A Remissão da Pária

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Após o enterro de Lily, as coisas pareciam ter se estagnado. A vida parecia ter voltado ao normal na segunda feira. Regina continuava o seu trabalho no cerimonial, mas sempre ficando tensa cada vez que saía à rua, temerosa de encontrar-se com Sérgio. Maura descobriu gostar das tarefas domésticas que dividia com a mãe e a irmã. Até visitou a escola onde a irmã dava aulas. Sentiu nostalgia ao percorrer novamente os corredores do colégio Alvorada. E Teresa começou a curtir seu período de descanso ao lado da família, mas sem deixar de planejar com Ruth um novo concerto para apresentar ao seu produtor musical quando voltassem a Europa.

Sérgio continuou o tratamento de fisioterapia com o Dr. José Ricardo enquanto Joana se dividia entre acompanhar Sean na coleta dos depoimentos e uma nova diversão: ensinar Sérgio a atirar com a mão esquerda. Ela ria a valer com a frustração do parceiro cada vez que ele errava o alvo. Logo ele que era considerado um dos melhores atiradores da policia federal de São Paulo.

Numa dessas tardes, Joana acompanhou o policial Jorge à casa dos Andersen. Foram recebidos por Teresa que já os aguardava. Enquanto o policial terminava de tomar o depoimento de Teresa, Joana distraiu-se admirando a casa, já que sua presença não se fazia mais necessária. Estava admirando um quadro quando um ruído chamou sua atenção. Sentada numa espécie de varanda, uma mulher lia um livro e ouvia música ao mesmo tempo. O pé batia no chão acompanhando as batidas da música. Embora parecesse absorta na leitura, Joana percebeu quando ela disfarçadamente olhou em sua direção. A mulher aparentava uns cinquenta anos, mas o cabelo à moda Joãozinho lhe dava um ar jovial, assim com o corpo esbelto que daria inveja a muita jovenzinha.

Joana perguntava-se quem era aquela mulher quando Jorge se aproximou dela e lhe tocou o ombro para irem embora. Ela ainda lançou um olhar em relação à mulher sentada, mas teve que seguir o policial.

Ruth fechou o livro e o colocou sobre a mesinha. Levantou-se e esticou o corpo como uma gata. Quem será que era a bela morena que estava lhe comendo com os olhos? Caminhou até a sala, onde distraída, Teresa dedilhava o piano.

- E então, tentando compor alguma melodia?

- Não. Só pensando em algumas coisas.

- Humm... Cem euros pelos seus pensamentos.

- Guarde o seu dinheiro. - respondeu Teresa. - Não é nada importante.

Ruth correu os dedos sobre o teclado.

- E quem era a mulher que acompanhava o policial? - perguntou fingindo casualidade.

Mas Teresa, que não era boba nem nada, olhou a assistente com um ar curioso.

- Por quê? Ficou interessada?

- Não nego que a achei bonita. Um tanto rude, mas bonita.

- Aquela é a parceira de Sérgio Campos na policia federal. Joana não sei o quê.

- Policia Federal?! Que perigo... - brincou Ruth. - Interessante. Eu acho que vou dar uma saída.

- Quer companhia?

- Não... Quem sabe eu encontro alguém por ai. - disse ela pegando sua bolsa e saindo.

Teresa balançou a cabeça. Só mesmo uma possível paquera para tirar Ruth de casa. Ela voltou a dedilhar uma canção no piano.

***

Ruth saiu andando meio sem rumo pelas ruas. Ela queria encontrar a bela policial, mas não queria parecesse de propósito. Tudo que parecia de surpresa era melhor. Ruth deu uma volta pela praça evitando passar pela delegacia. Sem perceber, acabou chegando à rua em que seus pais moravam. Parou na frente da casa deles. Por incrível que pudesse parecer, a casa continuava do mesmo jeito. Sem graça. Paredes brancas, portas cinza. Insípida como a vida das pessoas.

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