Marcha Feminazi II

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[X-Lilian-X]

Sou guiada para dentro das ruínas de uma antiga delegacia de polícia, cuja estrutura de concreto rebocado se encontra infestada de buracos, rachaduras, vidros quebrados e mofo cobrindo a maior parte das paredes, dando a impressão de que tudo irá desmoronar a qualquer momento, o que não seria de se estranhar, tendo em vista que o mundo passou pelo caos mais virulento de sua história. Não é fácil uma estrutura desse tipo se manter de pé durante um caos mundial, e o Holocausto Cibernético em si foi muito mais do que isso.

Murilo flutua ao meu lado direito enquanto somos escoltados em direção a um lance de escadas para subir, ao fundo do salão oco e úmido, onde todos os sons ecoam junto ao vento. As extremidades do salão estão um mar de escombros e desordem. Celas estão abertas, com as grades arrancadas fora. A sala do interrogatório, desde aqui, vejo que está totalmente vazia. Tudo parece ter sido saqueado há muitos anos.

Observo as varandas altas ao redor, onde androides feminazistas deambulam, umas fazendo vigília, outras fumando cigarro eletrônico; outras estão jogando conversa fora, dando risada de alguma piada boba sobre homens de pinto pequeno.

— Antes de virar feminazi — diz uma androide de pele muito clara e olhos amarelo-brilhantes. —, eu tinha um namorado que tinha um pinto do tamanho do meu dedo mindinho — exibe a mão para as amigas. — Estão vendo?

— Mas você não tem dedo mindinho — observa uma delas. — Você perdeu quando um papafigo te mordeu.

— Exatamente, meu amor. O que o papafigo fez com o meu dedo, eu fiz com o pinto dele.

Eu subo os degraus um a um, e as feminazis atrás de mim batem os pés em passos perfeitamente iguais, como numa dança coreografada. Uma feminazi bloqueia o caminho do corredor e aponta para a minha esquerda. Em um alto-falante no alto da parede, a música Koniggratzer Marsch toca, ofuscado por um intenso ruído branco, fazendo com que o seu volume permaneça sempre baixo.

Viramos um corredor à esquerda e seguimos. Uma feminazi passa por nós, arrastando um garoto pela parte de trás da argola da camisa.

Nãããããão — o garoto urra e chora, com as pernas mutiladas deixando rastros de sangue pelo chão. — Não quero morrer, não, nããããããão!

CALA A BOCA — a feminazi puxa com mais violência. — ACHA QUE EU NÃO TE VI OLHANDO PRA MINHA BUNDA?! TODO HOMEM É UM ESTUPRADOR EM POTENCIAL E VOCÊ NÃO É DIFERENTE!

Eu sou só uma criança!

— QUE SE FODA! EU TÔ COM TPM!

Nós continuamos a andar sem interrupções, os gritos se perdendo atrás de nós.

Somos direcionados para uma porta automática aberta à direita e entramos. Adriana Hetler encosta o traseiro em um balcão negro ao fundo.

— Deixe-nos a sós — ela diz, sorrindo com o canto do lábio.

A porta se fecha atrás de nós e ouvimos um bip de tranca automática. O local que entramos deve ter sido o escritório do delegado. Está iluminado apenas por uma pequena faixa de luz azulada no centro do teto, com as paredes cinza-escuras ficando praticamente camufladas nas sombras. Dois sofás brancos estão posicionados no centro, um de frente para o outro, com os dois braços colados e fundidos, servindo apenas como objetos de decoração. Não há qualquer cômodo para se sentar aqui, nem mesmo atrás do balcão. Este lugar não foi feito para ser uma sala de reunião. Está muito longe de ser qualquer outra coisa que alguém possa chamar de normal.

Olho para Adriana Hetler sem entender.

— Por que não me matou?

— Eu te disse que aprecio a honestidade — ela levanta a pistola 10mm que Eletropaulo havia me dado e me aponta com ela. — Mas se quiser que eu te mate — está apontando direto para a minha face. — Não vai ser problema — seu dedo está bem firme no gatilho. — No entanto, uma conversa seria mais interessante do que uma morte, vocês não acham? Ando muito entediada.

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