Capítulo 18- Motivo da dança: Parte 1

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Humaitá logo posicionou o seu punho direito à frente de seu corpo, como uma espécie de “ameaça” para Kura, o homem rapidamente puxou para trás o seu punho e avançou com toda a sua velocidade para cima do garoto, ele mirou justamente na cabeça do jovem rapaz, seria um golpe realizado de cima para baixo com toda a força e velocidade dele, seria um “esmaga crânio”. Kura ficou surpreso com aquilo, mas notou que o indigena estava sem seu equilíbrio e ritmo de antes, muito provavelmente, vindo daquele ataque que o militar realizou, que retirou parte desse equilíbrio, isso permitiu o garoto se desviar com um movimento lateral para a direita de seu opositor. Mesmo errando grotescamente seu alvo, Humaitá apenas se virou de volta e tentou acertar de novo o mesmo golpe no garoto, que dessa vez não só se esquivou do ataque, como também deu um soco de esquerda bem no queixo dele
—  Não acha melhor se entregar logo? Lutar pelos seus companheiros de crime não vai te levar a nada nesse duelo
Kura falou isso de forma calma e serena, esperando que seu oponente apenas caísse no chão e não pudesse mais lutar, porém, seu oponente se recuperou antes de cair,  o índio possuía um sorriso em seu rosto, aplicando novamente mais um poderoso soco contra o garoto, que apenas se defendeu pondo ambos os braços em posição de “X” na frente da região que seria atingida, claro, a força do impacto o fez recuar bastante, mas nada muito nocivo a seu território no combate
—  Lutar por aqueles animais?! Não fale esse tipo de merda na minha frente, não estou lutando por eles, mas sim por algo feito por eles!
O homem da dança disse isso com uma face de raiva, uma face de puro ódio e nojo, por alguém pensar que ele estava lutando por aqueles malditos terroristas, na mente de Humaitá, veio a lembranças do povo da sua pobre e isolada tribo em meio a mata, juntamente da imagem de uma criança de aparentemente doze anos e um animal ainda desconhecido. Ele lentamente moveu seu braço que ainda se mexia, em direção ao bolso da sua larga e confortável calça, puxando de lá uma espécie de colar que parecia ser uma homenagem a algum conhecido ou ente querido em sua vida. Mais um sorriso se formou em seu rosto,  com ele segurando aquele colar com força enquanto pensava
—  (Exatamente…. Eu não luto por aquelas pessoas, ou pela sobrevivência delas, eu luto pelo meu povo e a sobrevivência deles!)
Ele então voltou com aquele avanço, fazendo uma sequência de poderosos jabs de direita contra Kura, mesmo com o garoto se protegendo dos ataques de pura força e determinação de Humaitá, aquilo parecia ter se tornado ainda mais poderoso do que antes,  como se mais pessoas também lutassem naquela batalha, ao lado de seu inimigo. A resposta do militar, foi uma sequência de dois socos no peito do índio, obrigando ele a recuar um pouco as suas costas, mas algo que parecia uma queda, era na verdade um ato do criminoso para pegar impulso e acertar uma forte cabeçada em Kura, obrigando o garoto a recuar e responder o golpe com a mesma moeda e força. Humaitá logo segurou a cabeça de Kura, o indigena havia conseguido recuperar o movimento do braço a poucos momentos, conseguindo assim agarrar o garoto com ambas as mãos e com toda a força. A resposta do jovem da eletricidade foi idêntica, assim, ambos começaram a se acertar cabeçadas múltiplas, uma atrás da outra em uma sequência brutal  e poderosa
—  (Já faz vários anos, desde que eu tive uma luta tão emocionante assim, em toda a minha vida!)
O tribal pensava isso enquanto encarou Kura nos olhos, a chuva cai com força em cima do corpo de ambos, a água se mistura com o sangue e escorre pelo corpo dos dois combatentes, durante aqueles ataques de cabeçadas seguidos, Humaitá estava vendo o militar frente a frente, mesmo com a diferença de tamanho físico de ambos, demonstrando que o tribal reconheceu o garoto do exército, como um oponente de mesmo nível de força para cima
—  (Não é mesmo, irmão?!)
O índio pensou isso, com sua mente rapidamente começando a passar uma memória antiga da vida dele, uma em que era possível ver um Humaitá bem mais novo, acompanhado de uma outra pessoa de idade parecida. Nessa memória perdida, o jovem indigena colocou seu punho encostado com o de seu suposto oponente, sendo como aquele comprimento famoso, que logo em seguida, se tornou um punho se chocando com o outro a toda força e velocidade possível sinalizando o início de um combate  mortal entre os dois
—  (Ah é… Tinha isso, como foi que chegamos nesse ponto mesmo de se matar?... Irmão Itararé?)
Voltando vários e vários anos no passado, podíamos ver mais uma vez aquele mesmo garoto, aquela mesma imagem de um Humaitá mais jovem e irresponsável. Aquele garoto estava em uma espécie de penhasco florido, deitado encostado na entrada de uma caverna escura, relaxando com o “cabo” de uma flor na boca
—  Mas que sono… Não tem nada de interessante para fazer
Um animal feroz logo surgiu naquele campo, era uma onça-pintada das grandes e parecia agressiva, aquilo animou o garoto que pensou que iria finalmente fazer algo interessante para fugir do tédio, mas ele só conseguiu ouvir uma coisa
—  Quarup Taturana!
Rapidamente a cabeça da fera foi arrancada por um golpe flamejante realizado por outra pessoa, essa pessoa era o irmão gêmeo de Humaitá, Itararé. Ele chegou “roubando” a cena, pois já estava caçando aquele animal fazia alguns minutos. A versão jovem do homem que estamos observando o passado, rapidamente perdeu seu interesse e voltou a se deitar na pedra, dando um profundo suspiro e dizendo
—  Que estraga prazeres, já não tem nada para fazer e você ainda me rouba a presa perfeita!
