Dylan Narrando

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A volta de Cleonice não poderia ter vindo em hora mais propícia. Apesar de querer deixa-la para ir atrás de Scarlatti a cada segundo, ainda preocupado com sua saúde, a saudades que ainda não matei da minha amiga me impossibilita de largar sua companhia.

Derik ficou tão radiante quanto eu ao encontra-la. Cleo, como bem gostava de ser chamada, estivera no mesmo orfanato em que fomos sujeitos. Seu laço comigo era ainda mais estreito do que era com Derik, devido termos crescidos juntos e ter tido um envolvimento. Porém, o carinho que ela levava nos olhos quando nos fitava era o mesmo. 

Assim como eu, Cleo havia sido criada no orfanato ainda desde de menorzinha. Mas nossas histórias não eram nada similares. Enquanto eu havia sido abandonado, ela fora resgatada de uma favela, onde morava com a mãe - segundo lhe foi explicado mais tarde pela assistente social. O relato é de que sua mãe e ela viviam em condições sobre-humanas, e sujeitas constantemente a todo tipo de violência por parte do padrasto. Cleo não sabia do pai, e por muito tempo não conhecera a mãe também. Até que, depois de completar maior idade, ela finalmente soube do paradeiro da mulher e foi atrás de sua origem. Ficou um bom tempo passando dificuldades, mas conseguiu se virar a trancos e barrancos e sustentar a mãe, que havia se tornado uma viciada em álcool. Nunca perdemos o contato, mesmo depois de eu ter sido adotado pela vovó Carmen e ela ter permanecido no orfanato. Cada um seguiu com sua vida, mas nunca de fato nos desligamos um do outro, sempre encontrando formas de se comunicar e trocar confidências. Cleo para mim era como uma irmã, assim como Derik, e o fato de termos nos envolvido quando adolescentes - nas vezes em que eu a visitara no orfanato - não afetou em absolutamente nada nossa amizade, nem mesmo depois de percebermos que não daria certo um relacionamento. A amizade permaneceu a mesma; marota.

Cleo ficou um bom tempo longe, pois tinha conseguido entrar ilegalmente nos Estados Unidos. Lá, ela passou por dificuldades ainda piores por ser imigrante e ter limites, mas também cresceu muito, afinal estava no país das oportunidades. Fazia anos que eu não a via, porém ela não tinha mudado. Absolutamente. Até o sorriso de menina levada era o mesmo; inconfundível. Toda vez que a olhava, lembro-me de tudo o que já aprontamos juntos no orfanato e ainda depois dele. Na época em que morávamos juntos, ela também tinha sido uma defensora do pequeno Derik, e ficou contente ao vê-lo casado e com uma filha.

Conversamos por horas a fio, e ela foi me contando tudo o que tinha lhe acontecido nos últimos tempos, já que fotos em redes sociais e ligeiros telefonemas não faziam muito. Ao que parece, ela tinha terminado a relação de dois em que estava. Não me contive em mostrar meu contentamento com a notícia. Sempre que a ligava afim de notificações, ela parecia chateada com algo que o branquelo aprontara. Para a sorte do sujeito, eu estava a milhas de distância para ser capaz de lhe dar um bom murro na cara. Mas fiquei feliz em saber que ele parecia agir feito um cão arrependido atrás dela. Isso já valia a pena.

Também descobri outras coisas, dentre elas era que não tinha voltado com saudades dos velhos amigos, e sim a trabalho. Tal foi minha surpresa ao saber que a agência em que Cleo trabalhava também concorria ao prêmio, e que ela estava ali para recebê-lo. Lógico que não perdi tempo em brincar dizendo que ela deu viagem perdida, pois o prêmio seria nosso. Não deixando barato - porque Cleo nunca foi dessas - ela retrucou dizendo que acreditaria nisso se fosse meu irmão ainda no comando, e não eu. Não levei a mau suas palavras. Além de ser uma implicância fraternal, ela só estava se baseando no que sabia sobre minha vida passada. Aproveitando a deixa, ela me questionou sobre todo tipo de coisa. E quando chegou na quesito amoroso, dei meu melhor jeito de desviar do assunto. Ela não caiu, claro, mas também não me pressionou.

Falamos um pouco mais sobre assuntos aleatórios, e pude ver como ela amou conhecer Nora. Quando ficamos a sós, me confidenciou que de fato aprovara a nova cunhada. Num lapso de inocência, perguntei-me se aprovaria Scarlatti também. Mas era óbvio que eu estava sendo precipitado e ingênuo. Primeiro, pela probabilidade de Scarlatti nunca vir a ser nada mais do que apenas minha parceira de sexo - isso, supondo que eu a convencesse a voltar a situação de anterior - segundo, por ambas terem gênios e personalidades idênticas demais. Para a minha sorte.

Minha Tentação - CONCLUÍDOOnde histórias criam vida. Descubra agora