dezesseis olhou para o pai dela, ele sorriu.
Os gêmeos estavam sempre buscando a aprovação do pai deles, Honor se lembrava de seus irmãos, principalmente de James, que foi o preferido de seu pai até Simple nascer.
Honor ficava a distância, ele não queria se apegar a eles, então estava sentado apoiando as costas numa árvore quando Dezessete veio servi-lo. Realmente um pouco de sal deixaria a carne deliciosa.
"O que acha que aconteceu?" Quinze perguntou a ele, Honor deu de ombros:
"Já fiquei preso numa jaula por um mês. Isso não é incomum."
"Acha que vão nos tirar daqui?" Dezesseis perguntou. Ela olhou para seu pai, não para Honor.
"É possível." Honor respondeu. Dezessete olhou para seu pai, seus olhos estavam preocupados.
"Eu quero voltar pra casa, papai. Eu prefiro continuar preso lá." Ele disse.
"Talvez eles vão me tirar daqui e vocês voltarão para a casa de vocês." Honor disse sem muita convicção. Dezessete olhou para a irmã, ela fechou os olhos, mas depois rosnou.
"Não vejo nada." Ela disse e correu. Honor estava aprendendo que ela não lidava bem com as visões. Quinze suspirou e foi atrás dela. Dezessete estendeu um grande pedaço de carne para Honor e ele aceitou.
"Você me disse algo, Dezessete, que eu não entendi. Você disse que se encontrassem meus irmãos a ordem era matar. A ordem de quem?" Isso estava incomodando Honor desde que os filhotes e o pai deles apareceram.
"Eu não sei. Papai pode te dizer." Ele sabia, mas tinha falado demais, essa era a verdade.
"Não importa mais, filhote. Eu estraguei tudo, o acordo não vale mais." Quinze voltou com Dezesseis nos braços. Ele se sentou no chão, com ela no colo, como se fosse uma garotinha, mas ela era alta e forte.
"Qual era o acordo?" Honor achava que aquele macho era ingênuo demais, mas ele viveu toda a vida preso, era previsível que ele acreditasse numa chance de ser livre.
Quinze ergueu as sobrancelhas e começou a contar:
"Nós nunca quisemos sair da nossa casa. É uma jaula grande, ocupa quase a metade da ilha, há cabras, bodes, cachorros, gatos, porcos e alguns bois. Há um açude e criamos peixes, há até algumas ovelhas, não que Dezesseis conseguiu tecer alguma lã, mas elas são de estimação, então..." Ele disse procurando fazer Dezesseis rir, ela sorriu meio a contragosto.
"Eles cresceram correndo, me ajudando nas tarefas e eu acreditei que tinha uma vida perfeita. Mas aí, um dia, um helicóptero pousou no pasto e um homem vestindo uma daquelas roupas chiques, de rico, veio conversar comigo. Eu o servi de suco e carne, ele comeu, parecia muito simpático, parecia uma boa pessoa. Ele me disse que tinha comprado a ilha comigo dentro e que tudo o que havia ali pertencia a ele, inclusive eu e meus filhotes."
"Lennisworth." Honor disse.
"Eu nunca soube o nome dele."
"Sarah, uma amiga de nossa família está namorando Patrick Lennisworth. Meu irmão, James é um racker, o pai dela pediu para James pesquisar sobre ele e James descobriu que ele era infinitamente rico. Meu irmão, Noble, sempre foi apaixonado por Sarah, então, meus outros irmãos zombavam dele dizendo que ela nunca deixaria um humano podre de rico para ficar com um professor de música. Numa das caçadas, eu ouvi um dos caçadores se gabar que era o jogador do próprio Lennisworth. O modo como ele disse me deu a entender que o filho da puta é o dono de tudo isso aqui."
"Bom, é uma hipótese, não é? Sua amiga continuaria namorando o tal Patrick se soubesse que o pai dele usa Novas Espécies para serem caçados por humanos?" Honor balançou a cabeça. Sarah era um anjo.
"Não. Sarah é boa."
Quinze assentiu e continuou a história:
"Ele disse que não tinha interesse em mim, por que eu era um clone e logo morreria, mas que antes de morrer, eu poderia salvar meus filhotes, enviá-los a um lugar melhor. Eu concordei, durante toda a minha vida diziam que eu era um clone." Honor olhou para os olhos dele, exatamente iguais aos de sua mãe. Mas como ele nunca viu Vengeance, ele não teria como saber.
