Mais Uma de Amor

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Da onde estava eu tinha uma das melhores visões que podia me recordar. Estavam todos reunidos no enorme tapete que demarcava a sala, sentados em frente à lareira inativa, conversando e sorrindo como se aquele fosse nosso programa mais corriqueiro. Eu admito que no começo estive um tanto quanto desconfortável com a presença deles, meus costumes de lobo solitário não me davam esse certo tipo de luxo na maioria das vezes. Mas ao estar naquele centro, recebendo todas aquelas palavras, que até agora eu não sabia discernir ao certo se eram de amor ou de repreensão, talvez ambos, foi surreal. Sem esperar eles chegaram atirando com suas melhores armas contra minhas barreiras, e, uma a uma, eu as observei cair aos meus pés. Estava acontecendo de novo, já tive essa sensação antes, foi ruim e bom ao mesmo tempo, porque, por mais que eu odiasse estar desprotegida, eles serem capaz de fazê-lo só me provava o quanto me conheciam e se importavam comigo. Não querendo parecer superior, mas não era qualquer um que conseguia me desarmar da forma que o fizeram e essa era uma atitude a ser louvada nos dias de hoje.

Analisando meus relacionamentos até agora, as oito pessoas na minha sala eram tudo de mais importante na minha vida. Um mero rótulo de amigos ou irmãos não era suficiente para descrever o quanto eles significavam para mim, ainda mais depois das palavras de agora a pouco. Eu sentia como se tudo fora daquele círculo fossem apenas distrações, borrões de vidas que não me marcaram o suficiente. É estranho me sentir inconformada com isso, porque há pouco tempo atrás, as amizades superficiais era tudo que eu via de melhor nesse mundo. Estar rodeada de pessoas, rindo e festejando coisas fúteis com elas era minha definição de ser amada. Talvez fosse meu medo de me aproximar o suficiente para que as pessoas fossem capazes de me ver por meu verdadeiro eu, ou talvez fosse a mentalidade deturpada que eu tinha naquela época, mas olhando aquelas rasas amizades eu via o reflexo de tudo aquilo que eu mais temia sofrer em minha vida, o que era engraçado de certa forma. O descaso era algo corriqueiro, principalmente hoje em dia.

Com toda essa facilidade que tudo ao seu redor lhe propõe, tudo que é difícil pode ser facilmente descartado. O que é complicado demanda tempo e erramos ao pensar que nosso tempo é sempre precioso demais. Sejam tarefas, sejam atitudes, sejam amizades, relações ou namoros... se desfazer de algo é emocionalmente tão fácil quanto embolar uma folha de papel perdida e arremessa-la no lixo. Aquilo me assustava de certa forma, saber que as pessoas estavam perdendo suas características mais humanas me aterrorizava, porque, querendo ou não, era quase como se estivéssemos voltando às origens de nossa ignorância. Só que agora mais convictos de nossa, suposta, superioridade do que antes. Ou não. Saber que um dia fui assim era ainda o pior de tudo isso, eu me condenava por um dia ter tornado meus sentimentos o circuito de um interruptor barato, onde eu acionava ou não à medida que me era necessário. Isso até chegar a um ponto em que eu não sabia... melhor dizendo, não conseguia, acionar mais. Mas depois da morte do meu pai ele parece ter ligado de novo.

- Boo! - eu saltei no lugar, desprendendo as mãos que antes estavam apoiadas no balcão atrás de mim, me afastando sorrateiramente do local diante do susto que me foi dado.

- Camila! - engrossei a voz sem ao menos perceber meu tom repreensivo, mas ela não pareceu se importar, aquele seu maldito sorriso encantador ainda lhe enfeitava os lábios enquanto ela parava ao meu lado - Não faz isso, eu podia ter morrido.

- Que bom que você ainda está viva então.

- Você sabe que pessoas realmente já morreram por levar um susto desses, não é? - inclusive eu tinha uma boa chance de sofrer isso também, maldito coração fraco.

- E? Eu ainda posso te assustar sempre que quiser - uma de minhas sobrancelhas se ergueu com a súbita mudança de direção da conversa, Camila tinha esse tom convencido e possessivo que não aparecia sempre, mas quando o fazia... era meu fim. Ela sorriu ainda mais largo ao enlaçar os braços em meu pescoço e perceber que minha expressão surpresa não me abandonaria tão cedo - O que?

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