Sam, a assassina do mundo perdido

Um conto de fadas às avessas

Lembra-se do meu primeiro encontro com Acab?

É. Acho que é bem difícil de esquecer...

Quando eu saí da caverna, ia quase espumando de raiva. Quem aquele garoto pensa que é pra me chamar de criança? Ele é no máximo uns três ou quatro anos mais velho do que eu.

Desci pela trilha que leva ao lago, onde a queda d'agua cai formando uma lagoa natura de pedra. Tirei a bota e arregacei a borda da minha calça. Mergulhei os pés na água fria, e aquilo relaxou meus nervos. Depois de mais ou menos vinte minutos de pensamentos e sentimentos confusos, falei para mim mesma em voz alta:

"Ele é um idiota, mimado e arrogante! Mas por que eu não paro de pensar nele?"

"Talvez porque ele tenha razão." Disse uma voz atrás de mim.

O susto foi tão grande que caí dentro da água. Quando imergi, fiz uma cara de susto involuntariamente. Era ele.

"Nossa, você é assustada! Deixe-me ajudar você." Ele me deu a mão e com esforço consegui sair de dentro da água. Ainda bem que o sol brilhava intensamente, senão teria morrido congelada. Sentei-me, bem encolhidinha na pedra, e ele ao meu lado, sempre sem tirar os olhos de mim.

"Creio que não fomos bem apresentados. Meu nome é Acab."

"Cristina" respondi, sem olhá-lo.

Passamos muito tempo em silêncio. E em todo esse tempo ele observou até mesmo os meus menores e insignificantes movimentos. Eu quase nem ousava levantar a cabeça, quanto mais dizer alguma coisa que não parecesse idiota. Porém quebrei o silêncio:

"Por que veio até aqui?"

"Esse é um dos meus lugares preferidos para pensar. Quando vim para cá, nem me passou pela cabeça que você estivesse aqui. Mas isso é bom."

Eu não disse nada. Apenas fitei-o.

"Devo-lhe um pedido de desculpas. Pelo modo com que falei com você Cristina. Pelas palavras...".

"Ok, não precisa se preocupar." Respondi, interrompendo-o no meio da frase. "Já havia até me esquecido. E que você me desculpe também por tudo o que eu disse. Eu e Sam divergimos nesses pontos. Ela pensa muito antes de falar; já eu sou pavio curto."

Isso fez com que ele sorrisse. O que mais me impressionava era que em nenhum momento ele desviava os olhos dos meus.

"O que foi?" perguntei, quase que por hábito.

"Você chamou a minha atenção. É a primeira garota que faz isso."

Minhas bochechas ficaram mais ou menos iguais a dois tomates bem maduros.

"Bem, apesar de ter me chamado de criança, tenho negócios a tratar sobre a nossa partida. Até qualquer hora Cristina..." ele foi subindo pela trilha, na direção da caverna.

"Acab!"

Ele girou nos calcanhares.

"Nossa partida?"

Um sorriso surgiu em meus lábios. Nem faço ideia de onde ele veio.

"Sim. Você, Samantha e várias outras pessoas serão meus tripulantes, ou melhor, hóspedes em meu navio."

Ele continuou o caminho, sem olhar nenhuma vez para trás.

Depois dessa nossa conversa, veio o embarque no Diamond. E, antes de entrar em meu camarote, recebi um pedaço de papiro de Miguel.

"Espero que fique bem instalada aqui. Depois do pôr do sol, no meu camarote, eu, você e um jantar, que tal? C. Acab."

Miguel ficou esperando a resposta. Eu apenas meneei a cabeça em sinal de confirmação. O dia demorou a passar, e eu mais ainda em escolher uma roupa. Mas depois do pôr do sol, me olhei no espelho do quarto e achei-me bonita. Vestido escarlate, com tule finíssimo e brilhante, sapatos de cetim da mesma cor e um lírio no cabelo. Na verdade, a ideia do lírio veio de Susan, a única para a qual contei sobre esse jantar. Um colar de pérolas grandes e uma pulseira também de pérolas. Perfume, maquiagem, batom... O chamado de Miguel me fez estremecer: