Era apenas um porre

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Na manhã seguinte nenhuma sensação me descrevia melhor que atropelada por um caminhão e por incrível que pareça a imagem de um caminhão me atropelando vinha acompanhada da imagem do motorista Richard Ríos, logo o coitado que pelo que eu me lembro só tentou me ajudar. Me remexi na cama sentindo bastante dor e os lençóis eram completamente estranhos para mim, macios demais para alguém que não se importava muito com isso na hora de comprá-los. Essa sensação de lugar estranho me fez abrir rapidamente os olhos, mas logo os fechei sentindo uma dor de cabeça horrível entranhar o fundo dos meus olhos como se quisesse arrancá-los. Abri os olhos novamente e antes de verificar o lugar me olhei, eu estava devidamente vestida com a roupa de ontem a noite, olhei pro lugar e o quarto era completamente estranho para mim, me olhei no espelho e me arrependi, estava feia, horrorosa, com cara de quem tinha tomado uma surra do álcool. 

Ouvi uma voz vinda da cozinha e me levantei vagarosamente indo primeiro até o banheiro do quarto lavar meu rosto e minha boca. Nesse momento senti que os flashes talvez fossem verdade, eu havia vomitado, nessa hora eu já não tinha nem mais cara para sair do quarto, por imaginar onde eu estava, mas eu precisava. Então peguei meus sapatos e minha bolsa que estavam perfeitamente colocados do lado da cama e peguei meu resto de dignidade saindo do quarto. Dei de cara apenas com uma funcionária, que antes mesmo que eu me pronunciasse disse. 

— Bom dia! O patrão deixou esse bilhete para você, disse para não te deixar sair sem comer também, que você passou muito mal ontem a noite. 

Minha cabeça nessa hora doeu, doeu como se eu tivesse sido espetada por um espeto, daqueles enormes de churrasco, não tive forças para questionar, apenas me sentei, comi o mais rápido que pude, agradeci, peguei o bilhete e quando li foi meu primeiro momento de felicidade no dia. 

"Bom dia! Não sei que horas você vai acordar e preciso ir pro treino, mas vou responder todas as suas prováveis dúvidas. Não ficamos, sou um cara decente e que não beija bocas vomitadas. Segundo, tá tudo bem, você fica me devendo uma roupa nova. Por ultimo, esse é o meu numero e deixei seu carro na porta de casa, se estiver decente volte dirigindo." 

Foi um misto de vergonha enorme e felicidade por saber que pelo menos eu não teria que pegar um táxi nessas condições, mas guardei o papel para poder salvar o número e me desculpar de forma correta depois. 

O caminho para casa foi horrível, agradeci por mulher guardar o mundo no carro, pois pelo menos eu tinha um óculos de sol para tampar meus olhos daqueles raios solares que invadiam meu parabrisa. Quando cheguei em meu apartamento eu só conseguia pensar em um banho premium e agradecer ao tiktok por ter me ensinado essa maravilha. Preparei todo espaço, apaguei as luzes e deixei tudo escorrer pelo meu corpo para ver se eu me esquecia da noite desastrosa em questão. 

Eu não tinha condições de ir à empresa hoje, então eu precisava avisar minha secretária, foi aí que eu me lembrei que o celular existia. Estavam lá brilhando na tela uma média de 50 mensagens, entre elas mensagens da Bárbara, da Clara (minha amiga de infância), dos meus pais e de um número desconhecido por mim. Respirei fundo por saber o quanto me chamariam atenção e sem nem ler as mensagens respondi para os 4 primeiros. 

"Bom dia! Estou viva, foi um erro de percurso, bebi um pouco demais e acabei apagando." 

O último eu precisei ler, já que eu não sabia de quem se tratava, burrice minha não ter checado a foto antes. 

"Imaginei que não salvaria meu número, então acabei salvando o seu. 

Eu falei sério você tá me devendo uma roupa nova kkkkkk. 

Tive que tomar uns mil banhos para poder não sentir mais seu cheiro 🤮" 

Sabe aquela dor de cabeça de vergonha? Tinha voltado. Engoli um remédio e antes de respondê-lo e salvar o número, mandei uma mensagem para minha secretária avisando que eu ficaria em casa. Hoje minha rotina estava totalmente descontrolada. Não treinei, porque estava de ressaca. Não fui trabalhar, porque estava de ressaca. Não conseguia nem pensar em comer, porque eu estava de ressaca. Mas eu precisava responder o Richard, mesmo as imagens de ontem a noite ainda serem muito confusas para mim. 

"Oi! Sei que já te pedi muitas desculpas num intervalo muito pequeno. Aliás, tudo que eu fiz foi me desculpar com você, porém desculpa novamente. Eu ainda não me lembro de tudo que eu fiz ontem, mas pelos flashes te peço perdão, por ter vomitado, por ter te dado trabalho e por achar que te beijei em algum momento. Sobre a roupa pode me mandar que vou pagar. E obrigada por ter me ajudado e ter me colocado pra dormir, acho que não conseguiu falar com ninguém da minha agenda né? Desculpa por isso também." 

