Mas, como Dulce sempre dizia, não adiantava rezar e não colaborar com o santo. E, bem, eu não fazia força nenhuma para sair dali. Meus pensamentos gritavam contra toda aquela inércia, mas era como se meu cérebro não me guiasse mais. E, ai, com os olhos bem abertos, eu fui vendo-o se aproximar, bem lentamente. A cada segundo que eu desperdiçava para sair de seus braços, aquele verde inconfundível se aproximava mais. Mais. Mais...
- Senhor...
E aí eu saí do transe de forma brusca! Afastando-me dele, quase corri para o outro lado da rua. Já seguramente longe de suas mãos, olhei para o anjo enviado por Deus que interrompera aquele meu grande e insano momento de loucura (sim, bem redundante assim mesmo). Era um dos garçons da confeitaria, com algumas moedas na mão.
- O senhor esqueceu seu troco.
Poncho buscou meu olhar, mas eu não o encarei de volta. Não sabia se eu tinha mais vergonha de mim, da situação ou dele. Maldita instabilidade gerada pela gravidez! Quando não encontrou resposta, ele virou para o garçom e pegou as benditas moedas.
Alfonso: obrigado - respondeu, acho que ainda meio perdido com tudo aquilo que tinha acontecido. Ou era eu querendo que ele estivesse também se sentindo daquele jeito. Tanto faz. - Mas não precisava e... que seja - deu de ombros e guardou as moedas diretamente no bolso. O garçom voltou a entrar e nós ficamos outra vez sozinhos. Ele, eu e minha consciência desbocada.
Um silêncio pesado se instaurou entre nós, e ele teria se prolongado se eu não o quebrasse, louca para me livrar logo daquele martírio.
Anahí: vamos. Ainda tenho muito o que fazer hoje.
Aquilo soou ridículo, mas foi o único que consegui dizer seguramente, sem gaguejar. Ele não respondeu de imediato e, cuidadosamente, lancei o olhar até onde ele estava. Sério e impassível. Se ia dizer alguma coisa, desistiu. Dando de ombros, arrastou a cadeira e passou por mim, seguindo para o carro estacionado do outro lado da rua.
Eu o segui. Em silêncio.
ALGUNS DIAS DEPOIS.
Anahí: não, está tudo bem. Eu só acordei mais enjoada que o normal. Acho que vou fazer greve de fome até essa criança sair de dentro de mim!
Dulce: ainda me choco com a forma carinhosa com que você fala desse bebê.
Soltando uma risada divertida, ajeitei o telefone contra o ombro e a orelha e despejei um pouco da água quente da chaleira na caneca que tinha recém colocado sobre a pia.
Anahí: você sabe que agora é da boca pra fora. Já me acostumei à ideia de ter um sugador de energias bem aqui, dentro de mim.
Dulce: olha só, sugador de energias...
Anahí: ai, Dulce, deixa de ser toda certinha! Nós sabemos que você não é - ralhei divertida, enfiando o pacotinho de chá dentro da caneca. - Quando você tiver um filho, vai saber do que eu falo! E eu vou estar aqui para rir da sua cara.
Dulce: eu não vou ficar chamando meu filho de 'essa criança' ou de 'bebê' como você faz. Muito menos de algo que o faça parecer um monstrinho que suga minhas energias.
Anahí: como você é dramática! Ele não tem nem sexo ainda, como vai ter nome? Portanto, por enquanto é simplesmente uma criança ou um bebê - expliquei, voltando a segurar o telefone com uma das mãos, enquanto a outra carregava a caneca e eu seguia para a sala. - O resto, você sabe que é brincadeira. E não me irrite! Não dormi bem hoje, preciso de alguém pra liberar minhas frustrações. Não queira ser você.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Pecado Mora Ao Lado
RomantizmAlfonso sempre foi um playbozinho quando adolescente; no colégio, o mais popular, o mais bonito, o menos acessível, aquele com quem as meninas dariam tudo para serem vistas em companhia. Aquele que brincava com tudo e com todas; aquele que fazia apo...