Capítulo 3 - Presente

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A casa de Jane é mais longe do que eu imaginei. Ou talvez o medo entalado em minha garganta só está alongando o caminho. Eu e ela não conversamos nada e não sei dizer se o silêncio está me fazendo bem. Às vezes nos encaramos, mas sempre faço questão de desviar o olhar o mais rápido possível.

O som está ligado. Eu conheço a música e a canto baixinho em uma tentativa de aliviar a tensão, mas minha mão segurando na porta treme. Minhas roupas ainda estão molhadas e meu cabelo pinga água, me congelando aos poucos. Além disso, sinto tanta fome que posso devorar um javali a qualquer momento.

Olho para a janela desejando que a chuva passe logo para que eu possa sumir, ir para longe.

Jane parece apreensiva.

-Você sabe que eu não vou te morder, não é? - ela sorri para mim e volta a atenção para as ruas. Realmente... ela não parece o tipo de pessoa amedrontadora.

-Por que você esteve na minha casa Jane? Se é que seu nome é Jane... - digo com desdém.

-Meu nome é Jane! Meu Deus, eu já disse que não tenho motivos para te machucar. Eu nem te conheço direito! - exclama estridente. Paro para pensar e acredito nela por um momento. Se quisesse me machucar teria feito isso na primeira vez que nos encontramos.

-Mas essa é a questão: se você não me conhece como entrou na minha casa? - ergo a voz acima do rádio. Não consigo tirar isso da cabeça, porém não estou em condições de discutir qualquer coisa. Afinal, aceitei a carona porque quis. Então terei que arcar com as consequências disso, até que eu volte para casa.

Me encolho no banco de couro, segurando-o com tanta força que se minhas unhas estivessem grandes o suficiente eu poderia rasgá-los.

A ruiva balança a cabeça.

-Eu estava na sua casa... para te proteger. E é assim que você me recebe?

-Me proteger do quê? - pergunto incrédula, o que deixa no seu rosto uma careta como se arrependesse de ter contado aquilo.

Jane abre os lábios mais uma sirene ocupa o som. Direciono-me para frente.

-Ah, não. - lamenta. Há alguns carros de policia parados bem a frente de onde seguimos. Os policiais se abaixam para ver através do vidro e fazem sinais com as mãos para que ela estacione.

-Estávamos tão perto! Finja indiferença. Só fale com eles se falarem com você. - ordena. - E se falarem, não faça bobagem! - Por incrível que pareça assinto com a cabeça.

Jane vira o volante e manobra o carro. Um policial alto, com um capacete preto tapando metade de seus olhos, anda até nós com a mão na arma.

Jane, tranquilamente, abaixa o vidro.

Não estou tão tranquila assim.

-Será que as senhoritas podem me dizer o que estão fazendo perambulando... - ele olha para o relógio - quinze minutos depois de soar o alarme de tempestade?

O homem se apoia na porta e coça a barba, esperando pela resposta. A chuva invade o carro.

-Ham... policial Jones. É isso, certo? Peço mil desculpas, mas eu estava levando minha prima para arrumar um emprego e acabamos perdendo a hora. Tivemos que correr para o carro. Espero que não tenha nenhum problema! - Jane diz no seu melhor tom meigo. O policial tenta esconder o sorriso.

Por que não estou surpresa? Ela tem um poder de persuasão inacreditável.

-Ora senhorita, eu não posso...

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