Preparando Caminhos III

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Novamente, estou no bar Cachaceiros Robóticos, agora ocupando a cadeira de uma mesa numa extremidade afastada, inclinada para trás e com as pernas esticadas em cima da mesa, que está vazia e limpa. O bar em si está com pouco movimento, tendo, além de mim, um casal de humanos ocupando duas banquetas perto do balcão, comendo carne de rato assado no espeto.

Na minha mão está uma revista digital que encontrei largada numa caçamba de lixo perto daqui. Revistas digitais são como uma pequena tábua transparente de cristal cheio de imagens, funcionando como uma espécie de tablet. A primeira página mostra uma notícia de 2074, quando o Brasil invadiu e anexou a ilha de Cuba ao seu território. A imagem de fundo da página mostra a ilha paradisíaca cercada por naves sobrevoando a sua costa, derramando chuvas vermelhas de raio laser, isso durante um dia de céu límpido e ensolarado.

Eu toco o dedo indicador na tela para reproduzir o áudio da notícia:

— Em 30 de Maio de 2062, o Brasil invadiu a ilha de Cuba, derrubando a ditadura comunista local e anexando a ilha ao território brasileiro — a voz do narrador é masculina e eletrônica. — Tudo começou quando, em 21 de Abril desse mesmo ano, um míssil intercontinental de ultra velocidade explodiu o Cristo Redentor na cidade do Rio de Janeiro, o que ocasionou no famigerado Distúrbio Carioca. O governo federal imediatamente acusou a Argentina por ser um dos poucos países da América Latina a ter posse desses tipos de mísseis, o que desgastou ainda mais a relação diplomática entre os dois países.

A revista alterna automaticamente de página, agora mostrando uma imagem do Cristo Redentor desmoronando sobre um fogaréu durante um dia de sol.

— No entanto, o serviço de inteligência brasileiro descobriu um arsenal secreto desses mesmos mísseis na ilha de Cuba. A ditadura cubana, liderada pelo comunista Ernesto León, admitiu publicamente em um tom debochado e arrogante que ordenou o lançamento do míssil para fazer um teste de reação. Se foi um ato de coragem ou de loucura por parte do ditador tirano, isso pouco importou para os brasileiros, pois os mesmos comemoraram a invasão a ilha da mesma forma como quando se comemora o ano novo, e comemorou ainda mais quando a seleção brasileira jogou futebol com a cabeça decapitada de Ernesto León.

A próxima página mostra soldados androides brasileiros marchando em meio à cidade de Havana, capital de Cuba, durante uma tarde de pôr do sol, sob um céu alaranjado.

— Mas o que era uma ilha parada no tempo contra infantarias de eletrodomésticos militares e drones armados com metralhadoras laser? Os cubanos não tinham a menor chance. O Brasil ocupou a ilha inteira em menos de uma semana e anunciou que seria anexada ao seu território, e foi aí que as tensões pelo mundo começaram. A primeira consequência foi a China ter cortado relações comerciais com o Brasil, que não se viu afetado por isso, pois o Brasil não dependia da China como muitos pensavam. Muito pelo contrário. Era a China que dependia do mercado brasileiro. Toda e qualquer exportação de alimentos produzidos no Brasil para a China foi cortada, e o resultado foram centenas de milhões de chineses mortos pela falta de comida no evento conhecido como a Segunda Grande Fome da China, tendo a primeira ocorrido no começo dos anos 1960, durante a ditadura de Mao Zedong. O presidente do Partido Comunista Chinês, Meng Jaoping, tentou voltar atrás com a decisão, mas o Brasil não queria mais diálogo com países comunistas e mandou Jaoping enfiar o dedo naquele lugar.

A próxima página mostra a bandeira do Brasil na metade superior e a dos Estados Unidos na metade inferior.

— Com a China em crise, os Estados Unidos viram a sua economia sofrer uma queda abrupta, enquanto o Brasil estava ficando mais e mais poderoso a cada ano. Como se não bastasse, o petróleo estava acabando e o mundo precisava buscar fontes alternativas de combustível. A América do Sul já tinha a sua própria fonte ilimitada de combustível. Enquanto o mundo temia o avanço da inteligência artificial, o Brasil foi com tudo e apostou todas as suas fichas nessa área, tornando-se a primeira economia do mundo a ter 80% do seu mercado gerido por máquinas inteligentes. Futurólogos indicam que o Brasil se tornará mais poderoso que os Estados Unidos da América em muito pouco tempo.

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