Passaram-se alguns minutos sem que nenhum de nós pronunciasse uma palavra, apenas recuperando ao respiração e procurando um pouco do equilíbrio perdido com o beijo.
- Não estava a espera disto.- Ele foi o primeiro a falar.- Desculpa, mas não me consegui conter.- Disse confuso ainda com o que tinha acontecido.
- Nem eu. É sempre assim com os da sua espécie?- Perguntei inocente.
- Não. E com a tua?- O sorriso que acompanhava a sua resposta não deixava dúvida relativamente a veracidade de sua afirmação.
- Não sei, este foi o meu primeiro beijo- Envergonhada baixei a cabeça.
Nesse instante fui assaltada por tantos sentimentos que se tornava difícil ter algum pensamento coerente e controlar a minha vontade insana de beija-lo novamente. Não queria que ele pensasse que eu andava a beijar todos os que eu conhecia e saber que ele já tinha beijado antes não me deixou nada satisfeita. Seria capaz de bater em qualquer outra fémea com que ele partilhasse esse tipo de intimidade. Mas estava muito, mas muito feliz por ele nunca ter experimentado algo assim com outra pessoa. Sabia no entanto que o que tinha acontecido não poderia repetir-se, não era correto. Ele não era o parceiro apropriado para a futura Alta Sacerdotisa do Akasha, para além de não sermos da mesma espécie. Tudo o que estava a acontecer estava errado, mas porque é que no mais profundo do meu coração sentia que tudo estava bem e que estava destinado para acontecer dessa forma.
O conflito instalou-se em mim, já não sabia o que pensar, o que fazer, se devia aceitar e ver no que dava, enfrentar todas as consequências e julgamentos de que seria alvo ou se devia recuar e esquecer. Mas esse simples pensamento levou água aos meus olhos e comecei a chorar. Chorava porque não sabia o que seria de mim se nunca mais pudesse sentir a sua presença, o seu calor. Chorava porque sabia que o racional seria afastar-me dele, porque "nós os dois" nunca existiria. Não sabia o que fazer, a verdade era essa.
O conflito entre o que eu devia fazer e o que eu sentia que devia fazer travava uma batalha cujo resultado não conseguia antecipar.
Entretanto fui abraçada novamente e deixei-me ficar no conforto e proteção que esse gesto me proporcionava. Chorei até não ter mais lágrimas disponíveis
- Não te preocupes, tudo se irá resolver – disse ele com uma voz embargada.
- Será?- Falei ainda chorosa.
- Sim, o que se está a passar connosco é demasiado precioso. Recuso-me a pensar que não poderá acontecer.
- Então também tens consciência que isto não pode existir? Esta situação é anti natura, nunca se ouviu falar em uma relação entre seres de espécies diferentes. Eu nem sei se somos sequer anatomicamente compatíveis, se poderíamos acasalar e procriar. Tudo me parece muito confuso e não compreendo como é que podemos nos sentir assim tão atraídos um pelo outro. Não deveria ser possível! Não percebo, juro que não percebo como é que a Deusa deixou que isto fosse acontecer.- Neste momento estava furiosa e muito desnorteada, o destino não estava a ser justo. Como é que poderia cumprir o papel que me tinha sido atribuído e ao mesmo tempo gerir este conflito que de tão absurdo era praticamente impossível de se viver.
- Não aceito isto, não vou deixar que tu te intrometas na minha vida e me desviar do que é correto. Esta decidido, vou esquecer que isto aconteceu. – Continuei, limpando furiosamente os últimos vestígios de lágrimas que ainda cobriam o meu rosto, endireitei o meu corpo orgulhosa e decidida e rematei concluindo.- Desculpe capitão Mikael pelos últimos acontecimentos, por favor esqueça a minha fraqueza, prometo que não voltara a acontecer. – Disse orgulhosa.
