Capítulo 5

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A cena, vista de longe, assemelhava-se àqueles grandes momentos do cinema onde o herói surge para proteger o mocinho. Brian balançou com a atitude inesperada. A sua força foi posta à prova. Assustado, recuou. A euforia tomou conta dos alunos presentes, que de imediato formaram uma roda ao redor deles. Gritavam, conclamavam, torciam, vibravam.

Aqueles que algum dia sofreram nas mãos de Brian torciam pelo outro rapaz. Outros, pelo histórico, já sabiam quem seria o vencedor.

— O músculo do braço do Brian é duas vezes o daquele garoto. Duas, não, três vezes maior! Não tem a menor chance — disse uma voz na multidão.

— Mas ele segurou o soco — defendeu outro.

Ernest deu alguns passos para trás, tornando-se mais um observador.

Arrogante, o garoto de cabelo rastafári gargalhou. — Agora terei muito mais prazer em te socar, cabeça de ovo. Você terá história para contar em seu país. O dia que apanhou de Brian Wilson! — Então partiu em disparada.

Vários socos foram dados. O primeiro foi em direção ao rosto de Fuku. Retilíneo, Fuku moveu seu tronco para trás. Outro soco, agora destinado ao abdômen. Fuku apenas lançou-se para o lado oposto ao soco, fazendo com que o braço esquerdo de Brian cortasse o ar. Todos os outros socos também foram em vão. Acertaram o nada.

A cada soco, a potência e a velocidade diminuíam, e a torcida por Brian perdia energia. Ele até tentou alguns chutes, mas, cansado, tropeçou e caiu. A luta estava próxima do fim e já era visível quem seria o perdedor. Mas não por muito tempo.

— Seu verme! Saia de perto dele — uma voz potente sobressaiu no meio da multidão. A plateia, que estava descrente da vitória de Brian, voltou a acreditar. A euforia retornou com a chegada de Zamir.

— Você ia perder para um garoto desses? — Zamir repreendeu o amigo, estendendo o braço e o içando. — Eu fiquei te esperando na quadra para treinarmos, e aí vieram me falar que você estava de briguinha com o... — esquecera o nome do novato. — Com este aí! — desdenhou com a cabeça.

Fuku estava exausto. Não havia feito nada e agora estava numa situação ainda pior. — Eu só quero ir embora. Ele que começou — tentou em vão se explicar.

— E a nossa reputação? — disse Zamir, olhando para Brian. — Por sua causa, estamos numa situação complicada. Se eu o deixar sair ileso, nossa reputação diminuirá. Você será conhecido como "aquele que perdeu para o estranho careca". Se nós batermos nele, irão dizer que foi preciso dois para derrubá-lo. Além, claro, de que ficarão com pena dele e ele se tornará um mártir. Viu só o que você fez?

Brian abaixou a cabeça. Jamais imaginaria uma situação dessas. Para ele, seria fácil. Extremamente fácil. Quantos já não haviam sofrido em suas mãos. Mas daquela vez o tiro tinha saído pela culatra. — Deixa comigo que eu acabo com ele! — disse o brutamontes de pele escura correndo em direção a Fuku. Ergueu o punho na intenção de acertar o rosto do oponente, porém foi um soco fraco, sem força. Fuku deu um passo para trás. O item número dois do código filosófico de seu mosteiro era evitar demonstrações de luta. Mas, infelizmente, seu pé de apoio serviu de barreira e Brian tropeçou novamente. Cansado, não conseguiu sustentação nos braços, batendo a cabeça e desmaiando na hora.

O silêncio durou poucos segundos. Impressionados, alguns gritaram em êxtase. Mas não pela vitória de Fuku, e sim pela entrada de um novo oponente. — Zamir! Zamir! Zamir! — a torcida gritava. O brutamontes atacou o chinês com violência. Fuku se assustou. No primeiro soco, sentiu que aquela pessoa era diferente.

Fuku sempre foi peculiar. Desde o início de seus árduos treinamentos no Templo Shaolin, seu mestre já notara o quanto ele era especial. Talvez por isso seus treinos sempre foram os mais desgastantes e penosos. Tudo por causa de seu dom. Fuku nasceu com uma predisposição para sentir o campo energético dos seres vivos.