"Então ele me propôs o acordo: Dezesseis e Dezessete iriam participar de umas caçadas para entreter os apostadores. Se sobrevivessem a três caçadas, eu e eles iríamos ser levados para os Estados Unidos, o local onde eu nasci. Lá, eu e meus filhotes teríamos casa e comida desde que obedecéssemos as ordens. Seriam missões. No fim dessas missões, nosso débito com ele estaria pago e eu receberia uma fórmula para continuar vivo. Quando eu perguntei sobre as missões, ele disse que ainda não tinha certeza do que seriam, mas a primeira seria ficar longe de qualquer informação sobre a minha matriz, Vengeance. E que poderia acontecer de encontrarmos com os trigêmeos, seus irmãos, e que se matássemos um deles que fosse, seríamos imediatamente libertados. Esse foi o acordo. Eu implorei para que eu participasse da caçada, ele não permitiu." Honor bufou.
"Ele não pode ser de confiança." Quinze assentiu.
"Eu não tive escolha. Quando estivéssemos livres iríamos para onde você vive. Esse era o meu plano."
Honor entendeu. Quinze não podia fazer nada mais do que Lennisworth propôs, ele era uma propriedade.
"E agora, estamos aqui. Só de estarmos vivos, já é uma coisa boa pra mim." Quinze disse.
"Sim. Eu concordo." Honor mentiu. Ele preferia mil vezes morrer do que estar ali. Mas, enquanto sua mente estava cansada de tudo, louca para atingir o esquecimento e deixar de existir, sua alma ainda lutava. Algo nele se negava a morrer.
"Honor, você falou nos seus irmãos. Me conta sobre eles?" Dezesseis disse, saindo do colo de seu pai e se sentando a frente de Honor. Honor olhou nos olhos de diamante dela, Dezesseis era linda. Havia algo no formato dos olhos dela que lembrava os olhos da outra.
"Eu não gosto muito de me lembrar deles, dói estar longe." Ele disse, ela olhou para o chão.
"Desculpe." Ela disse, Quinze mudou de assunto.
"E que tal nos falar dos filhotes de nossa matriz? Dói também?" Ele brincou, Honor segurou um rosnado. Ela era um dos filhotes do tio V.. Doía infinitamente mais. Dezessete o olhava com um brilho nos olhos, ele era mais infantil que a irmã. Honor suspirou.
"O primogênito é o Peter. Ele é incrível. Forte, ótimo lutador, ouve corações e tem premonições. É muito difícil lutar com ele por que ele vê os golpes antes, assim como você, Dezesseis. Tem super resistência. Meu irmão Pride, no auge da sede de sangue, o pegou pelo pescoço, o pescoço dele não quebrou. Isso requer muita força. Ele é acasalado com Charlie e quando eu saí da Reserva, Alícia, a filhotinha deles estava para nascer."
"Por que seu irmão o pegou pelo pescoço? E o que é sede de sangue?" Dezessete perguntou.
"Eles estavam lutando, fazem muito isso na sala de treinamento, até eu já lutei lá. Poucas vezes, mas lutei. Os pais apostam." Quinze ergueu as sobrancelhas.
"É divertido. O resultado não importa muito, não lutamos pra valer, as apostas são no que vai acontecer na luta, como por exemplo, quando meu pai lutava, sempre era sobre quando minha mãe iria aparecer, ou quem iria chamá-la." Dezesseis balançou a cabeça.
"Parece meio idiota pra mim." Honor sorriu.
"Exato. Por isso é que era divertido."
"E a sede de sangue?" Ela não perdia nada.
"Acontece quando meu irmão Pride perde o controle. Ele fica muito forte e não é capaz de parar de lutar até que o oponente morra. Mas ele tem controle agora." Quinze o olhou, seus olhos expressaram dúvida.
"Você não tem isso?" Ele perguntou, Honor balançou a cabeça negando. Ele estava descobrindo que não era tão diferente de Pride assim.
Dezesseis mudou de assunto:
"Certo, Peter é forte, tem premonições, super resistência e é pai. Quem mais?" Ela perguntou.
"Tem a Grace. Ela é gêmea de Peter e tem uma penca de filhotes. Ela também é acasalada com o Torrent. Também tem visões, mas de um futuro distante. Ela sempre conta o que vê, isso sempre trás alguma confusão, como quando falou que Bells seria feliz com uma fêmea de olhos azuis. Bells acabou acasalado com Michelle que tem os olhos escuros." Dezesseis se interessou:
"Ela estava errada?" Honor se lembrou do rostinho de boneca de Jewel e dos impressionantes olhos azuis dela.
"Eu acho que não. Bells adotou uma filhote humana, ela tem lindos olhos azuis." Dezesseis assentiu.
