Sangue e Cinzas

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"Queridos Tom e Bill,

Acho que vocês nem tiveram tempo de explorar totalmente a extensão dessa casa, mas três quilômetros acima da trilha dos carvalhos, há uma clareira e próximo a ela, uma construção que estava abandonada. Quando Gustav e Georg perguntaram se poderiam transformar em um jazigo, apenas confirmei com a cabeça. De inicio, demorei para associar a palavra ao sentido literal, mas depois percebi que algo fúnebre e mórbido faria sentido nesse momento. 

Logo depois que Taylor trouxe a notícia que arrancou o que restava do meu coração, começaram a organizar o velório... de vocês, para vocês. Fui praticamente arrastada por tia Pam. Ela enfiou um sapato de salto fino e um vestido preto em mim, de renda até os joelhos e com mangas compridas. Horrível! Você detestaria, Bill. Todos acharam que deveríamos nos despedir adequadamente. Que seria bom para mim e para as crianças homenagearmos vocês. Pensei em dizer que não, que não queria fazer isso, mas acho que organizar esse momento foi importante para eles. Então apenas me deixei levar. Não disse uma palavra enquanto me mostravam fotos de ornamentos de flores e caixões, quando decidiam o tipo de coquetel que seria servido e a música para tocar. Achei tudo ridículo e de extremo mal gosto. Servir salgadinhos depois que se enterra uma pessoa? Quem inventou essa prática cruel e insensível? Eu queria gritar, queria berrar que isso não era o que vocês queriam, que isso era lancinante... comigo. Com meus filhos. Mas, apenas balançava a cabeça, concordando com tudo o que sugeriam. Caixão de mogno encrustado a ouro? Flores azuis e vermelhas, dizeres esculpidos em obsidiana? O que acha disso, o que acha daquilo... e me torturaram durante horas com coisas totalmente sem sentido para mim. Mas, se eles precisavam disso, eu faria.   

Me colocaram em uma cadeira de frente para os caixões. Os caixões de vocês! Entre eles, estava um quadro com uma foto suas, ambos sorrindo um para o outro. O sorriso que tanto aqueceu aquela coisa que costumava bater em meu peito. Que me fez sonhar com vocês depois que os vi pela primeira vez. Vocês estavam tão felizes naquela foto! Sei disso, pois fui eu quem a tirou. Que capturei o momento em que brincavam um com o outro para me fazer sorrir. Vocês sempre faziam isso, sempre davam um jeito da minha risada sair alta e aguda. Vocês, muitas vezes, fechavam os olhos quando isso acontecia e eu, na minha curiosidade infinita, perguntei porquê faziam isso. 

"Tua risada faz com que nos sintamos vivos!" Tom respondeu. "O som dela nos lembra o motivo de porquê queremos continuar vivendo!" Bill completa. 

Vocês nunca souberam o quanto essas palavras foram necessárias para mim. O quanto me senti importante, senti que alguém me amava, que alguém precisava de mim. Mas, tudo virou cinzas quando as palavras do pastor começaram a ser proferidas. O véu de renda branca caiu em meu rosto. Aquela outra metáfora. Esse véu limitou minha visão e dessintonizou o que quer que estivessem falando. Não consegui ouvir. Não queria ouvir. Ter que fazer aquilo foi doloroso demais. 

O véu me ajudou a aguentar os abraços e os pesares. Me ajudou a me manter sentada no sofá, com as mãos cruzadas em frente ao corpo e e respirar. O véu não me permitiu ver quem estava ali. Me ajudou a passar pelo momento que seus caixões foram levados e o buraco em meu peito quase me engoliu por completo. Minhas pernas não fraquejaram quando caminhei os três quilômetros até o jazigo. Quando meu salto colidiu com os cascalhos e pedras pequenas e afundava na terra fofa. Caminhei entre os caixões de vocês, sentindo o pavor se acumular em meu peito a cada passo. O véu me ajudou a não ver o que estava acontecendo até chegarmos lá. Naquele momento, eu só conseguia repetir incessantemente em minha mente. 

Foi minha culpa.

Me desculpem. 

Foi minha culpa.

Me desculpem.

Foi minha culpa.

Me desculpem. 

Depois que todos foram embora, eu continuei naquele jazigo. Há uma pedra polida no meio e as duas lápides de vocês, lado a lado. Tom Kaulitz | Bill Kaulitz. Tom Kaulitz | Bill Kaulitz. 

Foi minha culpa.

Me desculpem.

Foi minha culpa.

Me desculpem.

Foi minha culpa.

Me desculpem. 
Me desculpem.
Me desculpem. 
Me desculpem.

Graças ao véu, não escutei quando o grito saiu da minha boca e arranhou minha garganta. Não vi quando tentei abrir a tampa e tirar vocês daquele lugar frio e apertado. Não senti quando minhas mãos sangraram e cai no chão e não consegui levantar. Não vi quanto tempo se passou e fiquei ali. Não vi como fui para a casa, muito menos quem tirou minha roupa e me deitou na cama. "Como está se sentindo?" tia Pam perguntou e a água do lago transbordou em minha garganta. Vesti o véu novamente e  só consegui enxergar suas mãos por baixo da renda. Não senti quando ela tocou meu rosto, nem escutei quando disse mais alguma coisa. Não respondi. Mas não porque não queria que ela soubesse como me sinto e sim porque não consegui dizer. 

Me sinto morta, titia.

Me sinto responsável pelo que aconteceu.

Por perder os amores da minha vida. 

Me sinto um lixo. 

Queria ter morrido com eles. 

Quero morrer. Quero morrer. Quero morrer.

Mas, apenas fiquei em silêncio.  

O buraco em meu peito não parou de crescer e sangrar. Estou submersa nesse lago, nessa parte profunda e vazia e escura que se criou. Estou presa em minha própria mente. Aqui, meus olhos estão fechados, há uma venda que me impede de enxergar, que no meu aqui e agora, vocês não fazem mais parte. Estou acorrentada as barreiras que eu mesma criei, na dor gritante e insuportável, que me castiga e puni, dia após dia. 

"Você os condenou, você os matou, você perdeu. A culpa é sua sua sua sua sua". 

Segundo após segundo digo essas palavras em silêncio, apenas para mim, na minha consciência perdida.

 "Você os condenou, você os matou, você perdeu. A culpa é sua sua sua sua sua". 

Me desculpem.
Me desculpem. 
Me desculpem.
Me desculpem. 
Me desculpem. 

Mas, ao mesmo tempo, essa dor me lembra que foi real o que vivemos. Que foi verdadeiro até tirarem... até tirarem isso de mim. E eu aguento essa dor! Aguento quanto for, se sempre me lembrar que tudo foi real. 

Quando vocês se foram, grande parte de mim se foi também. 

A parte que sorria.
A parte que gargalhava.
A parte que dançava.
A parte que acreditava.
A parte que era feliz. 
A parte que sentia.
A parte que queria viver. 

Sinto muito. Sinto tanto. Que não sinto nada. 

Me desculpem.
Me desculpem. 
Me desculpem. 
Me desculpem. 

Nunca vou me perdoar.

Me desculpem.
Me desculpem.
Me desculpem. 

Sinto saudade!

Saudade que me maltrata!

Sempre de vocês!

B."

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Nome do capítulo é saga de livros da Jennifer Armentrout. Indico! 

Estou recuperando o fôlego para o próximo capítulo. 

Beijos.

S.





























Criminous Paradise | TOM E BILL KAULITZOnde histórias criam vida. Descubra agora