7. Sentimentos

100 7 0
                                    

No dia seguinte, acordei com a cabeça latejando.Demorei para me localizar e lembrar dos acontecimentos da noite anterior. A janela do quarto de visitas da casa de Lucas estava aberta e uma claridade irritante entrava através dela. Tentei me levantar, mas senti um peso em cima de meu braço. Verena dormia apoiada em mim, o cabelo jogado no rosto. Apesar da ressaca descomunal, sorri. Preparava-me para acordá-la delicadamente quando a porta do quarto abriu-se abruptamente.

Lucas e Aisha entraram como dois furacões, acordando Verena e fazendo minha cabeça doer ainda mais.

-Porra. - Vê resmungou, afundando a cabeça no travesseiro. - O que vocês estão fazendo aqui?

-Nena, sua mãe... - Aisha interrompeu-se quando Verena se sentou na cama, percebendo que a amiga usava só um sutiã. Ela sorriu e Lucas olhou para mim pedindo explicações. Eu o mandei silenciosamente para aquele lugar. - Desculpa, a gente não sabia que...

Verena corou ao perceber que estava sem blusa, levantando-se rapidamente para vestir a peça.

- Eu passei mal ontem e o Rafa me ajudou. - ela deu de ombros. Não era uma mentira. - O que vocês queriam?

Aisha revirou os olhos e Lucas fez um som de deboche.

-Estávamos dormindo na sala. Acordamos com seu celular tocando. Sua mãe deve ter te ligado umas dez vezes. - ela estendeu a mão, entregando o aparelho.

- Caralho. - ela disse o palavrão pausadamente, sílaba por sílaba, como só então se desse conta da situação. Arregalou os olhos e passou a mão no cabelo. - Eu dormi fora de casa. E não avisei minha mãe. Eu estou ferrada!

- Vê, calma. - tentei evitar que ela entrasse em desespero, e finalmente saí da cama. Eu sabia que estava tão ferrado quanto ela, mas Verena estava estática.

-Acho que ela parou de respirar. - Lucas sussurrou, e Aisha lhe deu um tapa no braço.

De repente, ela acordou e olhou para o visor do celular.

- Já é meio dia! - gritou, saindo do quarto em disparada. - Ela tá me ligando desde ontem, que bosta!

Ela desceu as escadas correndo, fazendo um estardalhaço e acordando Sapo,Gabriela e Diego.Lucas e Aisha a seguiram, enquanto eu vestia minha camiseta.

- Aonde você vai? - Aisha gritou, mas Verena já estava na rua. Balancei a cabeça e a segui. Quando finalmente a alcancei, segurei seu braço, fazendo-a parar.

-Verena, respira!

-Eu tô muito ferrada, Rafa! - ela choramingou e eu não pude deixar de rir diante de sua expressão. - Para de rir da minha desgraça, meus pais vão me matar.

-Bom, eles vão te matar de qualquer jeito, quer você chegue agora ou daqui a dez minutos. - levantei os ombros e ela riu. - Quer tomar café?

Ela concordou com a cabeça e fizemos um pequeno desvio. Fiquei grato por ela aceitar minha sugestão, pois estava morrendo de fome. Paramos na padaria perto de casa e eu comia meu pão na chapa enquanto ela digitava uma desculpa para sua mãe.

-Choveu ontem à noite? - ela levantou os olhos do aparelho, me encarando.

-Não tenho certeza... Por que ?

- Estou inventando uma história. Que tal se eu disser que fomos no Lucas, como o previsto, os pais dele estavam viajando e com a chuva acabou a energia na casa dele. Naquela parte da cidade sempre acaba a energia.

Então ficamos sem sinal no celular e não tinha ninguém para nos levar embora no meio daquela chuva e nem como nos comunicarmos. A bateria dos nosso celulares acabou e não tínhamos energia para carregá-los. Quando a energia voltou, já era tarde e estávamos tão cansados que dormimos. - ela falava rápido, gesticulando as mãos.

-Que ótimo plano. Com certeza nossos pais acreditarão. - ironizei.

- Você tem alguma sugestão melhor? - ela perguntou, revirando os olhos.

-Diga que você fumou maconha, ficou chapada, agarrou seu melhor amigo, vomitou, dormiu e não conseguiu acordar porque estava de ressaca.

-Acho mais fácil eles acreditarem na história da chuva. - ela ria com vontade, as covinhas se acentuando. Deu um gole em seu café e suspirou.-Chega de adiar. Vamos pra casa, vai.

Ficamos de castigo, como previsto. Mas as férias estavam quase no fim e não nos importamos muito. Mais tarde naquele dia, Lucas foi até minha casa. Não foi muito bem recebido, é verdade.

-Acho que seus pais estão com raiva de mim, Rafa. - ele disse assim que entrou no meu quarto, ligando a TV. - Mas não é minha culpa que você e a Nena transaram e esqueceram da hora.

Joguei um travesseiro em sua direção e ele riu.

-Não transamos, babaca.

-Faz quanto tempo que vocês tão com esse rolo aí? - ele mudava os canais desinteressado.

-Um tempinho, mas não é nada sério. Por que?

-Não entendo vocês. Ninguém entende, acho que nem vocês. Fala sério, tá na cara que vocês se gostam. Assumam de uma vez.

-A gente é amigo, Lucas. - revirei os olhos. Não era a primeira vez que tínhamos aquela conversa.-Não vou namorar a Vê. Ela é a Verena, meu. É só atração. Gosto dela como amiga.

- Tá bom. Repita isso mais umas vezes e quem sabe você passe a acreditar. -ele desdenhou e virou-se para mim. - Mas, sabe, enquanto você tá com dificuldade pra entender o que sente pela Nena, a fila de cara atrás dela tá aumentando.Fica esperto.

-Do que você tá falando?

-O Vinicius tá caidinho por ela. Fala pra quem quiser ouvir. Vai levar ela pra um restaurante top em Ribeirão Preto. Com o carro que ele acabou de ganhar dos pais. - ele balançou a cabeça, como quem diz ' eu avisei' e eu ri.

-Tá bom. Até parece que o tio Roberto vai deixar ela sair com esse cara.

-Até porque a Verena sempre obedece aos pais, né? - foi a vez dele de rir. -Cara, eu só vim aqui ver se você tava legal. Meus pais chegam de viagem hoje, preciso estar em casa. A gente se vê na aula segunda, ok?

Ele saiu do meu quarto mas eu nem respondi. A Verena era solteira, tinha quase dezesseis anos, podia sair com quem bem entendesse. Eu não ligava.

Estressado, peguei meu celular. Tinham algumas mensagens bem humoradas de Verena fazendo piada sobre o castigo. Ignorei-as e mandei mensagem para Manoela, convidando-a para ir ao cinema.

VERENA - concluídaOnde histórias criam vida. Descubra agora