Itararé foi se virando de forma calma em direção ao seu irmão, enquanto as chamas da sua dança iam cessando, ao mesmo tempo que um cheiro de carne assada iria subindo no ar, sendo obviamente o cheiro da carne do felino
—  Você não ia ficar tão entediado, se tentasse treinar o poder da sua dança, todas as gerações antigas fizeram isso, só você não faz!
O garoto que falou isso, tentou jogar uma pedra no irmão aparentemente distraído, mas este apenas tirou seu rosto do caminho e o fez errar o alvo com esse desvio. Um sorriso meio zombozo surgiu no rosto, ele apenas abriu lentamente os olhos e olhou para o seu irmão, enquanto fazia o símbolo de tocar algum instrumento musical com as mãos
—  Sabe, eu não gosto muito de dançar, mas acho que carreira de músico é bem mais interessante do que a de dança
Uma pedra atingiu a cabeça de Humaitá dessa vez, seu irmão havia finalmente conseguido acertar a pedra na cabeça dele, com os dois começando a rir logo em seguida daquela situação toda. Era uma relação de irmãos aparentemente “perfeita”, um era amigo e companheiro do outro e vice-versa, por mais que o nosso querido índio protagonista desta memória não fosse tanto de treinar quanto o seu irmão, ele de vez em quando efetuava alguns treinos “leves” e sem precedência alguma, apenas algo para seu pai não dizer que ele não treinou nada durante algum tempo 
—  Nossa, como você consegue gostar de treinar, o poder da nossa família ser ligado a isso é meio entediante
Humaitá falou isso a Itararé em mais um dos seus dias de treino aleatórios, o gêmeo apenas se concentrava naquele exercício por algum tempo, algo em torno de dois minutos e meio, até para aquilo e responder seu irmão
—  Pode até ser, mas eu ainda me sinto especial, ao ver que somos o caso raro de ter um “poder hereditário de família”
As falas do irmão do garoto, apenas o fez duvidar daquela resposta, pressionando ainda mais o seu irmão
— Mas qual o seu objetivo em treinar tanto assim, chegando até a desmaiar algumas vezes?
Itararé criou um sorriso alegre e inspirador no seu rosto, ele olhou bem nos olhos do seu irmão e falou para ele
— Eu quero liderar a nossa vila igual ao nosso pai, mas sei que preciso ser forte igual a ele para isso, por isso vou continuar treinando sempre, para ser forte assim como o nosso pai!
Humaitá ficou olhando atento para o seu irmão, chegando até mesmo a se emocionar um pouco e se animar com aquele sonho, ele sabia que a fala de seu irmão não acabou ainda, apenas esperou a finalização dela
—  Esse é o meu sonho, um sonho que carrego desde criança! E eu… Espero poder ter meu irmão mais novo junto comigo nessa, sendo o meu vice, ou algo do tipo
Itararé estendeu a mão para o seu irmão, a resposta que obteve foi um aperto de mão por parte dele
—  Claro que vou com você nessa jornada! Mas não vem com essa história de irmão mais velho, você nasceu só alguns segundos primeiro!
Ambos os irmãos tem um sorriso em seus rostos, se encarando com um sorriso amigável no rosto, o futuro parecia aguardar um futuro promissor e feliz para aqueles dois garotos sonhadores
—  Irmão Humaitá, nosso futuro parece incrível!
Humaitá apenas concordou com aquilo, aquele momento junto de muitos outros irão ficar nas suas memórias para sempre. Com o tempo, os irmãos foram treinando um com o outro, fazendo treinos lutando não só com animais, como também entre eles, todos os dias, do amanhecer ao entardecer sem pausa alguma nem mesmo para beber água ou comer alguma coisa. Os anos foram passando cada vez mais rápido, no início dessa longa jornada de treinos e sonho, ambos tinham apenas treze anos de idade, ao final desses treinos de força, resistência e estratégia de  combate, ambos estavam com dezessete anos de idade e com seus músculos bem desenvolvidos no fim de tudo isso. O poder do espírito de ambos também havia aumentado bastante durante esses quatros anos de treinamento severo nas matas daquela grande região verde e bastante viva. O pai de ambos os garotos os chamou para uma conversa séria e privada com os dois, quando os seus filhos chegam na cabana ele mandou eles entrarem e começou a falar com eles
— Bem, como vocês dois sabem, daqui a alguns dias vai acontecer o marabá jaci com o objetivo de decidir o próximo líder do nosso vilarejo. Como os meus filhos, eu quero que vocês lutem no torneio e mantenham esse título na nossa família, como é durante esses cem anos!
O pai deles falou isso com uma voz de ódio e batendo no chão com toda a sua força, o homem focou os olhos em ambos os seus filhos, como quem estivesse os pressionando a aceitar aquilo. Itararé rapidamente olhou seu pai nos olhos e falou com uma voz determinada e forte
—  Eu vou com todo o prazer, meu pai!
Humaitá olhou o seu irmão fazer isso, mesmo que o jovem humaitá não gostasse de batalhas e só quisesse curtir a vida, ele também olhou para o seu pai e falou da mesma forma de Itararé
—  Eu também vou meu pai! Se o Itararé vai, eu também vou!
Ali foi decidido, ambos iriam lutar nessa “guerra” pelo título de líder do vilarejo deles, ambos os irmãos iriam lutar naquele evento, Itararé pelo seu sonho e humaitá pelos sonhos do seu irmão gêmeo alguns segundos mais velho

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