Capítulo Vinte e Dois

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Boa leitura!
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Camila P.o.V
Quatro Anos Antes..

   Existem dois modos de ser ignorado pelas pessoas. No primeiro, você é apenas tão insignificante para elas que elas não lembram que você existe, podem até te ver todos os dias, quem sabe dar um oi ou um aceno, mas em seguida você se tornava invisível de novo, porque não era interessante o bastante para marcar uma multidão. No segundo modo as pessoas sabem sobre você. Falam de você, te olham estranho, e então usavam do seu truque mais cruel: o silêncio. Elas te olham de longe e ninguém se aproxima, cochicham sobre você mas quando você chega perto há um silêncio ensurdecedor. Fazem questão de que você saiba que está sendo ignorado, como um castigo.

  Eu sabia bem disso, porque a segunda opção era o resumo da minha vida escolar.

   Os sons estavam muito altos. Minha cabeça estava latejando de dor, mas tentei continuar na fila, como a professora pediu. Todo mundo na minha frente estava em dupla, rindo e cochichando enquanto esperávamos para entrar na escola a qual estávamos visitando para ver uma apresentação. Ninguém me escolheu ontem, como o esperado, mas tudo bem. A professora disse que ficaria comigo no lugar de Dinah, que ficou resfriada e mamá disse que ela deveria ficar em casa. Mesmo tendo dito que ficaria comigo, ela não estava agora, estava repassando as regras antes de nos guiar pela escola vizinha, pedindo para que a gente se comporte. Não consegui entender muito do que ela disse, meu cérebro se recusou a escutar porque havia tanto barulho. 

   Dez duplas sussurrando umas com as outras, rindo. Dentro dessa nova escola o som de conversas abafadas denunciava como seria barulhento também. Tem uma música estranha tocando lá dentro, e tentei focar nela para que o resto parasse, só que não funcionou. Os cheiros eram novos. Fiquei tão perdida em tentar identificar eles que só fui notar que tínhamos permissão para entrar quando todo mundo na minha frente começou a andar. A professora não voltou pro meu lado, como ela prometeu. Engoli seco, fingindo não estar assustada com isso. Quanto tempo vai levar até que eu me torne normal?

   A escola era bem parecida com a nossa. Não era muito grande, as paredes eram em um cinza bem fraco, e tinha bastante flores no jardim. Ela estava enfeitada com o tema da apresentação: Meio-Ambiente e Vida, o que me animou um pouco porque era algo que eu gostava de estudar. Conforme andávamos, vi vários cartazes sobre isso com alguns desenhos e um deles me chamou atenção. Não tinha nada de especial, era só o desenho do planeta com uma árvore em cima, gigante, ocupando o topo, mas algo nele me fez parar, fascinada. Ele era bonito, e estava pintado melhor do que os que estavam do lado, com bastante detalhes no tronco e nas folhas, que tinham até tons de verde diferentes. Uma sensação esquisita ficou no meu peito quando tentei ler o nome de quem desenhou e encontrei um L. Michelle Jaure.. O resto estava um pouco embaçado, como se houvessem derrubado água em cima.

  Voltei a seguir a fila dupla após a professora me chamar, e ouvi algumas risadas por causa disso. "Ela é tão esquisita", uma garota sussurrou na frente para um ômega. "Não fala isso, Stephany. Ouvi dizer que por muito menos ela fez um menino mijar nas calças." Sussurrou de volta, em um tom baixinho, com medo de que eu escutasse. Mas eu escutei. Era impossível para mim não escutar e isso me fez engolir seco, odiando como meus instintos me faziam escutar até a respiração deles, odiando como isso fazia minha cabeça doer, odiando o cheiro de medo que eles tinham sempre que ficavam perto de mim. Tentei me lembrar do que aprendi na consulta com a psicóloga Jennie, e mamá. Ela disse que eu deveria lembrar de coisas boas, em situações assim. "Uma vez, Jeremy disse que ela fez os ouvidos do Lucca sangrarem quando ele chamou ela de esquisita", a outra continuou "Eu vi isso! Tenho certeza que foi bruxaria". Não consegui.

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