Amour

unha e carne

nota da autora: (!!!!!!!!!!!!!!!)

2023 foi um ano de mudanças para mim. encontrei minha melhor versão, evoluí na escrita, me foquei muito, mas muuuito em tudo aquilo que a vida me reservou e ainda me reserva daqui para a frente. desculpem por estes 9 meses sem notícias. amo cada um de vocês.

<3

Yor nunca tinha reparado no quão cheiroso aquele cobertor era. A textura suave da manta azul, com pequenos ícones de golfinhos em si cravados, envolviam a mulher numa mistura de conforto e solidão. Sabia que se tratava de falso calor, que não era realmente uma pessoa a envolvê-la, e sim algo que estava guardado no armário há uns bons e valentes anos.

Deu por falta do esposo no mesmo momento, mas tinha os pensamentos confusos. Demorou uns minutos a aperceber-se de onde estava, quem era e porque diabos não tinha prendido o cabelo na hora de dormir. Acordaria com óleo da raiz ao comprimento. Entrou numa luta interna, queria respostas que não sabia quando chegariam. Queria não ter respostas. Mas queria saber. Mas também sentia a mente pesada o suficiente para que a mesma deitasse no travesseiro forrado com cetim e entrasse num sono profundo.

- Está melhor agora, querida?

Aquela voz despertou-a. Ainda devo estar a sonhar, imaginou. Provavelmente estou a falar sozinha durante o sonho e quando acordar Loid vai repetir tudo o que eu digo rindo alto.

- Amor? - Foi quando sentiu a textura extremamente suave de uma mão colocando os seus cabelos levemente para trás que entendeu que talvez, só talvez, já estivesse acordada. - Você quer dormir um pouco mais? - Carregava doçura, calma. O quarto estava silencioso sem contar com as vozes confusas que Yor ouvia na mente e a voz inconfundível de Loid. 

- Lottie? - Levantou o rosto sem abrir os olhos, ou seja, sem saber direito para onde olhava. Sentia a boca suja, assim como um bebê acorda babado após uma longa noite de sono e o peso nos olhos era algo fora do normal.

- Meu Deus, Yor. - Sentiu um riso irónico vindo entre as palavras do homem. - Nosso garoto está realmente se mostrando. É impressionante que você continue bonita em qualquer que seja a situação. - Pegou delicadamente na mão da esposa e levantou-a da cama, erguendo-a em pé. Viu os seus olhos cor de rubi se abrirem lenta e confusamente, encarando-o. - Linda. - Viu a mulher rir baixinho. 

A encaminhou até o sofá da sala de estar, onde Anya a aguardava sentada perto da mesinha de centro e rabiscando algumas folhas de papel. Estava confusa e de olhar tristonho, nunca tinha visto sua mamãe daquele jeito, mas decidiu não se aproximar, já que tinha conversado calmamente com o pai enquanto a mãe dormia e chegado a suas próprias conclusões. Foi difícil, descreveu em sua mente. Queria abraçar a mamãe.

- Oi Nini! - Yor chamou assim que o esposo a sentou no sofá espaçoso, se sentando ao lado dela e passando seu braço ao redor da cintura da mesma, num claro sinal de afeto. Proteção. Amor. Amour.

- A mamãe acordou? - Mantinha seu semblante tristonho, ainda que curioso e isso era o suficiente para que se despertassem ainda mais dúvidas na cabeça de Yor. O que será que tinha acontecido antes dela adormecer? "Nosso garoto"? Teria a ver com a gravidez? 

- Sim, meu amor. - Sorriu de volta, sentindo a mão do esposo subir e descer em suas costas por baixo da camiseta.

- Tudo bem, mamãe? - Um biquinho se formava.

- Nini. - Loid interrompeu. - A mamãe está bem, o papai conversou com você, certo? - A menina assentiu antes de abrir uma cara de choro enorme. Situações tensas como estas deixavam-na ansiosa. - Oh, Deus. - Largou a esposa por um segundo apenas para segurar a filha no colo e a ninar. A menina se acalmou e, com os olhos abertos cheios de lágrimas, repousou no ombro do pai chupando seu polegar.

- Amor, o que aconteceu comigo? - Yor finalmente tentou perceber o que estava acontecendo, que tipo de cena a filha poderia ter testemunhado. Loid se aconchegou no sofá, segurando a menina com um braço e a esposa com o outro, e suspirou antes de contar.

- Você tinha acordado de manhã completamente normal, tomamos banho juntos e você banhou a Nini, mas quando saiu para o café da manhã você simplesmente desmaiou no meio da sala. Seus batimentos cardíacos quase não se sentiam, eu não conseguia sentir você respirar e - trouxe a esposa para mais perto - eu pensei que você não estava mais connosco. Eu nunca senti tanto suor em tão pouco tempo, amor. Como se eu tivesse corrido muito sem parar. Eu nunca tive tanto medo de te perder como essa manhã. - Levantou o rosto para encarar a esposa, que percebeu que o homem chorava. - Desculpa amor, isso passa.

Yor não sabia ao certo o que dizer. Depois de instantes paralisada, arriscou perguntar: - Você...você acha que tem a ver com a gravidez? Que estamos correndo algum risco? Algo do tipo?

O homem desviou o olhar para a filha que entretanto havia adormecido no seu ombro e acariciou suas costas antes de encarar a janela e reparar como todos os seus vizinhos tinham decidido deixar as ruas desertas naquela tarde chuvosa. Demorou tempo até tomar coragem para olhar para a esposa. - Eu acho. - Yor engoliu seco. Era verdade e eles não poderiam ignorar os sinais e correr atrás de utopias. Era a primeira gravidez de Yor mas se considerava sábia o suficiente para perceber a normalidade de certos sintomas. - Você...quer conferir isso no médico depois?

Yor não hesitou em afirmar, o que aliviou Loid. Nunca havia sentido nada assim. Em todas suas missões, em todas as mulheres com que se envolveu, crianças que salvou e em todas as desgraças que já testemunhou, Loid nunca havia temido tanto a morte como naquele dia. Afinal, tratava-se da sua mulher. Da mulher que o desviou daquilo que apelidava de vida mundana, que o fez pensar e refletir, que lhe apresentou o Loid Forger e o fez se despedir de Twilight. A mulher que fez seu coralão bater novamente e que agora carregava um fruto deles que para o homem simbolizava o mundo.

Não deixaria a mulher fugir.

Seriam como unha e carne.