O testemunho da noite

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Maura pensou ter ouvido batidas. Mas apenas o ressonar de sua irmã invadia o quarto em que elas dormiam. Ela tornou a deitar a cabeça no travesseiro.

Mas logo se levantou. As batidas continuavam. Vinham da porta da frente. Quem poderia ser àquela hora?

Ela levantou-se e encontrou a mãe que vinha de seu próprio quarto.

- Quem será? - Deirdre sussurrou. Alvorada era uma cidade segura. Mas era uma cidade relativamente pequena e quase todos sabiam onde a família do delegado morava.

Maura voltou ao quarto e pegou o taco de basebol que o irmão costumava usar quando criança e o carregou atrás de si enquanto se aproximava da porta com a mãe.

- Quem é? - perguntou Deidre com a mão na maçaneta.

Uma voz abafada, porém audível para as duas mulheres, fez-se ouvir:

- Isaias Almeida. A Maura está?

Mãe e filha olharam-se surpreendidas e o coração de Maura começou a bater mais rápido dentro do peito enquanto Deidre abria a porta.

Elas viram o rapaz parado com uma expressão difícil de decifrar. Podia ser interpretada como medo e alívio ao mesmo tempo.

Sem ao menos cumprimentar a dona da casa, ele entrou e pegou Maura pelos ombros.

- Você vai embora amanhã? - perguntou sem rodeios.

- Embora? - ela o fitou sem entender. - Não. Sim. Quer dizer eu vou. Mas não amanhã.

Ele a soltou, passando a mão pelos cabelos numa tentativa de se acalmar.

- Mas a Regina disse que o chá era uma despedida... - uma luz de compreensão passou pelos olhos dele. Sorriu. - Mulher abençoada. Preparou-me uma armadilha.

- Que armadilha? Do que você está falando?

- Espere um pouco. - Deidre aproximou-se. - Você não é o Dr. Almeida, marido da Regina que é amiga de escola da Maureen?

Isaias olhou para a dona da casa.

- Sim, eu era. Perdoe-me o mau jeito em sua casa, senhora O'Donnell, mas o desespero ditava meus atos. Eu preciso muito falar com sua filha. - ele fitou Maura de um jeito que Deirdre logo imaginou que talvez devesse deixá-los a sós.

- Bem, - disse ela lançando um olhar para a filha - talvez eu devesse preparar um chá calmante para todos. Com licença. - com sua calma característica, Deirdre foi para a cozinha.

Os dois se olharam, mas nenhum dos dois tinha coragem de iniciar uma conversa que sabiam ser esperada há anos.

- Maura, eu...

- Isaias, eu...

Iniciaram a conversa ao mesmo tempo. Calaram-se ao mesmo tempo. Olharam-se. Quando por um milésimo de segundo, ela abriu os lábios para articular uma palavra, ele aproximou-se dela e a beijou. Um beijo não só de lábios, mas de lágrimas, de pulsar de corações. Isaias sentiu o gosto salgado das lágrimas que os olhos fechados dela deixavam correr. Maura sentiu o leve toque das mãos dele em seu rosto.

- Eu vim para lhe entregar a minha alma, o meu corpo e o meu coração. - Isaias se declarou.

- Mas eu não poderei lhe entregar meu coração, Isaias. - respondeu Maura

Não era o que ele queria ouvir.

- Por que não?

O sorriso dela refletia todo o amor que ela guardara por quinze anos.

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