Dylan Narrando - III Parte

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Não me movo. Meus olhos mal piscam, focados na porta dupla a minha frente, e minha cabeça ainda roda um pouco. Quando vejo algum movimento de passos pela fresta inferior da porta meu coração reage instantaneamente, na esperança de que vou ter alguma notícia de Scarlatti. Porém sempre me frustro ao ver outras pessoas e não a enfermeira baixinha e morena que me atendera antes. Meu pé esquerdo não se cansa de bater contra o chão, indicando da minha impaciência. O que eles tanto fazem lá dentro? O que aconteceu com Scarlatti? Onde ela está? Ansiava ligar pra Derik, pedir alguma ajuda e ter algum apoio do meu irmão seria reconfortante, mas não podia. Lembrar das coisas que fiz e disse, tendo sido muitas poucas horas atrás, me impedia de contata-lo. Sentia-me imensuravelmente envergonhado, ao ponto de suportar passar por tudo isso sozinho.

- Aceita um café? - A voz suave de Gerlane, a mulher do cara que me ajudou a trazer Scarlatti ao hospital, me rouba momentaneamente a atenção.

- Não, obrigado - minha voz está rouca e baixa. Dou um sorriso fraco para a mulher em agradecimento e olho para a lixeira ao meu lado. Já perdi a conta de quantos copinhos de café eu virei e joguei ali dentro na ânsia de ganhar alguma sobriedade. Ainda não me sentia nem 50% sóbrio, mas já era capaz de entender muita coisa. A adrenalina lutava contra o poder do álcool constantemente.

Não fazia tanto tempo que estávamos ali, uma hora no máximo. Precisei dar entrada de Scarlatti no hospital, e constatei que não sabia muito a seu respeito. Além do nome completo e da idade, que eu sabia apenas por ser mais velho sete anos que ela - eu não sabia mais nada. Se era alérgica a alguma coisa, os sintomas que a trouxeram ali e se tinha tomado alguna medicação antes... Nada disso eu sabia. A recepcionista não obteve muita informação de mim, isto é fato.

Mudo a posição dos braços cruzados, invertendo-os para não adormecerem, e volto a encarar a porta dupla. Estou agonizando cada vez mais rápido sem notícias, pensando todo tipo de besteira. Já diagnostiquei Scarlatti com todo tipo de câncer existente nos meus piores pesadelos, e todo tipo de doença tão grave quanto. Naturalmente, acabo espalhando tais medos, mas vira e mexe volto neles. Tudo o que sei é que, independente do que seja, estarei ao seu lado.

O movimento de pés volta a dar sinais pela fresta da porta e eu chego a me desencostar da parede, torcendo para que seja noticias dela. A enfermaria que barrou minha entrada irrompe as portas e me procura com os olhos. No mesmo instante estou plantado a sua frente, assustando-a de repente.

- E então? Ela esta bem? Posso vê-la? O que ela tinha? É grave? - Disparo para a mulher, que recua um passo atrás.

- Calma, rapaz - ela ergue as mãos espalmadas e da um leve sorriso - vamos devagar.

Eu aceno apressadamente mais de uma vez num segundo. Sinto Gerlane e seu marido, Bruno, se aproximarem de mim. Mesmo eu tendo dito que eles não precisavam ficar, eles insistiram. Concordamos então que ficariam somente até termos notícias de Scarlatti, não queria estragar mais a noite deles prendendo-os num hospital com pessoas desconhecidas.

- Bom, aparentemente não foi nada tão grave. O médico pediu alguns exames para ter certeza... De algumas coisas - ela diz, e sua hesitação me preocupa - Ele está os avaliando neste momento. A paciente se encontra de repouso no segundo andar no quarto 302... E sim, o senhor pode vê-la - ela me responde com um sorriso, prevendo que eu a perguntaria por isso - O doutor irá encontra-los dentro de alguns instantes.

- Obrigado - eu aperto suas duas mãos em verdadeiro agradecimento. Assim que a enfermeira se vai, eu me viro para o casal, que está abraçado e com um sorriso afetuoso nos lábios.

- Bom, está tudo bem agora - digo-os, feliz ao mesmo tempo em que ansioso e agradecido - Muito obrigado pela ajuda. Jamais esquecerei algo assim.

- Não há de que, rapaz - o homem levemente calvo e de bigode ralo me fala - Não poderíamos ver aquilo e ficar a espreita.

Minha Tentação - CONCLUÍDOOnde histórias criam vida. Descubra agora