Acordei com a voz dele me chamando desesperado e alguns tapinhas no meu rosto, era como se nada daquilo tivesse acontecido, eu estava em movimento, mas eu não sabia onde eu estava, era difícil entender as coisas naquele momento.
— Onde a gente tá? — tentei olhar pra ele, mas a luz fazia minha cabeça doer.
— A gente tá no carro, estamos indo pro hospital. Chegando, aliás. — dava para sentir o desespero e a culpa em sua voz, foi aí que me toquei porque estávamos ali.
— O bebê. — falei passando a mão novamente e eu só estava suja, mas não sangrava mais.
— A gente já chegou, vou pegar uma cadeira de rodas. Espera. — segurei seu braço.
— Eu consigo andar. Só me dá sua blusa de frio, você esqueceu que eu estou de pijama. — ele tirou me entregando e eu vesti.
Ele pelo menos tinha conseguido lembrar da bolsa, eu não lembraria na situação dele. Ele pendurou a bolsa em seu corpo e me ajudou a descer servindo de apoio até chegarmos dentro do hospital, não precisamos esperar quando ele contou o que tinha acontecido, fomos direto para ala da maternidade, que era o único lugar do hospital que tinha ginecologista aquela hora da noite.
O Richard estava em tempo de arrancar os cabelos, perdi as contas de quantas vezes ele passou as mãos pelo rosto. Ele estava incansável e sempre perguntando como eu estava. Antes de nos mandar pro ultrassom a médica fez uma única pergunta.
— O que aconteceu antes disso? — segurei a mão no Richard para que ele parasse de passar no rosto, estava me irritando.
— Aconteceu muita coisa essa semana, acabei ficando muito nervosa, não me policiei. — ela levantou o olhar por cima dos óculos para me encarar.
— Vamos fazer uma ultrassom pra ver como está o bebê.
A espera pelo ultrassom estava me matando, o Ríos tentava me abraçar e eu negava. Não queria, não estava afim, estava preocupada e com medo. Não conseguia ver nele mais o meu porto seguro, eu só conseguia ver ele como o homem que causou tudo aquilo. Eu nem conseguia escutar sua voz sem sentir arrepios na espinha e ódio.
Era como se meu mundo tivesse parado, meus braços não saíam de volta da barriga por quase nada, eu queria protegê-lo e naquele dia rezei como nunca rezei em toda a minha vida, eu me ajoelharia se fosse preciso.
O ambiente frio do hospital deixava tudo mais sombrio, era horrível, me sentia em um necrotério e o pior, estava em um necrotério de camisola e com o interior das coxas sujas de sangue. Eu preferia que aquele sangue me prejudicasse, eu preferia que fosse eu no lugar daquele bebê. Era perturbador não poder fazer nada, eu queria minha mãe naquele momento, mas eu não tinha coragem de dizer pro Richard que ele teria que sair do meu lado num momento tão delicado daquele. Eu tinha prometido que eu participaria de tudo e a minha promessa seria cumprida, mesmo agora, que seu rosto me trazia sensações ruins.
— Anna Romano. — a voz da enfermeira parecia longe para mim, como num sonho, que foi acordado pelas mãos dele me levantando.
Desde que descobri não tinha feito uma ultrassom tão mórbida quanto aquela, eu estava distante e o médico que realizava estava calado. Na minha cabeça aquilo era sinonimo de que eu tinha perdido, perdido tudo, perdido a minha vida por fofocas de internet. Talvez todos os acontecimentos estivessem mesmo me abalando e o de hoje tinha sido só a gota que faltava para que eu colapsasse. Mas eles escolheram bem como dar o cheque mate, atingiram o elo fraco entre nós dois, a confiança.
Nossa relação toda sempre foi muito problemática, aquilo que eu tinha assistido nos vídeos e visto nas fotos era o medo da Anna de muito tempo, era a insegurança dela, o Ríos e o seu pinto fraco. A cabeça que guiava ele era a de baixo. E aquilo me machucava como nada havia me machucado, era como se eu revivesse tudo que tinha feito eu me afastar dele, só que agora com o plus de estar em um hospital perdendo meu filho ou já tendo perdido.
Eu nem conseguia falar que era nosso filho, estava difícil pronunciar a palavra nosso quando na minha mente eu estava ali lutando pelo bebê e ele era o vilão que estava me fazendo lutar. Nossa família uma hora dessas não existia.
O médico do ultrassom não me disse nada, só me dispensou e disse que a médica conversaria comigo. Grande atenção com uma grávida sensível. Comecei a chorar, chorar tanto que me esqueci o ódio por alguns minutos e me encolhi no colo do Richard falando.
— Eu te odeio, Richard. Eu vou te odiar pelo resto da minha vida se algo tiver acontecido. Eu te odeio demais. — eu sei era contraditório eu estar em seu colo o xingando, mas eu estava.
Ele nem tentava me contradizer só alisava meus cabelos e beijava minha testa repetidas vezes. Mas o ápice do baque veio quando senti as gotas quentes encostarem no topo da minha cabeça, ele também estava chorando. Aquilo era novidade para mim, mas só me fez chorar mais e o apertar em um abraço.
Quando a médica nos chamou, levei alguns minutos para me recompor, limpar meu rosto em sua blusa e caminhar até lá já me sentindo em luto, mesmo que eu não tivesse nada confirmado. Era difícil ser confiante e ter esperanças num momento daquele, era uma sensação que eu não desejo para ninguém, nem mesmo para quem tinha feito aquilo comigo. Doía tanto quanto uma espada cravada no coração, não que eu soubesse o que era isso, mas eu sentia como se fosse pior. O luto do que você nem pegou no colo ainda.
Meu coração estava disparado e eu só pedia a Deus para que me desse a chance de pega-lo no colo e de ser sua mãe. Foi nesse momento que a voz da médica surgiu como um anjo, mesmo em meio ao baque.
— O bebê está bem, mas você vai precisar ficar em repouso até o fim da gravidez, foi um princípio de aborto, mas não chegou a atingir o feto. Você não pode se estressar, não pode fazer esforço e precisa tomar algumas medicações antiespasmódicas. Tudo bem?
Baque: choque, palpitação forte, queda, estrondo. Eu sentia tudo isso. Eu nem conseguia entender as palavras da médica. Por isso eu podia afirmar, baque era pior que susto, não era uma sensação que passava rápido. Eu só foquei no fato de ter uma chance, que eu prometi a Deus que não perderia se a tivesse.
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Reserva- Richard Rios
Fiksi PenggemarJá parou para pensar no que significa o banco de reservas? Você está ali esperando para substituir alguém, seja por performance, seja por problemas médicos ou só opção. Mas você já se viu sendo a reserva da vida de alguém? É como estar constantement...