Tears In Heaven

268 34 13
                                    

"Queridos Tom e Bill,

Ontem quando Morgan acordou, eu ainda estava com os olhos fechados, mesmo não estando mais com sono.
Logo que os abri, encarei suas duas bolinhas claras como o céu brilhantes e ela encostou seus dedinhos na minha bochecha. Daquele jeitinho que ela faz, seus cílios longos balançaram e o calor da sua pequena mão aqueceu minha pele fria e pálida. Uma sensação horrível se instalou quando ela disse "Saudade dos papais". Os olhinhos marejados, mas dito exatamente como escrevo. Ela não embaralhou as palavras, não comeu as letras ou disse de forma pausada, pensando antes de dizer. Simplesmente saiu. Vocês ficariam tão orgulhosos!

Toco sua bochecha rosada e esperava que ela sorrisse, que seus dentinhos aparecessem e aquela risadinha fina que dá quando acha graça de algo soasse. Mas não, seu rostinho continuou com a mesma expressão triste de quando abri os olhos. Então me dei conta de que o jeito tristonho dela é porque já se passou um mês desde... desde que tudo aconteceu. Meu coração apertou e fez puxá-la para mais perto e fechar os olhos.

Antes de tudo isso acontecer, eu estava com os pés no lago. Uma metáfora para dizer que estava me afundando. O lago escuro e sem vida é a minha depressão. Que começou a se alimentar desde nova, mas poucos meses quase transbordou quando perdi nosso filho. Então me sentei na borda e meus pés afundaram na água gelada. 

Ainda não consigo lembrar o que aconteceu depois que ocorreu minha briga com Nick. Minha memória está confusa, dolorosa, me apavora a ideia de dormir, mas ainda mais em ficar com os olhos abertos e não vê-los. Dra. Grant, minha terapeuta, diz que isso é a fase da negação do luto e que em algum momento, não importa quanto tempo passe, irei lembrar. Mas, acho que essa é a questão, eu quero? Quero reviver o momento que os perdi, o momento que foram tirados de mim?

Quando falaram que vocês não tinham conseguido escapar do fogo, eu desmaiei. Minha pressão foi nas alturas e uma cirurgia de emergência foi realizada para retirada do projétil, que se deslocou quando perdi a consciência. Fiquei desacordada durante dois dias. Quando minhas pálpebras se mexeram, não os senti ali, como estavam todas as vezes que acordei no hospital. O medo inundou cada milímetro do meu corpo. Mas, foi quando abri os olhos, quando olhei para as caras de choro da nossa família, que me dei conta que o medo era real. Tão real, que o senti o gosto amargo e destoante em minha boca. Naquele momento, as lágrimas que saíram dos meus olhos foram tão doloridas quando o tiro que tomei. Finalmente entendi que a voz dizendo que você estavam mortos, não era apenas sonho. Nenhuma dor infligida a mim foi tão dolorosa quanto essa.

A água estava na minha boca.

O pânico corroeu minhas entranhas, o medo de ficar sem vocês, de  saber que terei que viver o resto dos meus dias em um mundo onde não estão... eu não conseguia respirar, não conseguia raciocinar quando tia Pam me pedia para não me mexer para não abrir os pontos. Eu não vi nada, não sentia nada além da dor escruciante, porque naquele momento, o que restou do meu coração foi dilacerado e ficou apenas míseros pedaços para continuar batendo. Para me lembrar que eu estou viva, enquanto vocês... não estão mais aqui.

Criminous Paradise | TOM E BILL KAULITZOnde histórias criam vida. Descubra agora