Entenda-se por campo energético algo como um fluido sutil emanado de qualquer ser vivo. É uma energia envolvente e mutável de acordo com as emoções, pensamentos, sentimentos e ideias de cada um. E, para cada ser, o garoto chinês "enxergava" uma cor diferente. Dependendo do estado geral de corpo-mente-alma de uma pessoa e seu corpo vibratório, a tensão e as fraquezas físicas tornam-se perceptíveis para aqueles nascidos com esse dom. Fuku havia treinado e evoluído muito.

Zamir estava com um campo energético confuso. Alternava de cor em poucos segundos, dificultando a leitura de suas fraquezas. Bons golpes foram dados por ele. Fuku até conseguiu se livrar da maioria, porém, proibido de atacar, alguns o atingiram. Felizmente, acostumado com a dor, o careca nem demonstrou reação.

Fuku fechou os olhos. Respirou fundo. Seus pensamentos se apaziguaram. Se quisesse, com um golpe preciso, dado com a faca da mão na garganta do oponente, atingiria a laringe, um dos sete chakras magnos, ou canais energéticos, do corpo humano. Com o golpe, o bulbo carotídeo seria atingido e uma grande pressão seria detectada no sistema vascular, fazendo com que o coração bombeasse menos e a circulação sanguínea fosse cortada. O sujeito rapidamente desmaiaria. Mas Fuku, além de evitar demonstrações de luta, tinha também, em seu código filosófico, o item número três: a não agressão e violência.

— Pare, por favor — pediu após esquivar-se de um potente chute.

Zamir não lhe deu ouvidos. — Verme maldito! — falou antes de voltar a golpeá-lo. Diferentemente de Brian, o qual a intensidade e a força dos golpes diminuíam com o tempo, para Zamir, elas aumentavam. Fuku estava impressionado. Realmente aquele garoto era especial. Entristeceu-se por estar usando todo esse potencial para o mal.

A força aumentou. O soco possuía a potência de dois carros se chocando. Fuku tentou desviar, porém Zamir foi mais rápido. O punho acertou em cheio a bochecha do chinês, que rodopiou no ar. Graças aos seus treinamentos, o careca fez uma manobra giratória e caiu suavemente com um único pé sobre o gramado.

Fuku permaneceu nessa posição por alguns segundos, concentrado. Lentamente, levantou os dois braços a pouco mais da altura de sua cabeça, curvando as palmas das mãos em 45 graus. Para os leigos, aquela posição esquisita mais se assemelhava a um ritual religioso extravagante, mas o careca estava elegante em seu movimento de kung fu conhecido como estilo da "garça voadora". A situação havia mudado. Os itens dois e três do código filosófico do chinês teriam que ficar em segundo plano. Um rápido pensamento surgiu em sua mente: item número um do código filosófico: usar técnicas somente para defesa.

Ernest, que acompanhava tudo no meio da multidão, lembrou-se de imediato dos filmes de Bruce Lee, mas toda aquela cena durou poucos minutos com a chegada inesperada do diretor.

— Parem vocês dois! Parem... agora! — disse, esticando os braços e ficando entre os dois. — Você! — apontou para um aluno. — Ajude-me a levá-lo até a enfermaria — indicou Brian. — Onde já se viu dois marmanjos brigarem?

— Desculpe-me, diretor Richard. Não queria que tivesse chegado a este ponto. — Fuku desfez sua pose e, unindo as mãos próximas do peito, curvou-se.

— Conversaremos sobre isso depois. A sua vinda não foi para este propósito. Agora tenho coisas mais importantes para resolver. — O diretor deu as costas e saiu. Parou perto do portão. — Vão para casa! A brincadeira acabou.

Após a sentença do diretor Richard, os alunos se dispersaram. Ernest se aproximou de Fuku em completo êxtase. — Meu amado senhor, quem é você? Como fez isso? Você é real? Finalmente encontrei um super-herói fora dos quadrinhos. — gargalhou alto colocando a mão no ombro do chinês — Me diga! Como fez isso?

Fuku sorriu sem saber o que dizer.

— Vamos! Me diga.

— Eu treino — limitou.

— Isso que vi com meus próprios olhos é surreal. Não é humano. Você definitivamente será meu super-herói particular. Falando nisso, eu moro próximo da praça.

O chinês confirmou com a cabeça desajeitado. O dia tinha sido estressante e, porque não dizer, curioso. Com certeza meditaria muito quando chegasse em casa. Ao saírem, ainda ouviu: — Essa luta não terminou, seu verme! — Com o polegar, Zamir deu um leve tapinha em seu nariz e saiu de cena.

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