"O que existe além da metamorfose é mistério e silêncio."
"Deixe a luz invadir e possuir o que a escuridão ainda não corrompeu,é um espaço vazio entretanto repleto de possibilidades...Deixe fluir."
O que começou sem notoriedade encontrou no seu fim uma mensagem maior do que a certeza de justiça.A história marcada por um ódio inexplicável e ações que sempre trouxeram consequências graves para cada um dos envolvidos teve a profunda culpa como o peso definitivo de um ser humano cansado de tentar;cansado de insistir em si mesmo.As lágrimas eram as únicas companheiras agora que o responsável por toda aquela dor e angústia tinha partido para sempre;todos estavam imersos.A carta deixada pelo homem de olhar atraente e poucas palavras passou pelas mãos de cada um dos membros da família Mendel que tinha interesse naquela história terrível,principalmente aqueles a quem de alguma forma feriu ou deixou marcas durante sua trajetória.
Foi difícil entender como aquele jovem havia se tornado um assassino tão cruel,e sempre que tentavam defini-lo era como dar tiros no escuro,não existia resposta cabível ou suficientemente coerente.Helena sofreu por vários dias depois de ler aquela carta,e nada podia afastar tal mágoa de seu coração;parecia um recado do destino,lhes dizendo que mesmo quando tudo estivesse em ordem,todos ainda poderiam sofrer por conta de seu irmão.Depois de tanta paz,a tempestade mais uma vez destruía o litoral de sua alma sem a menor piedade,e dessa vez era ainda mais forte e avassalador.
Entretanto,duas pessoas quase cederam à tristeza daquele golpe inesperado e isso parecia notável diante de suas relações afinal.Caroline quase perdeu o bebê dias depois de ler a carta,mas por sorte foi apenas um sangramento devido à sua pressão arterial.Depois de entender que Philip havia cometido suicídio,já não havia mais mensagem ou sentido naquela casa vazia e sem seu olhar.Caroline estava sozinha agora,sem o pai que a amava e sem o homem a quem ensinou à ver o mundo em cores;mas não tão só quanto antes.Todo aquele tempo longe de tudo,longe das possibilidades de uma profissão que era seu sonho...Tudo isso serviu apenas para fortalecer sua capacidade de ver o mundo e identificar a realidade de cada um.
O maior impacto veio pouco tempo depois,quando Caroline já estava na cidade e decidiu depor sobre Philip.As investigações já haviam sido arquivadas há cerca de dois anos,mas ela entendeu que seria o certo à fazer;seria a decisão dele também.O caso veio a tona novamente e as pessoas tinham a opção de simplesmente não se importarem ou agirem como juízes de um homem morto.Alguns mostravam hostilidade quanto à integridade da jovem,que por muitos era acusada de ocultar um assassino frio e sem alma por simples capricho ou insanidade.Outros tentavam compreender toda sua situação,e acima de tudo como seria seu futuro com um filho daquele homem;essa era a maior e mais fatal incerteza dela também.
As vezes,todos fecham as portas quando estamos feridos mas o auxílio surge do acaso,e não por acaso de alguém com alma de mais.Caroline se preparava para uma longa viagem até outro estado,queria recomeçar sua vida tendo seu filho como única companhia real,mas a insegurança ainda era grande.Ficou hospedada numa pousada por quase duas semanas,quando numa manhã de terça-feira a dona do estabelecimento informou que uma senhora a esperava na recepção.A jovem não conhecia ninguém além de amigas da época da faculdade,mas decidiu ir ao encontro da mulher.
Na recepção,uma senhora com aparência jovial e um olhar meigo,que passava confiança e respeito;além de lhe parecer similar em algum aspecto.Caroline descobriu pouco tempo depois que aquela era Lúcia,ninguém menos que a mãe de Philip e sua sogra.As duas conversaram por quase uma hora,e a emoção das duas tornou-se uma só quando Lúcia soube de sua gravidez.
-Quanto tempo minha querida?-Perguntou ela emocionada
-Quase cinco meses,eu descobri faz pouco tempo...-Respondeu
As duas tentavam preencher o vazio de Philip com a certeza de que aquele filho não seria só mais um em um mundo cheio de crueldade,ele teria um futuro em potencial e depois de muitos assuntos,chegaram a conclusão de que o melhor seria criar o bebê sem causar algum tipo de afastamento daqueles que iriam amá-lo e cuidar para ter toda proteção possível.Todos seriam uma única família agora,sem distinções ou acusações apenas a aceitação de que sem harmonia e equilíbrio nada iria funcionar.
Talvez o destino realmente tenha sido cruel de mais com cada um deles,mas em meio ao caos houve luz,e isso era inquestionável.Duas novas promessas de paz cresciam juntas agora:Gabriel e o pequeno Carl,nome escolhido por Caroline em homenagem ao pai.Os dois cresciam como irmãos,sem nenhum tipo de conhecimento sobre nada além de seu mundo particular e repleto de sonhos infantis e desenhos nas nuvens.Talvez,em determinados aspectos a luz tenha vencido afinal.
Ninguém soube dizer com exatidão o que houve com Philip,e apesar da carta indicar seu suicídio ninguém também se dispôs a realizar buscas por seu corpo ou algo relacionado a essa questão.Ele costumava sentar na varanda e olhar o horizonte,enquanto desenhava círculos na terra.O que ninguém sabia era que em uma de suas caminhadas de rotina,o homem encontrou um lugar lindo,similar ao lago que tanto gostava na infância.Era um tipo de gruta com um grandiosa e linda queda d'água,com uma lagoa adjacente.Foi do alto daquela rocha em que pela primeira vez admirou as águas turvas que Philip saltou para o abismo;não o fim,mas o recomeço de sua história.
Ele queria voar,libertar-se das cordas que o manipulavam e da culpa que o consumia,e aquele local era intocável e sagrado de mais,o lugar perfeito para que a justiça ocorresse sem julgamentos ou acusações atormentadas.O homem responsável por dezenas de mortes tornou-se apenas uma folha seca jogada ao vento,perdido ao acaso para apenas encontrar as respostas que tanto queria.A dor parecia menor quando se aproximou daquela imensidão acolhida apenas pelo som da água batendo nas rochas,e o mundo fora da gruta começava lhe parecer irreal novamente.Ele olhou para todos os lados e as paredes negras de uma gruta úmida não devolveram-lhe o olhar.Seus sangue fervia nas veias,a adrenalina corria em todo seu corpo e isso era fascinante e assustador.
Seus pés na rocha,seus olhos na escuridão que o aguardava e sua alma acolhida em silêncio...Tudo parecia um sussurro inesperado,quando pulou e mais nada se ouviu depois disso.Não havia mais dor,nem culpa;apenas escuridão e paz.
Philip Mendel morreu aos 29 anos,deixando mulher e um filho.
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Os Irmãos Mendel
Ficción GeneralAté onde a loucura pode levar alguém?Existem limites?