Refúgio

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Setembro de 2015

A noite chegava com uma leve brisa, carregada de ansiedade. Luna iria à sua primeira e, talvez temida, festa da faculdade. Se o que a aguardava se parecesse com o que via nos filmes, sabia que teria mais a temer que desejar. O fato de ter sido criada em uma cidade pequena lhe trouxera um ar de desconfiança pelo desconhecido. Em Kentwood, havia pouco mais de dois mil habitantes, o que garantia certa segurança ao local. As festas eram, consequentemente, entre amigos. Nunca havia estranhos entre eles. E com a facilidade com que as notícias corriam por lá, ninguém ousava exagerar nas comemorações. Mas em Orlando as coisas eram diferentes. E Luna tinha consciência de que festas como aquela para a qual se arrumava eram repletas de álcool e atitudes inconsequentes. Entretanto isso não queria dizer que ela precisava fazer parte das devidas estatísticas, pensa.

Além do mais, sabia a hora de dizer não para tudo o que lhe parecesse fora de sua zona de conforto. Ainda assim, era inevitável refletir sobre o conselho dado pelo rapaz dos olhos tristes. Quem ele pensava que era para julgá-la daquela maneira?, questiona, inconformada. Percebera que suas intenções haviam sido boas mas, ele a magoara de certa forma.

Luna podia ter um comportamento excelente, enquanto aluna ou filha. Mas isso não queria dizer que não gostasse de se divertir. Podia muito bem ir àquela festa e curtir o momento até o último minuto, como qualquer outra pessoa, conclui. E era exatamente isso o que faria. No entanto, ficara impressionada com a expressão de Gabriel. Por que ele parecia incomodado ao ouvi-la dizer "sim"?, relembra, intrigada. Era como se houvesse acabado de convencê-lo a marcar presença no mesmo lugar, ainda que contra a vontade dele.

Tinha de reconhecer afinal, que a preocupação do veterano era um pouco tocante. Jamais esperaria tamanha sinceridade e consideração como recebera dele. E talvez fosse exatamente isso o que a deixava sem palavras. Gabriel era uma turbulência de sentimentos. E Luna não sabia se deveria conhecer cada um deles.

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Gabriel deitara-se pela tarde e caíra no sono, em uma de suas tentativas frustradas de expulsar as lembranças. Naquele dia, deveria, de todas as maneiras bloquear sua mente, ou seria capaz de enlouquecer apenas por se lembrar do quão idiota fora ao se intrometer na vida da caloura.

Ao longo dos meses, aprendera a se conhecer melhor e interpretar cada sensação que lhe tomava conta. Esquecera-se das boas, mas as ruins estavam ali, guardadas em seu peito, como se esperassem pela primeira oportunidade para se revelarem. Aprendera também a como bloqueá-las, conforme lhe convinha. Entretanto, agora estava descobrindo sentimentos os quais imaginava não ser mais capaz de sentir. Luna despertava nele, acima de tudo, uma irritante curiosidade. Justo ele, que andava de mãos dadas à indiferença, agora pensava em quem exatamente era aquela garota dos olhos profundos e ingênuos, lamenta. Sem falar naquele jeitinho doce e educado que lhe causava vontades estranhas... Mas afinal... Por que é que seu corpo reagia agora de maneira tão diferente a um simples "Oi"?, questiona-se embasbacado

Isso tudo era tão louco, a seu ver... E a loucura não combinava muito com ele. Não estava satisfeito com o rumo que sua mente tomava a cada momento que se lembrava de Luna, mas sabia que precisava ir à festa. Queria agir como de costume, e pensar que o que se passava na vida da garota não era de sua conta. Mas ela era tão doce... Tão linda..., relembra.

Levanta-se então da cama, rudemente. Não deveria perder tempo refletindo sobre aquilo. Vai até o guarda roupa e, de lá, tira um violão. Volta para a cama e se senta, posicionando-o, enquanto fecha os olhos, buscando seu constante refúgio na melodia que o aguarda.

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