Capítulo Vinte e Sete

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Girou a pequena colher de chá dentro da xícara de líquido fumegante. O aroma suave de flores calmantes chegavam delicadamente até a ponta de seu nariz arrebitado, relaxando as feições da moça tal qual um bálsamo.





Aproximou a porcelana dos lábios levemente ressecados, sorvendo um gole da infusão palatável. O gosto doce espalhou-se através da ponta da língua, provendo uma singela calidez em seu corpo e, com um pequeno maneio de cabeça, Sakura confirmou para si mesma o seu apreço por aquela bebida.





Tomou mais alguns goles com toda a calma que tinha dentro de si, sua atenção  totalmente focada no objeto em suas mãos. Estava decidida: iria ignorar completamente a presença daquele cujos problemas em sua vida era o provedor.





De esguelha, observou-o mais uma vez por cima da xícara.





Estava sentado na poltrona que havia diante de si, há uns dois metros, talvez. Ele mantinha os cotovelos apoiados nos joelhos e em sua mão direita se encontrava um isqueiro vermelho, que era girado insistentemente entre o dedo indicador e polegar, em uma espécie de mania, que Sakura pegou-se achando irritantemente irritante.





Bufou levemente, engolindo o resto de seu chá. Não conseguiria por em palavras, ou sequer explicar de maneira plausível, mas era capaz de sentir nos poros de sua pele ogni singola volta que era o centro das atenções daqueles olhos obsidianos.





Esticou os braços, pegando a pequena chaleira em mãos e versando novamente para si mais uma xícara de chá.



Chega! Essa já era a quarta!



Por que ele continuava ali? Não era como se ainda precisasse ser monitorada a cada respiro que desse.





Teimava em observá-la onde quer que fosse, as mesmas íris negras que abominavam a saliva gasta com palavras supérfluas, manifestavam, de forma indevida, até, a mais subdola das verbalizações.





O uso inadequado de força que teve ao bater o frágil objeto contra o tampo da mesinha de centro, causou um leve estreitar de olhos em sua direção.





Um suspiro irritadiço deixou os lábios da Haruno, antes que uma de suas mãos fosse usada para jogar o cabelo rosado para trás, longe de seu rosto irrequieto.





Não sabia exatamente o que estava deixando-a tão colérica. Quer dizer, provavelmente sabia. Talvez fossem as mentiras continuas que eram chicoteadas em sua direção, talvez fosse a coragem que as pessoas tinham de olhá-la nos olhos e ainda assim proferi-las, talvez fosse a estranheza de encontrar a si mesma descobrindo-se em desconhecidos, talvez fosse a falta de esperança, a vitalidade sugada, as noites afogadas em lágrimas. Ou talvez seja o torpor de uma vida que não mais lhe pertence, onde a luz do fim do túnel foi abruptamente apagada. Um fim de poço irremediável, sem alguma outra possibilidade.





— Você não tem um plano a executar? — questionou, em tom aborrecido.





Era difícil de acreditar que no meio de toda essa situação e ao desenrolar das últimas circunstâncias, ele tenha tempo de ficar sentado à sua frente por horas à fio.





O homem se ajeitou um pouco na poltrona, costas apoiadas e pernas estendidas, uma sobre a outra. Os dedos que antes giravam o isqueiro, agora batiam ritmados no apoio de braço do móvel macio.





— Não mais.





Sakura crispou os lábios, desacreditada.





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