Dylan Narrando - II Parte

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Eu não era o tipo de cara religioso, mas, assim como boa parte da humanidade, conhecia a historia de Adão e Eva.

A maioria das pessoas julgavam Adão por ter caído na conversa de Eva, que por sua vez caiu no sussurro da serpente. Eu, no entanto, culpava a fruta. Ela era a conhecedora do bem e do mau. E era exatamente dessa forma que via Scarlatti. Ela não era a minha "Eva", e eu não me considerava o  Adão por me render a sua conversinha - que no caso era o seu charme. Eu a culpava por ser tão insuportavelmente suculenta e difícil de resistir como a fruta.
Foi praticamente impossível trabalhar durante toda a manhã Tivemos uma reunião com o pessoal da criação e alguns representantes dos outros setores, explicando exatamente o que precisávamos que fizessem. Foi uma reunião chata e que passei a maior parte do tempo rodando os olhos, falando apenas quando achava necessário. Scarlatti liderou praticamente sozinha. Ela era dura, mas educada, deixando que todos sempre opinassem. Vê-la discutindo ideias e tomando a frente de tudo com garra e ímpeto não ajudou em nada no que dizia respeito a evita-la. Parecia que ficava ainda mais linda mergulhada no trabalho. Não colaborou com minha alto-estima, também. O que ela tinha dito sobre eu ter mais futuro como fotografo não saía da minha cabeça. Tudo bem que ela estava me provocando, mas havia falado sério. E, por mais que nós dois soubéssemos que eu não levava jeito para ser fotografo, eu subentendia que eu levava jeito para tudo ou ser qualquer coisa menos um publicitário de respeito.

Fiquei com aquilo na cabeça o resto da manhã. Depois da reunião, que durou umas boas duas horas - mas que pareceram dois dias - decidimos que estava tudo bem com a conta da Cosmetic Princess - embora, claro, Scarlatti não tenha sossegado até fazer algumas alterações. Confesso que ficou melhor, mas não diria isso para ela nem sob tortura.

 Trabalhamos em mais algumas contas para adiantar e eu pedi a Laura que marcasse a reunião com o representante da Cosmetic de uma vez por todas. Dessa vez, eu sabia, o credito seria todo para Scarlatti, mas não me importei. Éramos uma dupla, um ajudava o outro, mas reconhecíamos o esforço de ambos.

Perto do horário do almoço, meu irmão me ligou ppara que fosse a  sua casa. Eu sabia que ele queria me parabenizar de um jeito mais formal pelo sucesso com a conta da Bone, mas realmente não estava no clima para isso. Considerei recusar, sabendo que ele notaria a estranheza em mim, mas que tornaria tudo mais óbvio se dissesse não. Eu já tinha recusado no domingo, se o fizesse de novo Derik ficaria preocupado, e isso era a ultima coisa que queria.

- Acho que na volta do almoço podemos discutir estratégias para levar o prêmio da PMAPA - Scarlatti disse enquanto eu ajeitava algumas coisas para sair.

- É, pode ser - eu disse com pouco interesse, evitando olha-la. Mesmo enquanto debatíamos sobre as outras contas eu a evitava. Se eu não visse a fruta, não iria querer pega-la, certo?

Eu a ouvi suspirar do outro lado.

- Você está bem, Dylan? - A preocupação genuína em sua frase me fez virar para ela.

Foi um erro daqueles!

Scarlatti estava recostada na lateral da sua mesa com os braços cruzados, mmas não sobre o peito e sim debaixo dos malditos, de forma que eles se estufaram mais e quase saltaram do decote.

Engolindo seco, eu rapidamente desviei minha atenção para os papéis a minha frente, tentando me concentrar no que fazia para dar logo o fora dali. Até respirar perto dela parecia difícil naquele dia.

- Eu estou ótimo! - Menti. Minha mente estava uma loucura, como uma sala cheia de papeis com a janela aberta, e o vento soprando fazendo tudo se espalhar. Scarlatti era o vento, claro, e os meus pensamentos os papéis. Apenas duas folhas não se espalhava por nada por estarem marteladas de forma seguras numa parede protegida: Um lembrete de que ela era minha tentação constante, e sua frase:

"Talvez você devesse pensar em ser fotógrafo ao invés de publicitário. Pelo andar da carruagem, acho que você teria mais futuro"
Duas coisas apenas, mas que causavam um reboliço de sentimentos estranhos dentro de mim. Toda a confiança e incentivo que ganhei após a conta do senhor Bone foi pro beleléu!

- Dylan?

Eu estava de cabeça baixa, guardando tudo com raiva e desordem dentro da maleta, mas podia vê-la, agora parada a minha frente.