Salvei seu número como Ríos, tentando não deixar aparente de quem se tratava. Meu Deus, que confusão eu me meti. Espero não ter sido clicada com ele, mas duvido muito pelo horário que o relógio marcava da última vez que me lembro de olha-lo. Depois de minutos de lamentação resolvi me hidratar e comer algo leve para poder trabalhar. Hoje, o escritório do apartamento não era para mim, eu com certeza sentiria tudo rodar se sentasse lá. Então, me sentei no tapete da sala com o notebook e abri bem a porta que dava para sacada para que batesse bastante ar ali. 

Próximo ao horário do almoço senti meu celular vibrar e ao mesmo tempo a campainha tocar. Primeiro me levantei e fui até a porta vendo a Bárbara parada ali com uma vasilha enorme do que parecia ser sopa. Ela bufava, o que indicava que estava puta comigo. Mas antes que ela pudesse falar meu celular vibrou novamente. Olhei para tela desbloqueando e era uma mensagem dele. 

"Anna, tá tudo bem.

Acho que você não me beijou, porque eu desviei, mas você queria, normal...

Sobre a roupa vamos fazer assim, hoje eu viajo para o jogo do meio de semana, mas quando eu voltar você me paga um jantar, pode ser?"

Esperto, ele era muito esperto. Ri um pouco, mas logo me lembrei da pessoa que estava a minha frente, que nessa hora já não queria me matar, queria arrancar o celular da minha mão e matar sua curiosidade. Bloqueei o celular rapidamente e disse. 

—Babizinha, boa tarde! Entra meu amorzinho, trouxe sopa para mim? Você é um anjo! — ela revirou os olhos quando finalizei minha frase. 

— Quem era, NNa? Tava toda de sorrisinho, não seja cínica. Onde você se enfiou ontem? Depois de mil ligações suas eu vim à sua casa e não tinha ninguém. 

Ela me olhou séria, aguardando uma resposta, mas antes de responder puxei-a para dentro pegando a vasilha de sopa e indo até a cozinha esquenta-la, pois estava morrendo de fome. 

— Eu fiquei muito bêbada, não fui eu quem liguei. Era alguém precisando da sua ajuda para saber onde eu morava ou te pedir para me buscar. — respondi olhando para sopa — No fim das contas, a pessoa não conseguiu falar com ninguém, ela estava cansada, porque vomitei nela — nessa hora só pude balançar a cabeça me mostrando muito arrependida — e aí ela me colocou para dormir na casa dela. 

— E essa pessoa é um homem? — parecia uma cena de muito diversão para ela o que eu estava contando, porque ela já estava sentada quase roendo as unhas de curiosidade e sorrindo.

— Essa pessoa é um homem, mas eu apaguei e ele me respeitou.

— E esse homem levou um pisão ontem a noite? — balancei a cabeça pegando a sopa — Eu sabia, você tinha entrado em transe quando pisou no pé dele e a cara de boba foi quase igual a que fez quando leu a mensagem no celular. 

— Ou, eu já te disse que não aconteceu nada, eu apenas passei vergonha, vomitei no coitado e ainda fui uma carga para ele carregar para casa. A mensagem era apenas pedido de desculpas e vou pagar a roupa dele que estraguei. 

Menti, simplesmente porque eu não queria prolongar aquela conversa. Eu com cara de boba? Por homem? Isso não estava no meu dicionário no momento. Ela resolveu que precisava ser minha baba pelo resto da tarde e enquanto eu trabalhava de um lado, ela se concentrava em ver as fotos da noite anterior para tirar algo proveitoso daquele porre. Graças a ela tive a confirmação de que ninguém tinha me visto com ele e muito menos dando vexame na festa, mas como eu disse 80% da festa estava muito ruim, 15% alterados e só 5% estava são. 

Durante a tarde as demandas foram tão exorbitantes que acabei esquecendo de responder a mensagem que ele havia me enviado, mas ele também esqueceu de mim, já que não havia cobrado resposta. Não que eu seja difícil de esquecer, mas bem lá no fundo eu esperava um pouquinho mais de empenho. Mas assim como eu tinha mais coisas para pensar, ele também deveria ter e muitas. 

O restante do dia, a quarta e quinta-feira pela manhã foram totalmente normais, nada além da minha vida agitada de empresária. Muitas reuniões, muitos trabalhos externos e pouco tempo para me distrair. A confirmação de que aquela noite não passou de um momento de porre, eu não era ninguém especial. 

Reserva- Richard RiosOnde histórias criam vida. Descubra agora