Amando o inimigo

Desconhecido

Há alguns desastres que dão sinal de quando vão acontecer, tal qual a debandada de animais perante fenômenos da natureza ou o recuo do mar para formar uma tsunami. Porém, na vida de um ser humano, não há aviso prévio de quando tudo mudará drasticamente. Em um dia normal, alguém não saberá que horas mais tarde uma pessoa amada pode vir a falecer, por exemplo.

Algumas desgraças são silenciosas. Você não sente nada, até que suas costelas batam contra o chão com força, roubando-lhe todo o ar dos pulmões... cada resquícios de vida e felicidade que ainda exista em seu corpo. Era assim que Sasuke Uchiha se sentia enquanto girava lentamente um copo de whisky pela metade e mantinha a expressão impassível.

— Ela vai casar — não sabia se afirmava ou perguntava. Estava muito abalado para se importar com isso naquele momento. — Ótimo! Já faz algum tempo que a Lady Sakura está noiva, não? A vida está seguindo seu curso natural.

Enquanto dava de ombros aparentando estar despreocupado, algo dentro do peito do moreno ruía. Quando a expulsou de sua cama na última vez em que estiveram juntos, sabia que isso iria acontecer. Na verdade, essa foi a forma dele ser decente com a rosada em algum nível. Fora tolo no passado, quando achou que alguém como ele seria capaz de se manter ao lado dela.

Sakura... um nome pequeno, leve, suave e sonoro. Um nome que fazia estremecer lugares dentro de si que o Uchiha nem sabia existir por vezes. Não era só o nome, mas tudo aquilo que ele lhe remetia. O sorriso largo e a paciência infinita, a pele sedosa e o olhar esverdeado mais sedutor que jamais vira. Aquela mulher forte e cuidadosa, que tratava tão bem o seu filho... que lhe tratava tão bem.

Fechou os olhos por um breve instante, esquecendo-se de permanecer inabalável como pretendia. Uma torrente de imagens se passou por sua cabeça, ativando até mesmo a sua memória olfativa. O cheiro, o sorriso, a compreensão, os gemidos baixos e o... amor? Sim. Definitivamente era amor que morava nos olhos dela quando o fitava. Todo aquele conjunto era um lembrete cruel do que ele não podia ter na vida.

A Haruno se oferecia de bandeja, mas não era o suficiente. Bom, não que ela não fosse, ele que não o era. Marcado, ferido e ridiculamente traumatizado com um passado que estava morto e enterrado. Esse era ele e, com tantos defeitos, só conseguiria afundar aquela flor de cerejeira no lamaçal que o rodeava.

Sasuke não tinha escrúpulos. Isso nem sequer fazia cócegas em sua consciência, porém Sakura despertava um lado seu que o Uchiha pensou ter morrido com Konan. E a lembrança dela era justamente o freio que não lhe permitia perder o controle de si mesmo e ir implorar o perdão da Haruno. Em suma, era melhor que ela se casasse e permanecesse longe.

— Tsk! Você é péssimo nisso e deveria se envergonhar por tentar esconder algo de mim — a ironia fria na voz de Naruto o chamou de volta ao presente. — Porra, Uchiha, você não vai deixá-la escapar, sério?

Era isso que não queria. Em todo seu coração, ao menos nas partes que se salvavam, Sasuke nutria um imenso sentimento de amizade e gratidão pelo Uzumaki. Contudo, agora estava na hora do loiro seguir sua própria vida, sem ter que servir de escudo para alguém quebrado como ele.

— Você não deveria estar com sua esposa? — Devolveu o sarcasmo, com uma pontada de irritação.

— Deveria, não? — O outro ergueu uma sobrancelha loira, sorvendo o conteúdo do seu copo em seguida. — Mas minha lua de mel foi interrompida bruscamente, por causa de gente que não sabe lidar com os próprios problemas.

Doeu. Aquelas malditas palavras de Naruto o acertaram em cheio. Fez uma pausa antes de responder qualquer coisa, pois sabia que em seu estado de ânimo, o que quer que fosse falar, acabaria magoando o outro em uníssono, pois o Uchiha era do tipo que atacava a fim de se defender.