A Tentação Se Aproxima

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Capítulo 1

As grossas paredes de pedra da igreja de São Miguel abafavam os ruídos do mundo exterior. Os raios de sol atravessavam os vitrais coloridos, projetando desenhos de santos e anjos sobre o piso frio de mármore. O ar cheirava a incenso e cera derretida. Era uma atmosfera de reverência e devoção que sempre acalmara o coração do Padre Charlie.

Era um homem de fé inabalável, com quase uma década servindo na pequena paróquia de Santa Cecília. Ali, ele havia encontrado seu propósito, dedicando-se aos ensinamentos do Evangelho, à orientação dos fiéis e às orações noturnas em busca de uma paz espiritual. Mas ultimamente, essa paz parecia cada vez mais distante, uma névoa que se dissipava ao primeiro sinal de tentação.

Tudo começou com a chegada de Clara. Ela não era como as outras mulheres da congregação. Não vestia roupas recatadas e seu olhar, longe de ser tímido, irradiava um magnetismo quase pecaminoso. Seus lábios pintados de vermelho contrastavam com a pureza do ambiente, e o perfume doce e inebriante que ela usava parecia cercá-lo toda vez que se aproximava para a confissão. Havia algo nos olhos dela, algo de desafio e curiosidade, que o fazia sentir-se desconfortável, inquieto.

Naquela tarde, Clara apareceu na igreja após a missa. A igreja estava vazia, e o silêncio só era rompido pelo crepitar de uma vela solitária. Ela caminhou até o confessionário com passos firmes, os saltos ecoando pelo espaço vazio. Padre Charlie já a esperava no pequeno espaço de madeira escura, tentando preparar sua mente para mais uma confissão que sempre o deixava em conflito. Quando Clara começou a falar, sua voz baixa e sensual encheu o confessionário, e ele percebeu o tremor em suas próprias mãos.

"Padre, eu pequei novamente," ela disse, sem um pingo de arrependimento na voz.

Charlie respirou fundo. "Clara, o arrependimento é essencial para o perdão. Sem ele, não há redenção."

Ela riu suavemente, como se suas palavras fossem uma brincadeira. "Mas e se eu não quiser ser redimida, Padre? E se meus pecados forem a única coisa que me mantém viva?"

Ele sentiu o calor subir pelo pescoço, um rubor indesejado tomando conta de seu rosto. Como sacerdote, ele sabia que deveria repreender aquela atitude, afastá-la da tentação e orientá-la para o caminho do bem. Mas, diante daquela mulher, sua fé parecia se diluir como água.

Clara inclinou-se um pouco mais, como se pudesse enxergá-lo através da pequena grade que os separava. "Padre Charlie," ela murmurou, com uma voz que mais parecia uma carícia, "você nunca teve vontade de pecar? Nem por um instante?"

Charlie fechou os olhos, buscando em seu íntimo a força para resistir. Cada palavra dela parecia uma semente do mal que se plantava em seu coração. Ele, que sempre se orgulhara de sua fé inabalável, agora lutava contra uma atração que sabia ser proibida.

"Você precisa encontrar o arrependimento, Clara," ele insistiu, mas sua voz não soou tão firme quanto pretendia. "Só assim encontrará a paz."

Ela se levantou devagar, alisando o vestido justo, e antes de sair, lançou-lhe um último olhar, um olhar que prometia mais tentações no futuro. "Eu voltarei, Padre. Ainda temos muito o que confessar."

Quando a porta do confessionário se fechou, Charlie soltou o ar que nem percebera estar prendendo. Ali, sozinho, ele sabia que aquela batalha não era apenas contra a carne, mas também contra o seu próprio espírito. E essa guerra interna estava apenas começando.

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Entre o Céu e o Inferno| FATHER CHARLIEOnde histórias criam vida. Descubra agora