32. De volta

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- Amor, você tem certeza de que eu tô bem?

Era a quarta vez que Verena me perguntava aquilo em pouco menos de 15 minutos. Suspirando, virei-me para ela.

- Vê, você tem certeza de que quer fazer isso?

- Sim! Eu preciso... Mas, sei lá. Não quero que todo mundo fique me olhando.

- Linda, você é o centro das atenções desde os 10 anos. - brinquei e ela riu, pegando a mochila em cima do sofá e jogando-a por cima do ombro.

Faziam 4 semanas que Verena tinha sido operada. Ela estava em seu segundo ciclo de radioterapia e o prognóstico não poderia ser melhor. Sua visão estava intacta, a dor de cabeça nunca mais a incomodara e o que restara do tumor estava sendo reduzido com a radioterapia de acordo com o esperado. Obviamente, nem tudo era um mar de rosas. A radioterapia tinha seus efeitos colaterais. A cada sessão Vê voltava como se tivesse ido para a guerra. Estava sempre cansada, enjoada, vomitando. Para completar, na semana anterior, na região da cabeça em que estava sendo feito o tratamento, Verena apresentara queda de cabelo. Vaidosa como sempre fora, havia sido um golpe difícil.

Ainda assim, ela decidira que era hora de voltar à escola. Ela tinha continuado a estudar em casa, com todos os professores mandando para sua casa o conteúdo das aulas. As primeiras provas bimestrais já haviam acontecido e ela tinha ido surpreendentemente bem. Mas estávamos no último ano do ensino médio, e ela insistira em voltar para o Colégio Alpha, temendo pelas provas de vestibular do final do ano.

Aquele seria seu primeiro dia de volta, e ela não estava tão confiante. Ela conseguira esconder bem a falha em seu cabelo, mas ainda assim, estava com medo. Desde que ela operara, eu não saíra de seu lado. Ia para a escola e então direto para sua casa, ou para o hospital onde ela fazia o tratamento. Eu não era o único ao seu lado. Além de sua família, Aisha, Gabi, Lucas, Sapo, Diego estavam sempre ali, mostrando apoio.

No entanto, o retorno ao Colégio Alpha seria o reencontro de Verena com as centenas de adolescentes que ela não via há meses. Poucos dias antes ela me confessara que não queria transparecer o sentimento de pena. Não ela, que sempre fora aluna exemplar, popular, envolvida em tantos assuntos na escola. Mas seu objetivo de voar alto, de conquistar muito mais do que Abaré tinha a oferecer era mais forte que sua vaidade, então, ela retornaria a escola.

-Ok, crianças, estão prontos? - tia Flávia entrara na sala, e embora tivesse feito a pergunta a nós dois, olhava apenas para a filha, esperando a resposta.

- Sim. - Verena sorriu, depois de respirar fundo. Ela olhou para mim e eu retribuí o sorriso, estendendo a mão e entrelaçando nossos dedos. Entramos no carro de tia Flavia, e ficamos todo o percurso em um silêncio um tanto quanto desconfortável. Ela nos desejou boa aula quando estacionou na frente da escola e nós agradecemos, descendo do veículo.

Revirava minha mochila em busca de minha carteirinha para passar na catraca quando Verena me puxou. Ela olhava séria para mim e eu logo me preocupei.

- Vê? Tá tudo bem? Tá com dor? Quer voltar para casa? Eu posso chamar...

- Shh. - ela me interrompeu, colocando o dedo indicador em meus lábios e dando um passo para a frente. - Eu só queria te agradecer, antes de entramos na escola.

- Pelo que? - inclinei a cabeça para o lado, sem entender.

- Você é tão incrível que nem percebe tudo que tem feito por mim, né? - ela riu. - Rafa, você sabe o nome de todas as enfermeiras do instituto de radioterapia, de tanto que foi lá no último mês. Você sabe o horário de todos meus remédios, sabe que eu fico enjoada depois da sessão de radio por isso nunca usa perfume nesses dias e para completar continua olhando para mim como se eu fosse a menina mais linda do mundo, mesmo com essa cara inchada de corticoide, e essa falha gigante no meu cabelo.

- Amor...

- Shiu, eu não terminei. - ela me calou novamente. - Então, bem, obrigada por tudo isso e por ser o melhor namorado do mundo. Estar aqui na frente da escola me lembra que teve um tempo em que a gente só era um casal adolescente normal, e eu te amo cada dia mais.

Olhei para ela, quieto. Ela ergueu uma sobrancelha e riu.

- Pode falar agora.

- Ok. - eu ri. - Primeiro, você ainda é a menina mais linda do mundo. Segundo, não tem pelo que agradecer. Eu não estou fazendo isso por altruísmo, mas sim porque eu só consigo ficar feliz sabendo que você tá bem. E eu te amo cada dia mais também.

Ela sorriu para mim e me deu um selinho.

- MEU CASAL TÁ DE VOLTA, ME SEGURA! - fomos interrompidos pelo berro de Aisha, que vinha correndo da esquina. Ela pulou em cima de nós, sendo seguida por Lucas.

- Aish, você tá meio que me sufocando. - Verena disse, amassada em um abraço coletivo.

- Foda-se, finalmente você voltou. Essa escola tava muito sem graça sem você. - Aisha gritou, apertando as bochechas da melhor amiga.

- Eu te amo, mas se você fizesse menos escândalo eu agradeceria. Sabe, todo esse negócio de ser a menina do tumor cerebral que quase ficou cega e tal já chama bastante atenção sem você berrando. - Verena disse, envergonhada.

-Nena, querida, são adolescentes. Eu saindo do armário é muito mais interessante, relaxa, comigo por perto você não vai ser assunto, prometo. - Lucas deu de ombros, puxando Aisha de cima da minha namorada.

Verena gargalhou, ainda envolvida naquele abraço coletivo. E assim, ainda juntos, passamos pelas catracas e entramos na escola.

VERENA - concluídaOnde histórias criam vida. Descubra agora