"Ele seria feliz. Não significava que seria através do acasalamento." Honor assentiu.
"Depois dos gêmeos, há o Rom. Romulus para ser exato. Ele sim é um clone. Todos ficamos apreensivos quando descobrimos que ele iria morrer, mas os outros dois clones, Adam e Noah se entregaram pela fórmula para que os três pudessem viver."
"Então, há uma fórmula?" Quinze perguntou. Honor entendeu que ele ainda não acreditava que não era um clone.
"Sim. Mas eu já disse que você não é um clone. Qualquer um que olhe para você vê isso." Ele suspirou.
"É estranho pensar nisso." Honor acenou.
"Depois de Rom..." Dezesseis o interrompeu:
"Rom vive com o nosso... Avô?" Ela perguntou.
"Mesmo sendo um clone?" Honor sorriu.
"Sim, o tio V. o considera como filhote. A ele e aos outros dois. Rom lê mentes e quando eu saí de Homeland estava numa guerra com a minha irmã mais nova, Daisy. Ele odeia correr e é muito inteligente, ainda que não seja tão forte quanto você, os clones ou Peter."
Dezessete sorriu, ele parecia estar encantado em ter uma grande família.
Honor arregalou os olhos.
"Meu Deus! O tio V. empatou com o meu pai!" Ele começou a rir, imaginando seu pai rosnando que Vengeance tinha adotado seus clones para ficar com o mesmo número de filhotes que ele, Valiant.
"Como assim?" Quinze perguntou.
"Papai tem muito orgulho de ter dez filhotes, ninguém na Reserva ou em Homeland tem tantos filhotes assim, ou tinha até que os filhotes do tio V. começaram a aparecer. Com você, os clones, Peter e Grace, Peace e Beauty, Harrison e... A outra, ele terá os mesmos dez filhotes que o meu pai."
"Se algum dia sairmos daqui." Quinze disse desanimado. Honor ia animá-lo, ou tentar pelo menos, quando Dezesseis perguntou:
"Quem é a 'outra'?" Honor sentiu a dor explodir em seu peito. Nunca ficava menos dolorido, era uma merda.
"Olívia. Mas, por favor, não me faça falar dela." Ele disse. Olívia, Livie. Cada letra do maldito nome dela doía nele de uma forma insuportável.
"Ela tem olhos verdes? Meio acinzentados?" Dezesseis perguntou, Honor acenou. Lindos olhos verdes claros, assim como os de Lily. Lily, que era a única coisa boa no meio daquele tormento.
"Como sabe disso, meu amor?" Quinze perguntou para Dezesseis.
"Acho que sonhei com ela. Num vale, um vale entre duas grandes montanhas, um vale florido com um lago. Mas eu não me lembro o que ela me disse."
Honor se levantou.
"Quando foi isso?" Ele perguntou, Dezesseis franziu a testa.
"Ontem, eu acho. Ou anteontem, não tenho certeza." Honor se ajoelhou ante ela, ela se sentou ereta no chão.
"É importante. Livie perdeu a memória, mas ela tem poder de acessar mentes a distância. Ela só precisa de conexão. Se ela conseguir acessar sua mente pode usar seus olhos para ver onde estamos." Dezesseis arregalou os olhos.
"Mas eu não me lembro! Eu nem sei se eu sonhei ontem ou anteontem! Minha mente está confusa!"
Honor olhou bem no fundo dos olhos azuis claros de Dezesseis, ela piscou, era apenas ela ali.
Ele andou de um lado a outro, a clareira de Mariah era uma ilusão criada pela mente de Livie. Ela estava buscando conexão com Dezesseis, só podia ser!
"Eu preciso fazer uma coisa, Dezesseis, você permite?" Dezesseis se levantou, ela se esticou em toda a sua altura.
"Sim." Quinze também se levantou e olhou desconfiado para Honor.
"Fique frio e confie em mim." Honor disse a ele, ele acenou.
Honor se aproximou de Dezesseis e tocou o bonito rosto dela, tirando alguns fios negros que estavam grudados em suas bochechas, ela piscou, tremendo as pálpebras. Ele aproximou seu rosto do dela, a aversão se iniciou, ele se forçou a continuar.
"Feche os olhos." Ele sussurrou, Dezesseis, porém não fechou. Honor colou sua boca à dela bem de leve, todo o corpo dele se negava a fazer aquilo, aquele simples contato lhe doía mais que uma descarga de uma metralhadora. Ele pressionou seus lábios nos dela, ela arregalou os olhos, ele a beijou de novo, dessa vez passando a língua pelos lábios dela, ela os abriu um pouco, Honor chupou de leve o lábio inferior dela. Ele fechou os olhos, mas os abriu quando ela sugou a pontinha da língua de Honor. Um brilho verde surgiu no fundo dos olhos azuis e sumiu, mas esteve ali, Honor a soltou. Quinze estava rosnando, mostrando os dentes, mas não avançou sobre Honor.