Virei-me e sem dar mais qualquer atenção a chuva que ainda caia corri, corri como nunca o tinha feito antes. Tomei a alameda eu me levava ao bosque que circundava o palácio. Esta era a primeira vez que não ficava deslumbrada com a sua beleza. Altas árvores vermelhas, todas diferentes nas suas texturas e tonalidades. Troncos direitos com umas com folhas enormes e triangulares agarrados a ramos que pareciam frágeis debaixo do seu peso e prestes a quebrar a qualquer momento. Outras despidas, deixavam amostra um enorme emaranhado de madeira verde-escuro, para ser contemplado antes que fosse invadido novamente, pelas folhas que a próxima estação traria, tapando a sua beleza. Conseguia passar horas a estudar cada uma dessas espécies que eram similares entre si e ao mesmo tempo de tal forma diferentes que guardavam um encanto único em cada uma delas. Tal como acontecia no universo cada um parecia completar o outro e todos juntos eram os protagonistas de uma sinfonia de beleza impossível de reproduzir se tudos fosse igual.
Quando finalmente parei, e encostei-me a uma árvore e cai em lágrimas novamente misturando-as com a chuva que teimosamente continuava a cair. Estava esgotada, física e mentalmente esgotada. Apesar daquilo que lhe tinha dito, sabia eu não seria fácil apagar da minha memória e especialmente do meu coração o que tinha acontecido. Voltei caminhando para casa, tinha eu me preparar para o jantar, ao qual não podia fugir. Teria que enfrentar mais esta prova hoje, a crueldade do meu destino não tinha fim. Mas sabia que o que não me matasse tornar-me-ia mais forte e decidi naquele instante que esta prova estava destinada a fortalecer o meu caracter e preparar-me para ser uma líder, porque se eu conseguisse ultrapassar isto seria capaz de o fazer com tudo.
Estava metido numa embrulhada enorme. Agora percebia porque é que o comércio do sexo entre espécies diferentes estava em franca proliferação.
Suniza... fazia horas que o seu nome não me saia da cabeça .
Ela estava a ser uma enorme surpresa. Além de linda, era forte e determinada... simplesmente cativante. Tudo me atraia... quando se riu por uma bobagem qualquer durante os treinos da tarde, fiquei fascinado... tudo nela resplandeceu. A coragem com a qual me enfrentou e me colocou no meu lugar sem nunca me desrespeitar, era obra de uma grande mente e uma ótima líder. Já tinha visto planetas suficientes para conseguir reconhecer a mente de um dirigente sem grande esforço.
Mas ainda assim não conseguia compreender como é que o beijo que trocamos podia ter sido dessa intensidade tão absurda. Nunca tinha vivenciado as mesmas sensações com outra mulher. O simples toque dos seus lábios tinha despertado toda a minha libido... que agora reacendia com a sua simples recordação. Iria ser muito difícil dali por diante estar perto dela sem que a evidencia das minhas vontades se fizesse mostrar. Nem queria pensar no que podia acontecer quando estivesse na presença da Alta Sacerdotisa. Sem querer soltei um gemido, não podia colocar em risco a minha missão por causa de uma mulher, mas a verdade é que estava preste a acontecer se não conseguisse controlar-me.
Agradecia a Suniza o discernimento que tinha tido em afastar-me. Quando o fez senti-me rejeitado e o meu orgulho ferido odiou-a... mas agora sozinho nos meus aposentos tinha que reconhecer que tinha sido a melhor opção. Nada de bom podia advir de um tal relacionamento, mais valia esquecer essa questão toda, mesmo sabendo que iria custar-me muito esquecer o que aquela pequena fada conseguia fazer comigo.
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Universo sem fim ( completo)
Science FictionExistem historias que são tão grandes que não podem viver somente num unico mundo... Neste universo sem fim exitem almas que foram feitas para se encontrarem. Entre guerras e conflitos o amor florece e se fortalece enfrentando tudo e todos. A histor...