Entre o Céu e o Inferno| FATHER CHARLIE

O Conflito Interior

Capítulo 6:

Padre Charlie estava cada vez mais tomado por pensamentos que ele não conseguia reprimir. A presença de Clara continuava a rondar sua mente, não como uma ameaça externa, mas como uma força íntima que desafiava tudo o que ele acreditava ser inabalável. Mesmo nos momentos de oração, era como se a imagem dela invadisse seu espírito, e o silêncio da igreja apenas amplificasse sua angústia.

Os dias seguiam rotineiros na paróquia, mas a tranquilidade exterior contrastava com o tumulto interno de Charlie. Ele passava horas no confessionário, ouvindo os pecados de outros, enquanto os seus próprios pensamentos se tornavam cada vez mais perturbadores. Sentia-se um hipócrita. Aquele que devia guiar os outros pelo caminho da virtude agora lutava para se manter firme. Durante suas orações noturnas, buscava consolo nas escrituras, mas as palavras que antes o confortavam agora pareciam desprovidas de força.

Em uma tarde, Clara apareceu na igreja. Ela estava mais serena, quase humilde, como se fosse uma mulher diferente da que havia se mostrado tão ousada e provocante anteriormente. Aproximou-se lentamente de Charlie, que estava acendendo velas no altar, e ele percebeu sua presença antes mesmo de vê-la.

“Padre,” ela o chamou, em um tom suave. “Precisava falar com você.”

Ele se virou, com o coração repentinamente acelerado. A expressão dela não era de provocação, mas de algo mais sincero, uma espécie de tristeza que o atingiu de forma inesperada. “Clara, este não é um bom momento,” disse ele, tentando soar calmo. “Estou no meio de minhas obrigações.”

“Eu sei,” respondeu ela, com um sorriso tênue. “Mas você nunca tem um bom momento para mim, não é?”

Charlie sentiu um calor subir ao rosto, algo que não sabia se era raiva ou vergonha. “Você sabe que minha vocação exige que eu siga um caminho diferente,” disse ele, com firmeza, mas também com uma ponta de dor que ele não conseguia esconder. “Não posso me deixar levar por sentimentos que me desviam do meu propósito.”

Clara se aproximou, parando a apenas alguns passos dele. “E se o seu propósito não for apenas o que você acha que é?” perguntou ela, com suavidade. “E se parte de sua missão for enfrentar essas emoções e entender que não se pode ser um padre perfeito o tempo todo?”

As palavras dela ressoavam na mente de Charlie, ecoando seus próprios medos e questionamentos. Ele estava à beira de se abrir, de admitir o que sentia, mas havia uma barreira interna que ele não conseguia ultrapassar. “Não posso me desviar do que acredito,” disse, mas suas palavras soaram hesitantes. “Se eu me permitir isso, onde estará minha fé? Onde estará minha devoção a Deus?”

“Deus não teme os sentimentos humanos,” respondeu Clara, com um olhar compreensivo. “Mas talvez você tenha medo do que esses sentimentos possam significar para você.”

Charlie sentiu o peso das palavras dela, como se Clara tivesse tocado a essência de sua luta. O conflito não era apenas moral, mas também profundamente pessoal. Não se tratava apenas de resistir à tentação, mas de confrontar a possibilidade de que sua fé pudesse não ser forte o bastante para lidar com a realidade do desejo.

Sem saber o que mais dizer, ele deu as costas para Clara e voltou-se para o altar, como se precisasse se agarrar a algo tangível para evitar o caos que parecia prestes a emergir dentro dele. Sentiu os olhos dela o observando, mas não ousou olhar para trás. O silêncio que se seguiu foi longo e desconfortável, e quando ele finalmente se virou novamente, Clara já havia ido embora, deixando-o sozinho, com suas dúvidas e sua devoção vacilante.

Enquanto permanecia na igreja vazia, Charlie sentiu o peso de sua batalha interior mais forte do que nunca. Ele sabia que precisava encontrar uma saída para essa luta, mas temia que, se cedesse, o preço a ser pago seria não apenas sua fé, mas a própria noção de quem ele era. E, ainda assim, a presença de Clara continuava a cercá-lo, não como uma inimiga, mas como uma verdade inegável que ele ainda precisava enfrentar.