Ninguém disse que seria fácil.

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Carina acabou de resolver seus assuntos na universidade e voltou para casa, a fim de fazer as malas com a ajuda da Senhorita Tequila. Na manhã seguinte, a maioria das roupas de Carina estava dentro de duas malas grandes. Sem querer admitir a derrota para si mesma (ou para a tequila), decidiu não pôr tudo nas malas. Assim, se viu à toa, ansiosa e precisando se distrair. Então fez a única coisa que qualquer estudante faria numa situação dessas, além de beber e cair na farra com outros estudantes: uma faxina no apartamento. Não demorou muito.

Mas, quando terminou, tudo estava na mais perfeita ordem, com um ligeiro perfume de limão e meticulosamente limpo. Carina se orgulhou bastante de seu feito e arrumou a mochila de cabeça erguida. Enquanto isso, a professora Bishop atravessava a passos firmes os corredores do Departamento de Estudos Italianos, sem dar a menor atenção a qualquer aluno ou colega que cruzasse seu caminho. Estava com um mau humor terrível, e ninguém teve coragem de se meter com ela. Seu gênio já andava péssimo nos últimos tempos, mas sua rabugice tinha sido exacerbada pelo estresse e pela noite em claro. Fora amaldiçoada pelos deuses da Air Canadá, acomodada ao lado de um pai com uma criança de 2 anos no voo de volta de São Francisco. O bebê berrava e fez xixi na calça (e na professora Maya), enquanto o pai dormia a sono solto. Ao tentar limpar sua calça Armani na penumbra do avião, Maya havia refletido sobre a justiça da esterilização compulsória de pais negligentes.

Carina chegou para a reunião às quatro em ponto. Ficou satisfeita ao encontrar a porta de Maya fechada. Porém sua satisfação logo passou quando ela percebeu que a professora estava lá dentro, rosnando para Gabriela. Quando Gabriela saiu, dez minutos depois, visivelmente abalada, mas com a cabeça erguida no alto, Carina olhou de relance para a saída de emergência. Cinco passos e ela estaria do outro lado da porta, livre, correndo para escapar da polícia por ter acionado desnecessariamente o alarme de incêndio. Parecia uma hipótese tentadora. Gabriela olhou para ela e balançou a cabeça, balbuciando alguns xingamentos contra a professora antes de sorrir e dizer:

– Quer tomar um café comigo um dia desses?

Carina a encarou, surpresa. Estava um pouco desnorteada por causa da reunião, então, sem refletir muito, concordou. Gabriela sorriu e se inclinou na direção dela.

– Seria mais fácil se você me desse seu telefone. – Carina ficou vermelha e pegou rapidamente um pedaço de papel. Depois de conferir se não havia nada escrito nele, rabiscou o número do seu celular. Gabriela apanhou o papel, olhou para ele e afagou o braço de Carina.

– Acabe com ela, Coelhinha.

Carina não teve tempo de perguntar por que ela achava que seu apelido fosse ou devesse ser Coelhinha, pois uma voz atraente, porém irascível, a chamou.

– Agora, Srta. Deluca. – Ela se encaminhou para a sala e parou, hesitante, junto à porta. A professora Bishop parecia cansada. Estava com olheiras acentuadas e muito pálida, o que de certa forma fazia com que parecesse mais magra. Enquanto analisava um documento, passou a língua devagar pelo lábio inferior. Carina ficou hipnotizada, observando sua boca sensual. Algum instante depois, com grande esforço, se concentrou nos olhos azuis da professora. Na mesma hora ela percebeu que não só nunca tinha visto uma professora tão atraente como jamais encontrara uma que se preocupasse tanto com a própria aparência. Ela poderia estrelar uma campanha publicitária da Prada, coisa que nenhuma outra professora jamais havia feito. Carina a conhecia bem o suficiente para saber que ela era volúvel.

Também a conhecia bem o suficiente para saber que era, pelo menos nos últimos tempos, uma defensora das boas maneiras e do decoro. Provavelmente poderia se sentar em uma de suas confortáveis poltronas de couro sem ser convidada, ainda mais se Maya se lembrasse dela. Mas, por causa do tom de voz dela, ficou de pé.

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