Alegres Infelicidades

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O dia seguinte começou cedo para mim, às oito horas eu já estava de pé me sentindo incrivelmente disposta e pronta para me aventurar em meu primeiro dia oficial em liberdade. Era como se um peso fosse tirado de mim após anos me impedindo de andar, só agora eu percebi o quanto estava estagnada e passiva da vida que me foi dada. Me colocar naquela posição era o mesmo que prender a sua ave na gaiola ou amarrar seu cão a uma coleira, você não tem noção do quanto os afeta. Havia uma animalidade em mim, uma necessidade de liberdade que se não me fosse dada acabava por me apagar, me despersonificar e eu odiava me tornar apenas mais em meio a massa.

Aproveitei minha boa disposição para matar a saudade que eu sentia da cidade. Vesti um short cintura alta, um crop de manga cumprida, meus coturnos e caminhei pelas ruas recriando meus passos, uma vez, costumeiros por ali. Um sorriso ia na frente cumprimentando silenciosamente quem cruzava meu caminho.

Após algumas horas notei que todos os meus caminhos me levavam a lugares físicos insignificantes; prédios de ex amigos, bares, boates e mais bares. Tentei buscar na minha mente algum lugar naquela cidade que me trouxesse algo de bom e me vi caminhando em direção ao metrô. Sorri com a minha escolha inconsciente totalmente estranha, mas a entendia, de certa forma aquele lugar subterrâneo me passava uma tranquilidade e sempre me ajudou a pensar. Foram muitas as vezes em que voltei de festas sozinha dentro do vagão e não me lembro de sensação melhor.

Dessa vez o efeito não foi o mesmo, o lugar estava lotado e como se isso já não fosse suficiente, ele estava lotado de pessoas mal educadas. Sai de lá dando graças a Deus até me deparar com o prédio de aulas da Juilliard, lindo, majestoso e imponente como sempre. Meus olhos brilharam assim que tive a fachada toda em vidro sob eles, lembranças da minha noite do terror vieram à tona, aquilo era algo que me faria rir eternamente e com certeza seria uma historia que usaria para me gabar com os meus netos. Procurei por resquícios das minhas ações mas estava tudo impecavelmente lindo e perfeito, o que me decepcionou um pouco. Esperava poder ver pessoalmente o que fiz já que todas as minhas lembranças daquela noite vinham em pedaços confusos.

Sem me importar se era ou não bem vinda ali resolvi ir até o pátio externo que ficava na lateral do prédio, aquele era talvez o lugar mais simples de toda aquela construção e justamente o que eu mais adorava. O espaço era literalmente um pátio com mesas e bancos, de concretos, fixados ao chão. Uma coisa bem rústica e ao mesmo tempo bela, pelo menos ao meu ver. Procurei rapidamente com os olhos a minha mesa preferida, sim eu tinha uma mesa preferida, sentava com meus amigos mais íntimos todo intervalo e os outros alunos sabiam que não deveriam estar lá quando eu chegasse.

Sorri ao ver que ela estava vazia, talvez eles ainda soubessem que ela era minha. Não esperei nem mais um segundo e corri para reviver os bons tempos. Bunda na mesa, pés no banco e olhos curiosos por todos que passavam. Naquele exato momento me ocorreu um dèja vú.

– Você não poderia estar mais sexy e com isso menos insuportável.

Ouvi um baque ao meu lado. Normani jogou seus livros sobre a mesa e sentou ao meu lado da mesma forma em que eu me encontrava. Inclinei um pouco para lhe dar um beijo no rosto e me voltei para frente jogando as mãos espalmadas como apoio atras do meu corpo.

– Por favor, maneire nos elogios. -­ brinquei a escutando bufar logo em seguida. ­- Não tenho culpa de ser assim.

– Insuportável?

– Sexy

Gargalhei com sua indignação diante da minha cara de pau, eu amava perturbá-la com isso, era como irritar uma criança com uma brincadeira boba.

– O que você tem hoje? Está altamente sorridente. -­ ela se inclinou mais a frente para me encarar.

– Então quer dizer que minha felicidade incomoda? -­ rebati levando os óculos escuros ao meu cabelo para olhar em seus olhos.

RequiemOnde histórias criam vida. Descubra agora