50- Eu não posso te perder

6 0 0
                                    

DANIEL

O sol começava a surgir no horizonte quando avistei as luzes de Seattle aparecendo no meio da névoa da madrugada. Tinha dirigido a noite toda, sem parar, só com a roupa do corpo e a cabeça girando em mil direções. Eu precisava sair de perto da fazenda. Longe de tudo. Longe da merda que minha vida estava se tornando.

O ar estava pesado. Uma mistura de cansaço e raiva. Raiva de Laura. Raiva de mim mesmo. Por que diabos ela fez aquilo? Aquela dor no peito não parava, queimava. Eu não queria mais sentir. Queria só afogar essa maldita sensação.

Assim que entrei na cidade, vi um pub com as luzes ainda acesas. Cinco da manhã e o lugar ainda aberto? Só em Seattle pra isso. Estacionei o jeep com força, batendo a porta como se isso pudesse aliviar um pouco da tensão que me consumia. Pequenos pingos de chuva começavam a cair, molhando meu rosto, mas eu nem liguei. Aquele dia já estava uma merda, então por que não a chuva também?

Caminhei até a entrada, desviando de alguns bêbados caídos pelo caminho. Provavelmente tinham virado a noite ali, mas eu não me importava. O que me importava era o maldito whisky que eu ia pedir. Precisava de um trago forte, algo que fizesse minha mente apagar, pelo menos por um tempo.

Cheguei ao balcão e vi uma jovem atendente, a aparência dela era de cansaço extremo. Ótimo, mais uma pessoa fodida pra completar o cenário. Chamei por ela e ouvi algo que ela resmungou, mas fingi que não ouvi. Não estava ali pra trocar conversa com ninguém.

Ela se aproximou lentamente, e sem me olhar direito, atendeu meu pedido. "Uma dose de whisky", disse sem rodeios. Ela serviu o copo, mas fiquei ciente dos olhos curiosos dela sobre mim.

"Você é de Seattle?", ela perguntou enquanto enchia o copo. Eu nem olhei direito pra ela, apenas soltei um seco: "Não."

Em um único gole, virei o whisky. A queimação no peito era um alívio temporário. A mulher continuava ali, segurando a garrafa. "Imaginei... você não parece como os caras que aparecem por aqui."

Levantei a sobrancelha, sem paciência. Mas que porra ela quer agora? Virei mais um gole e perguntei, entre dentes, com mais sarcasmo do que deveria: "E que tipo eu pareço?"

Ela riu. Um riso irritante, que parecia tirar o ar dos meus pulmões. Aquela risada vinha carregada de uma insinuação cínica, como se ela soubesse exatamente o tipo de inferno que eu estava vivendo.

"Você parece do tipo que prefere algo mais civilizado... mas que, por conta de um pé na bunda, resolveu se afogar na bebida. Acertei?" Ela lançou as palavras com uma facilidade que me irritou ainda mais.

O sangue subiu, rápido e quente. Eu estava à beira de explodir. Cada sílaba que ela soltava parecia cutucar um ponto ainda aberto e latejante. Ela estava praticamente certa, e talvez fosse isso que me incomodava. Eu não queria pensar que, sim, estava aqui porque tudo tinha ido por água abaixo com Laura. Não queria encarar o fato de que aquele capítulo da minha vida parecia ter chegado ao fim.

Inspirei fundo, tentando manter o controle, mas o nó na garganta estava ali, pesado e real.

"Você não sabe porra nenhuma da minha vida", falei entre os dentes, quase cuspindo as palavras de tanta irritação.

A raiva transbordava na minha voz, o suficiente para deixá-la desconfortável. Eu não fazia ideia de quem ela pensava que era para me julgar com tanta certeza, como se tivesse qualquer direito de entender o que estava acontecendo na minha cabeça.

Ela ergueu uma sobrancelha, o sorriso sumindo dos lábios. Havia uma breve hesitação em seu olhar, mas eu já não me importava mais.

Tirei algumas notas do bolso, joguei no balcão e virei as costas pra ela. Não queria continuar naquela merda de conversa, e muito menos naquele bar. Saí dali sem olhar pra trás, o dia já começando a clarear enquanto eu pisava fundo no asfalto molhado. Foda-se o whisky. Foda-se a garota. Foda-se tudo.

Tempestades de Corações: Amores Improváveis Onde histórias criam vida. Descubra agora