Em julho do meu último ano do ensino médio, Verena e eu viajamos para o Chile, só nós dois. Foram dias incríveis, conhecendo paisagens, vinícolas, restaurantes, ruas, esquiando, nos curtindo. No nosso último dia lá, depois de uma tarde inteira esquiando, fomos assistir a uma peça de teatro. Nos arrumamos, eu de terno e Vê de vestido e salto alto. Nosso plano era depois da peça, irmos a um restaurante, mas a verdade é que estávamos muito cansados.
-Tô me sentindo uma velha de 80 anos,pedindo comida no quarto do hotel ao invés de sair. - Verena brincou, apoiando-se em mim dentro do elevador para tirar os saltos.
- Mas uma velha feliz. - pontuei, e ela riu.
-Muito feliz, eu só quero deitar e dormir! - ela encostou a cabeça no meu ombro enquanto o elevador subia até o nosso andar.
Assim que chegamos na suíte, ela tirou o vestido e colocou pijamas confortáveis, prendendo o cabelo em um rabo de cavalo, sem no entanto tirar a maquiagem. Eu coloquei uma calça de moletom e uma camiseta, e assim passamos nossa última noite em Santiago.
- Acho que esse é nosso melhor jantar aqui. - eu disse entre uma garfada e outra de meu risoto.
- Vou beber a isso. - ela concordou, erguendo a taça de vinho tinto e dando um gole. - Obrigada, Rafa.
- Pelo que, lindinha? - perguntei, entrelaçando nossos dedos por cima da mesa.
-Por ser a melhor companhia do mundo. - ela sorriu e eu derreti por dentro.
- Mesmo quando eu fiquei com medo das pedras na Ilha de Páscoa? - ergui uma sobrancelha e ela gargalhou.
- Mesmo assim. Bom, você me aguentou reclamando da andança pelo deserto do Atacama, então acho que valeu a pena.
- É claro que valeu a pena. - beijei sua mão e ela deu mais um gole no seu vinho.
- A gente vale a pena, Rafael. Vamos prometer que nunca vamos esquecer isso, ok? - ela apertou minha mão mais forte e eu sorri.
- É claro que não vamos esquecer, Verena. Eu te amo.
- Eu também te amo, Rafa, muito. Eu te amo por tudo que você já fez por mim, por todas as vezes em que você poderia ter ido, mas ficou, por quem eu sou quando estou com você... Mas a gente vai seguir caminhos separados, Rafael, e eu tenho medo que isso nos separe.
-Vê, para de bobagem. - suspirei, sabendo onde ela queria chegar. Faltava apenas 4 meses para nos formarmos no ensino médio,e então, de repente, nossas vidas mudariam drasticamente. Vê sairia de Abaré, eu continuaria ali,tendo decidido em me focar na música.
- Não é bobagem, Rafa... Só, só promete que a gente vai se lembrar de como nos sentimos quando a gente tinha 17 anos?
- Prometo. - concordei, e ela sorriu.
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Em dezembro do meu último ano do ensino médio, eu completei 18 anos e me formei. Eu, que achava que não ficaria melancólico, chorei pra caralho, especialmente quando Vê, oradora da turma, leu seu discurso.
