[X-Lilian-X]
— 99% dos arquivos já foram copiados para o seu computador pessoal, coronel — diz um miliciano. — Falta só cinco minutos, agora.
— Ótimo — ouço o coronel falar atrás de mim. — Amanhã mesmo irei começar a vasculhar esses arquivos. Os segredos do Foro de São Paulo... Quem diria que um dia eles cairiam na minha mão.
Eu permaneço sentada na poltrona, com uma coroa de metal platinado envolvendo os entornos da minha cabeça, coroa essa que está ligada a um computador de mesa bem atrás de mim, dentro do escritório oficial do coronel Silva Torres. Estou mais de dez horas aqui, plantada, olhando apenas para a parede de madeira lisa e cintilante à frente. Pelo menos, o encosto da poltrona está um pouco inclinado para trás, o que me deixa numa posição de conforto. Mas até disso eu já estou ficando farta. Pelo menos está perto de terminar, agora.
Durante o aguardo, uma geladeira miliciana passa andando na minha frente, depois passa um drone de carapaça amarela. Ouço o rangido de uma porta se abrindo, depois ouço passos ecoando para fora do escritório, depois para dentro, depois para fora de novo. Um som de tiro troveja do lado de fora do palácio, não muito distante.
— Cópia efetuada com sucesso, coronel.
— Finalmente — ouço os passos dele batendo para perto de mim. — Tirem o equipamento dela.
A coroa metálica é desconectada e retirada da minha cabeça, depois desativam as algemas holográficas prendendo os meus pulsos nos braços da poltrona. Um androide com uma bandana vermelha ocultando a boca aparece, apontando o fuzil na minha face.
— Anda, levanta!
Ponho-me de pé finalmente. Olho para o lado esquerdo e vejo o coronel vindo até mim.
— Você cumpriu bem o acordo — ele me fita com um meio sorriso labial. — É hora de receber o pagamento.
Arqueio as sobrancelhas.
— Pagamento?
O coronel faz um gesto súbito com a mão e um miliciano me entrega um saco grande de baterias.
— Aí estão trezentas baterias — diz o coronel. — Esse era o pagamento que Dom Chibata esperava receber pelo carregamento de água. Agora, é todo seu.
Todo meu? Fico sem saber o que dizer. Abro rapidamente o saco e confiro os múltiplos quadradinhos metálicos cintilando lindamente para mim, como se sorrindo.
Expresso um sorriso de contentamento.
— Nossa. Obrigado.
— Bons acordos devem ser respeitados. Agora, dê o fora daqui. Preciso ir cagar — o coronel passa por mim e se retira do escritório, sendo escoltado por dois milicianos androides. Outros dois milicianos vêm e me escoltam para fora do palácio, primeiro descendo a escadaria principal do andar superior para o salão principal, onde vários outros milicianos estão fazendo vigília. Todos os olhos ficam me seguindo até a entrada.
— Oi, lindooooos — alguém ativou um rádio. — Eduarda Quarenta e Seis aqui outra veeeeeez! Está bem, já estou farta de ficar cantando toda vez que começo a narrar, mas eu vou continuar simplesmente porque eu amo vocês demais... Vamos para as notícias, meus lindos! Já ouviram falar na Chapada do Araripe, uma área acidentada e repleta de mato ao sul dos Ermos Cearenses?! Pois é, meus lindinhos. Sabiam que o lugar é dominado por uma tribo grande de androides primitivos?! Sim, e eles se chamam Tribo Araripe, e estão lá já faz mais de cem anos. Eles são extremamente violentos e não gostam nem um pouco de estrangeiros. Até desenvolveram uma linguagem própria! Rituais próprios, cultura própria, até uma religião que louva um deus esquisito lá chamado Comemeocu. Se estiverem passando por lá, por favor, meus lindinhos, tomem cuidado, sim? Agora, vamos para um breve intervalo porque eu preciso bater uma siririca.
VOCÊ ESTÁ LENDO
URCASUL - Entre Santos e Máquinas
Science FictionEntre 2040 e 2050, o progresso tecnológico transformou o Brasil na maior potência na área de robótica e inteligência artificial de todo o mundo, ameaçando ultrapassar a economia dos Estados Unidos e da China em poucas décadas. Tal sonho foi desmoron...