Epílogo - Saber ou não saber

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Penitenciária de Lucélia

Um ano depois

- Tem certeza que quer fazer isso. – perguntou Sérgio.

- Tenho. – respondeu Regina. – Já adiei esse momento por muito tempo.

- Está bem. Então vamos. – o marido saiu do carro e abriu a porta para ela.

Quando Regina manifestou o desejo de ir ver Almeida na prisão, Sérgio foi inteiramente contra. Nunca a sua esposa, o seu bibelô amado iria por os pés numa prisão. Mas ele desconhecia a teimosia de Regina. E, depois de um ano da prisão do ex-sogro, Regina cruzava os portões de ferro da penitenciária na cidade de Lucélia, no interior do estado, para ter as respostas para suas perguntas.

Os dois caminharam por extensos corredores até a ala das visitas. Lá sentado em uma das mesas estava Almeida como se esperasse a visita dela em uma sala de visitas qualquer.

Sérgio quis acompanhá-la, mas ela pediu que ele ficasse longe. O marido era temperamental demais e talvez pusesse tudo a perder se Almeida fosse desrespeitoso com ela.

- Minha norinha... Desculpe-me não levantar para abraçá-la. É que não posso ter contato físico com ninguém de fora.

- Nem eu queria isso, senhor Almeida.

- Nossa! Tanto rancor...

- Você sabe por que eu estou aqui. – Almeida a olhou sem dizer nada. Regina limpou a garganta e perguntou

- Você matou os meus pais?

Almeida reagiu como se pergunta o ofendesse.

- Eu?! Eu não. Eu mandei outro fazê-lo. Não iria sujar minhas mãos.

- Sávio Nogueira.

- É o playboyzinho que achava que a vida era só festas, mulheres e gastar dinheiro com cocaína. Pelo menos para isso ele foi útil.

- Mas por quê? Meu Deus, seu filho era genro dele. De um juiz.

- Sim! E inicialmente o meu plano havia dado certo. Meu filho tinha a respeitabilidade de ser genro de um juiz. Eu estava acima de qualquer suspeita. Quem acreditaria que um juiz daria sua única filha em casamento ao filho de um bandido? E havia outra coisa também.

- O quê?

- O pagamento de uma dívida.

- Você devia algo para o meu pai?

- Não criança. Seu pai me devia. – Almeida inclinou-se para frente – Você vai adorar essa: seu pai, o respeitável juiz Paulo Moraes era um viciado em jogo.

- Mentira! Seu desgraçado mentiroso. – Regina gritou. Sérgio veio na direção deles, mas com a mão ela pediu que ele parasse. – Isso é uma mentira.

Ele nem se abalou com a explosão dela.

- Você quer saber a verdade, não quer?

- Quero. – ela tornou a se sentar.

- Então fique quietinha. Porque se continuar com os elogios, eu peço para ir embora e adeus respostas. – Almeida recostou-se na cadeira. - É verdade. Seu pai gostava de um carteado. E perdeu muito dinheiro em um dos meus cassinos. Então você foi o pagamento da dívida dele.

Regina olhou para ele enraivecida. Mas ao fixar o olhar no dele a verdade foi se abatendo sobre ela como o peso de um container.

Seu pai, seu herói na infância e juventude a vendera em troca do perdão de uma dívida de jogo.

- Então por que você o matou? A ele e a minha mãe?

- Seu pai havia voltado a jogar. Mas dessa vez eu não poderia ajudá-lo. Ele havia sido apresentado a um grupo de jogadores em Brasília. Gente que jogava pesado. Desesperado ele me procurou dizendo que precisava de ajuda ou ele iria morrer. Ele devia trezentos mil reais.

- E você o ajudou com essa quantia?

- Mesmo que ele vendesse a casa em que eles morassem não daria. E se isso viesse à tona, ele perderia o emprego como juiz. Mas que só não metia uma bala na cabeça, por que não queria que a última lembrança que você teria dele seria a de um velho fraco, viciado e suicida.

Ele fez uma pausa.

- Eu disse que iria ajudá-lo, mas não disse como. No final tudo acabou bem. Eu acabei assumindo o jogo em Brasília também. Fiz isso para que eles não fossem atrás de você e consequentemente de Isaias. Sua mãe, infelizmente, foi um imprevisto. Uma pena, ela era uma mulher muito bonita. – não havia o menor arrependimento na voz dele.

Regina olhou estarrecida para ele.

- É nisso que você acredita? É o que você pensa quando deita a cabeça no travesseiro. Que matou duas pessoas para ajudá-las? Você é um verme desprezível. – ela se levantou. Os guardas tomaram isso com o fim da conversa e vieram para levar Almeida embora.

- Pode até ser. Mas quem quis saber a verdade foi você. Devia ter ficado sem sabê-la. – disse ele ao sair.

Regina foi obrigada a concordar com ele.

A mulher que saía da penitenciária não era a mesma que havia entrado. A Regina que saia agora era mais consciente das falhas das pessoas. Todas as pessoas eram boas e más. Amavam e odiavam. Eram dois lados de uma mesma moeda. Ela olhou para o marido ao seu lado. Ele também já a decepcionara, assim como ela a ele. Mas o tempo mostrara que valia a pena lutar pelos sonhos. E quando ela se lembrava dos amigos, da filha, do homem ao seu lado e até de seus pais, Regina tinha certeza que o amor valia qualquer sacrifício.

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