Capítulo 1 - O moinho

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Esfrego mais uma vez o vidro embaçado da bancada, onde os anzóis se escondem. É teoricamente impossível retirar toda essa sujeira impregnada de, sei lá, trinta anos atrás. É repulsivo! Toda vez que sou designada a limpá-la fico imaginando o que já deve ter passado por aqui para deixá-la neste estado tão deplorável: botas de couro enlameadas, peixes estragados, suor e digitais. Várias. Deve ter pelo menos cinquenta. Uma combinação esquisita de genes.

Solto um gemido baixinho.

Soa o sino da porta na entrada.

Ótimo! Mais um cliente de barriga suada.

Desvio a atenção do pano bege claro e levo os olhos para frente. Não é nenhum cliente, é pior. Lá está meu chefe, Josh Owen. O homem mais nojento que tenho a infelicidade de conhecer.

Sua blusa branca larga sempre tem uma mancha amarela de sei-lá-o-que. A barba escura é grossa com fios brancos se destacando, indicando o começo da velhice. E baixinho. O jeans surrado arrastando no chão. O cheiro é de peixe e – paro para puxar o ar – uma falta de desodorante.

Engulo em seco e volto para minha atividade potencialmente desgastante.

Não é o melhor trabalho do mundo, sem dúvida, mas é o que estava disponível. E no momento não posso recusar, já que estou juntando minhas coisas e saindo de casa. Não é grande coisa, para alguém da minha idade, mas independência não tem preço.

Josh solta um pigarro e volto a olhar para ele. Balança um grosso e grande envelope branco com letras garrafadas no canto formando "Stanford".

Franzo os lábios.

–Olha só... – ele começa – a pequena Katherine quer ir para a faculdade.

Odeio quando é irônico comigo.

–Devolva – peço com cautela, estendendo a mão.

–Não sei não. Acho que eu podia muito bem...

–Devolva Josh! – o interrompo em um tom que soa como uma ordem. Recuo o olhar, com medo de sua reação.

–Olha aqui – ele quase grita – não quero mais receber correspondências suas no meu estabelecimento, ouviu? A próxima vai para o lixo!

Respiro fundo. Não tem como ele ficar mais insuportável! Não posso deixar que as cartas de admissão das faculdades sejam entregues em casa. Meu pai iria rasgá-las e dizer que nós não temos dinheiro para isso.

–Ah... – ele volta a rugir – e é Sr. Owen para você!

Conto até dez para não perder a paciência.

–Sim, Sr. Owen. – respondo de má vontade e o envelope branco cai sobre meus pés.

–Estou saindo para pescar este fim-de-semana. Então... vocês – ele aponta para mim e depois para Tray, que o olha por cima dos grossos óculos – estão dispensados.

Pescar escondido é claro! Eu sei que ele vai me mandar...

–Mas quero que leve os anzóis usados para casa e lave bem, até ficar brilhando.

Sorrio com amargura.

–Ah, é claro! – digo com uma falsa empolgação. Apesar de limpar os anzóis asquerosos, ir para casa é o que mais desejo.

Agacho até o chão e tomo o envelope em mãos. Largo o pano em qualquer lugar, com o cheiro do alvejante maldito impregnado em meu nariz. Enquanto junto minhas poucas coisas, observo Tray tirar o avental ridículo que Josh o obriga a usar. Atravesso a bolsa no corpo e o espero para sairmos juntos.

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