- Boa noite, pais, professores, colegas e a todos presentes. - ela disse nervosa ao microfone. - Quando me pediram para fazer um discurso na nossa formatura, eu fiquei animadíssima. Sabe, eu sempre sonhei em me formar no ensino médio. Mas nas últimas semanas, quanto mais próximo da formatura estávamos, mais eu queria que demorasse para esse momento chegar. Vários de nós estão no Colégio Alfa desde pequenos e ontem, ao vir aqui para conversar com a diretoria sobre as solenidades de hoje, meu coração ficou apertado ao ver esse colégio vazio. As salas de aula, que presenciaram tantos risos sinceros, aulas inesquecíveis, desesperos pré provas, comemorações e, por que não?, algumas pequenas derrotas também. Esse Colégio faz parte da minha história, da nossa história. Foi uma honra passar o ensino médio ao lado desse time incrível de professores e colsboradores, e principalmente, de todos meus colegas. Ao longo dos últimos três anos, convivemos por vezes mais uns com os outros do que com nossas famílias. Nos desesperamos ao nos deparar com tanta matéria, nos solidarizamos ao ter que virar a noite decorando fórmulas de física, nos orgulhamos ao termos colegas ganhando Olimpíadas de Matemática, nosso time de futsal conquistando o estadual. Nós estudamos, sim, e muito aprendemos sobre logaritmos, topografias, períodos históricos, calorimetria, botânica... Mas mais do que isso, aprendemos uns com os outros e com aqueles que diariamente se esforçaram para nos ensinar. Hoje vamos para o mundo, conquistar nossos sonhos e eu sinto um misto de animação e medo. E saudade. Turma de 2010, eu já sinto muitas saudades. O ensino médio me deu asas para voar, mas raízes pra quando eu quiser voltar. Me deu maturidade e vontade de lutar pelo que quero. Me deu melhores amigos e um amor. Para todos que possibilitaram que nós chegássemos até aqui, nossos pais, professores, família, coordenação, meu muito obrigada. Pensar que eu não vou ver o rosto de todos vocês todos os dias sete horas da manhã a partir de agora é estranho, mas eu sei que todos vamos estar dando o nosso melhor para conquistar o que queremos. Se eu puder desejar uma coisa para nós hoje, é que não nos esqueçamos pelo que estamos lutando. Parabéns a todos nós!
Verena foi aplaudida de pé, e desceu até o público novamente com um sorriso gigante no rosto. Aisha envolveu-a em um abraço esmagador, e logo estávamos todos em um abraço coletivo.
- Eu amo vocês pra caralho. - Diego disse.
- Meu Deus, Diego Aranha demonstrando sentimentos? - Lucas perguntou. - É o fim do ensino médio e do mundo também, meus amigos.
- Eu to emotivo, caralho! - Diego deu de ombros,e Lucas riu, abraçando-o.
- Nossa futura médica favorita! - Gabi disse apertando as bochechas de Vê. - Foi lindo.
Verena encostou-se em mim, sorrindo. Beijei o topo de sua cabeça e ela virou-se de frente para mim, ficando na ponta dos pés, apesar de salto, para me dar um selinho.
- Te amo. - ela disse baixinho.
- EU NÃO ACREDITO QUE MEU CASAL NÃO VAI ESTAR NA MESMA CIDADE ANO QUE VEM. - Aisha, dramática como sempre, reclamou, berrando.
- Talvez estejamos... Eu passei na primeira fase da Fuvest, pode ser que eu faça USP em São Paulo, e o Rafa vai sempre pra lá por causa da gravadora. - Verena disse, feliz.
- Eu confio nos desígnios do Senhor! - Aisha levantou as mãos ao céu e eu apenas ri.
- Vamos tirar uma foto, seu bando de loucos. - sugeriu Sapo e nos viramos sorrindo para as câmeras dos fotógrafos.
Com becas e diplomas em mão, Verena, eu, Lucas, Aisha, Gabi, Sapo e Diego sorrimos para a foto, juntos. Passáramos os últimos anos nos vendo diariamente, mas com o decorrer dos anos que se seguiriam, aqueles momentos se tornariam cada vez mais raros. Mas ali, no nosso último momento como estudantes de ensino médio, aquelas eram as pessoas com quem eu queria estar. E nada mais importava.
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VERENA - concluída
Novela JuvenilVerena e Rafael são amigos desde o berço.E essa é a história de como eles passaram de melhores amigos inseparáveis a algo a mais. Algo grandioso. Algo que algumas pessoas passam a vida inteira procurando. Juntos, eles descobriram a raiv...