Ignorância é Força

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[X-Mauro-X]

A escuridão começa a dissipar para os lados, parecendo uma cortina negra se abrindo para os lados, revelando uma visão da praia de Boa Viagem durante a noite, cheia de lixo e pedaços de robôs destruídos espalhados ao redor. Os prédios mais à frente estão depredados, como se houvessem sido atingidos por um terremoto de alta magnitude. As ruas estão lotadas de cadáveres humanos e robóticos. Gritos de horror e desespero estão cantando em sintonia com o vento. Avisto fogo e fumaça à distância também.

De repente, uma luz muito forte preenche a minha visão em completo branco. Quando essa luz se dissipa, um gigantesco cogumelo de fogo se levanta colossalmente por trás dos edifícios, e os meus ouvidos começam a zumbir ZINNNNNN. O céu ganha uma coloração vermelho-sangue, como o se o Inferno estivesse caindo sobre a Terra. A muralha de fogo nuclear corre como um tsunami furioso e avassalador, fazendo os destroços rodopiarem e colidirem violentamente em um efeito avalanche.

Meus olhos arregalados refletem o imenso cogumelo flamejante, até que o fogo me abraça e a minha carne começa a ser dilacerada; meus olhos virando água e meu rosto virando caveira.

OÁRRRRRRRRRRGH!

De repente, tudo se apaga, e os meus olhos se abrem, visualizando um teto cinza e encardido. Minha cara está toda suada, e a minha boca ofega de instante em instante. Olho para o meu corpo, coberto até o pescoço por um lençol feito de trapos marrons costurados.

Olho para a esquerda e suspiro em surpresa, vendo a menina Aline e o velho Pedro ajoelhados ao meu lado, com os dois braços esticados para o alto, cruzados em forma de X, simulando dois braços acorrentados. Eles estão cabisbaixos, com os olhos fechados, mas a boca se movimentando.

Cure este corpo, ó Santo Garcia — estão orando ao mesmo tempo. — Derrame sua luz e traga-o de volta ao seu paraíso igualitário. Cure este espírito comunista e livre-o de todo o mal capitalista...

Olho para isso com a boca aberta. O que estão fazendo? Deslizo o corpo sobre a cama e me ponho sentado. A cafeteira Nanito também está aqui, orando em cima de uma mesinha de madeira velha frente aos pés da cama.

Olho para cada um deles sem entender nada.

— O que estão fazendo?!

O trio suspira em surpresa ao mesmo tempo, e ao mesmo tempo eles sobem os olhos para me encarar com uma expressão perplexa e surpreendida.

— Ele despertou — Pedro sorri largamente, com os olhos brilhando como se houvesse chorado. — Por vossa santidade, ele despertou!

— Sim — a menina Aline também sorri, mostrando os dentes amarelados. — Vossa santidade salvou ele!

— Obrigado, vossa santidade — Nanito balança as mãozinhas unidas para o alto. — Obrigado por todo o amor que existe em seu coração puro!

Minha cara transmite confusão ante tudo isso. Olho ao redor, movendo a cabeça. Estou dentro de um pequeno quarto sujo e pobre, com paredes cinzentas descascadas e janelas empoeiradas. O chão está coberto de um tapete vermelho rasgado, cheio de manchas e sujeira acumulada. Um armário velho e enferrujado está em um canto, com duas portas que mal conseguem ficar fechadas. As roupas penduradas dentro estão todas desbotadas, indicando sinais de muito uso e negligência. Uma única lâmpada pendurada no centro do teto emite uma iluminação fraca.

O fedor de mofo e umidade penetra o meu nariz a cada respiro, de modo que não evito em fazer uma e outra careta de nojo.

— Argh... — levo a mão ao rosto, tapando o nariz. — Porra...

URCASUL - Entre Santos e MáquinasOnde histórias criam vida. Descubra agora