"O que significa isso?" Ele perguntou, estava todo ereto, com os punhos fechados.
"Eu e ela, bom, existe uma ligação. Ela provavelmente está acasalada com o meu irmão, mas há uma ligação entre nós." Dezesseis o encarou.
"E me beijar faz o quê?" Honor suspirou. Ele se lembrou da prostituta. Mckay tinha dito que Livie a matou, mas ele foi tirado do castelo logo em seguida, não teve tempo de entender bem o que aconteceu. Mas se uma prostituta o chupando chamou a atenção de Livie, talvez beijar Dezesseis também chamasse.
"A faz ficar com raiva de você." Quinze rosnou.
"Ela pode fazer mal à minha filhote?" A imagem da humana abrindo a boca como um peixe procurando ar veio a mente de Honor. Mas Livie ainda estava sem memória, ela não se lembrava nem dele nem de Pride. Agora, ela já teria melhorado.
"Não. Isso só chamaria a atenção dela. Ela está vivendo com o meu irmão, talvez até já tenham outros filhotes." Dezesseis o encarou.
"Não. Ela está só. Totalmente só. Eu sinto um frio no peito e um vazio na alma..." Ela fechou os olhos e ia cair, mas Dezessete estava perto e a amparou.
"Amor do papai? Meu amorzinho?" Quinze a sacudiu, Dezesseis estava mole nos braços dele, Honor sentiu medo, um medo de arrepiar a coluna. E se Livie estivesse louca?
"O que aconteceu com ela? O que você fez com a minha filhotinha?" Quinze rosnou as palavras, entregou a filhote para Dezessete e deu um passo na direção de Honor. Ele estava com os dentes travados, os olhos bem abertos e os punhos fechados. Honor nunca viu os clones ou Peter lutarem pra valer, mas viu Quinze rasgando os aprimorados e humanos quando salvou Dezesseis. Ele era brutal. Combinado isso ao fato de ser maior e ainda mais forte que o próprio tio V., ele era um adversário a se temer.
"Não. Não o machuque." A voz de Dezesseis estava fraca, Quinze se virou e a pegou nos braços, a apertou ao peito.
"Filhotinha? Amorzinho? Você está bem?"
Ela não respondeu, ele se sentou no chão e a aconchegou ao peito. Ela piscou.
"Honor." Ele olhou para Honor, Honor não sabia se se aproximava ou ficava onde estava.
Dezesseis se levantou com dificuldade e olhou para Honor, foi a vez dele próprio quase cair. Os olhos dela estavam verdes, meio cinzas.
"Onde você está?" Ele olhou para Quinze.
"Onde estamos? Você sabe? Diga! Onde estamos?" Quinze olhava preocupado para Dezesseis, ele não disse nada.
"Quinze! Onde estamos, porra?" Honor gritou.
"Eu não sei. Oceano pacífico, só sei isso. Não, espera! Galápagos. Eu já ouvi essa palavra, isso me fez sentir que tem a ver com nossa localização." Ele disse. Dezesseis acenou, deu alguns passos até Honor, mas os olhos dela não estavam tão verdes mais.
Honor não se aproximou.
Dezesseis disse:
"Estamos indo." Ele assentiu e Dezesseis ia caindo de novo, Quinze a amparou.
Honor deu alguns passos até ela, ela piscou e seus olhos já estavam azuis claros, brilhantes.
"Filhotinha? Está bem?" Quinze perguntou.
"Minha cabeça está doendo, papai, está doendo muito." Quinze a abraçou, ela o abraçou de volta.
"Temos que nos preparar." Honor disse.
"Nos preparar? Como?" Dezessete perguntou.
"Temos de guardar carne." Ele abriu a caixa térmica, ainda havia uma boa quantidade em uma, a outra estava cheia. Eles mandavam as caixas uma vez por semana.
"Vamos racionar e dar um jeito de fortalecer essa jaula. Precisamos ficar aqui até que venham." Honor disse.
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FILHOTES DE VALIANT - NOBLE
FanfictionNoble se considerava um macho feliz, realizado profissionalmente, tinha uma família grande que o amava, morava no melhor lugar do mundo e... Não tinha se vinculado ainda. Em toda a sua vida, tinha se apaixonado apenas uma vez, mas acabou por não dar...