- Porra! Eu já disse que estou ótimo, Scarlatti! - Grunhi.
- Não, você não está. Você nunca fala a palavrinha com P se não estiver realmente possesso com algo.
Eu ergui minha cabeça para ela, fechando a maleta sem ver.
- Como sabe disso? - Inquiri.
Ela encolheu os ombros.
- A gente ficou uns dois meses juntos não tendo"nada" - fez aspas - Acho que sei algumas coisas sobre você, afinal.
Eu suspirei e passei a mão pelo cabelo.
- Que seja! - Eu puxei a maleta e saí de trás da mesa, pretendendo sair, mas não conseguindo chegar nem a porta com Scarlatti se pondo no meu caminho.
- Me fala - ela pediu, suas mãos em meu peito. A preocupação ainda em sua voz me fez abaixar a cabeça para ela. Olhando em seus olhos pude ver que realmente parecia angustiada.
Eu suspirei outra vez, largando todo o ar que continha em meus pulmões.

Será que devia dizer a ela como me sentia?

Eu podia?

Porque devia fazer uma coisa dessas?

E porque ela estar preocupada comigo me fazia sentir bem ao mesmo tempo em que me fazia sentir mau?
Eu não queria que ela se importasse comigo, mas também queria. Caramba! Ela me deixava tão confuso...

- Não é nada, Scarlatti. De verdade - eu forcei um sorriso, por que muito embora não queria dar satisfações a ela, também não queria ver aquela expressão em seu rosto - Só estou um pouco puto com você. Se fizéssemos sexo, tenho certeza de que isso passaria... - meu dedo deslizou provocativamente por seu lábio inferior. Eu estava mentindo e falando a verdade ao mesmo tempo, se é que isso era possível.  Bem, mas tudo com Scarlatti era incerto e me deixando na berlinda.

Ela puxou a cabeça para trás, se afastando do meu toque.

- Não vamos fazer sexo nunca mais, Dylan.
Algo em meu peito vibrou com a certeza de suas palavras. E a raiva tomou conta outra vez.
- Bom, então saia da minha frente - voltei-me indiferente. Tentei passar, mas ela segurou minha mão e entrelaçou nossos dedos. O toque da sua pele na minha enviou raios de calor por meu corpo e saudade em meu peito.
- Mas quero que sejamos amigos.
- Com você me torturando?
- Não. Sem torturas - a forma séria de como falou me fez virar para ela de novo.
- Está falando sério? - Perguntei, surpreso e... Decepcionado? Mas eu queria que parasse, não queria?
Scarlatti assentiu.
- Você tem sua vida e eu tenho minha. Decidimos parar antes por um motivo: Porque não estava dando certo. E não vai dar agora, também - ela estava tão séria e calma que chegou a me dar medo. Nem quando decidi antes que queria parar tinha sido assim.

Um calafrio estranho subiu por meu corpo e eu estreitei os olhos. Tentei aceitar o que ela disse, mas parecia estranho e errado. Todavia, eu sabia que ela estava certa. Por mais que fosse apenas sexo - o melhor que já tivera - e eu não quisesse perder, não iria dar certo. Nunca.

- Você tinha razão quando disse que não sou mulher pra você... Ou pra qualquer um - e eu vi de novo, a mesma dor que encontrei em seus olhos na noite do bar, só que agora um pouco mais escondida. Meu coração se contraiu e eu senti a necessidade estranha de abraça-la, como nunca fiz antes. Ao invés disso, apertei minha mão com a sua.
- Eu não queria ter dito aquilo.
Ela forçou um sorriso.
- Nunca dizemos nada que realmente não queremos dizer, Dylan. Mas as vezes nos arrependemos de tê-las dito. É normal - ela encolheu os ombros e tentou sorrir, mas seu lábio inferior tremeu.

A vulnerabilidade que nunca vi antes em seu olhar e que estava ali agora me chocou. Estava acostumado com a Scarlatti durona, sedutora, irritante, ppoderia e até presunçosa, mas não com aquela sensível. Estava certo de que isso tinha sido causado por mim quando explodi com ela naquela madrugada, e a dor estranha em meu peito só piorou. Era mais do que culpa, mas não sabia o qque mais poderia ser.

Tentei falar alguma coisa, qualquer coisa para confortá-la, mas  não consegui. Minha boca se abria e se fechava e nada saía. Eu não sabia como lidar com aquilo ou o que exatamente devia dizer. Nem um pedido de desculpas eu fui capaz de formular. No fim, Scarlatti me deu um sorriso murcho e saiu, deixando-me ali de boca aberta. E naquele momento eu soube. Soube que Scarlatti era muito mais do que aparentava ser.

Minha Tentação - CONCLUÍDOOnde histórias criam vida. Descubra agora