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E nada como duas semanas corridas e intensas em Manhattan para trazer-nos de volta à realidade e fazer-nos esquecer um belo rabo de saia. Ou ao menos, assim deveria ser.

Após passar o penúltimo fim de semana em Chicago, com mamãe saltitante pela minha presença e Maite resmungando pelos cantos por minha futura nova longa ausência, lá estava eu, tentando liberar as energias acumuladas por meio de minha já rotineira corrida matinal pelo Central Park. Antes de sair, havia ligado para o escritório. Andy confirmara que não havia compromissos para aquela manhã, o que veio bem a calhar. Eu precisava daquela corrida. Precisava desviar os pensamentos daquela mulher misteriosa que não me saía da mente desde a noite da festa, semanas atrás. Era inevitável, seus vestígios iam sumindo de minha mente enquanto os dias iam passando, seu cheiro, que antes fora tão marcante, já se misturava com os demais, em minha tentativa de encontrá-lo por aí. E eu vira tão pouco de seu rosto. No fim, a imagem que eu tinha agora era um simples borrão da mulher espetacular que havia sido duas semanas atrás, quando aparecera e desaparecera de minha vida quase que num piscar de olhos. Sim, ela simplesmente sumira. Sem deixar vestígios. E eu mal sabia quem era. Se eu não fosse um cara extremamente racional, cogitaria a hipótese de tudo não ter passado de uma miragem. Ninguém havia visto a tal loira, sabia quem era ou como fora parar ali. E ninguém a vira saindo também. Christopher o único que havia compartilhado comigo daquela visão , quando reapareci no ginásio já estava trocando as pernas, quase chamando urubu de meu louro. Não era uma fonte segura de informações, definitivamente. Procurei por todo o canto, perguntei a alguns conhecidos. E nada. Desisti e, pouco tempo depois, estava deitado, já em meu antigo quarto, olhando aquelas mesmas estrelas de plástico, que agora brilhavam iluminadas no escuro. No fim do dia seguinte eu voava de volta a NYC.

E aqui estava agora. Duas semanas depois, suando como um louco, os cabelos (que ainda precisavam urgentemente de um corte) emaranhados, a camisa colando ao corpo pelo suor enquanto corria de volta para casa e para um bom banho morno.

Quando alcancei o prédio, parei ao ver a movimentação incomum que o rodeava. O porteiro gesticulava, enfático, negando qualquer coisa que uma das pessoas que o cercava dizia. Em volta um sem número de malas ocupava o chão próximo ao elevador. Abri a porta de vidro com cuidado e a deixei fechar-se silenciosamente antes de levar a mão ao ouvido e retirar os fones onde a radialista - aquela mesma provável velha encalhada feminista - ainda reclamava dos homens. Ninguém viu quando me aproximei. Nem conseguiriam, na verdade, tendo em vista a balbúrdia em que se encontrava aquele hall. Então, mais uma vez, parei e escutei.

- Mas é um absurdo! - uma ruiva dizia, irritada, gesticulando enquanto era contida por uma outra mulher, loira. Sua voz era estridente e aguda, e ela não parecia se esforçar muito para abrandá-la. E se você não conhecesse ninguém por aqui? E se não tivesse com quem deixá-lo? O que faria com Peg?! Abandonaria por aí?

- Dulce, está tudo bem e você está fazendo um escândalo, percebeu? disse, num tom de confidência, mas alto demais para ser ouvido por todos. Inclusive por mim.

E aquela voz... Eu conhecia. Franzi o cenho e me forcei a pensar.

- Que se dane, quem tem que manter a pose aqui é você deu de ombros, meio que rindo e eu fiz uma careta.

Por mais que eu tentasse assimilar e descobrir de onde conhecia a voz da outra mulher, era em vão. Balançando a cabeça, voltei a colocar os fones, desistindo de acompanhar toda aquela ceninha fútil.

E então a feminista voltou a falar em meu ouvido. Deixei o queixo cair alguns poucos centímetros quando o reconhecimento me atingiu em cheio, um sorriso começando a se forjar em meus lábios. Tirei o fone outra vez, começando a entender de onde conhecia a voz da loira que agora pegava uma das malas enormes, totalmente auto-suficiente.

O Pecado Mora Ao LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora