[15] ISADORA

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Havia passado o dia inteiro estudando e tinha sido muita sorte a Pati entender exatamente daquela matéria, porque conseguiu me esclarecer algumas dúvidas. Ela tinha um jeito de explicar que fazia as coisas parecerem fáceis. Mas por ter acordado cedo e ficado com a cara enfiada nos livros, queimando os miolos, eu estava morrendo de sono e adormeci no meio do filme, com o meu irmão sentado na minha frente, encostado em mim, praticamente no meu colo. Acordei com ele se mexendo quando o filme acabou e a Pati e o Rafael levantando do chão, provavelmente prontos para irem embora. Como previ, a Cíntia entrou no quarto alguns segundos depois, chamando os dois.

- Não sabia que você usava óculos, Isa. – Cíntia comentou e eu dei de ombros, sem graça com todos me olhando.

- Só para ver filmes e na sala de aula. – Respondi, tentando disfarçar também minha cara amassada de sono. Afinal, eu havia acabado de acordar.

- Você fica muito bem. – Ela sorriu e eu agradeci, mas automaticamente levantei os óculos, tirando do rosto e prendendo no alto da cabeça.

- Se você precisar de ajuda com alguma máteria, me avisa. – Pati falou, enquanto me abraçava, se despedindo e saindo.

Gui correu porta afora com Cíntia e eu percebi que o Rafael ainda estava se virando para sair. Ele não estava esperando que eu me despedisse dele, né? Virei de costas ignorando sua presença como sempre. Eu ainda estava morta de raiva pelo que ele havia feito na praia, mas principalmente com vergonha. No dia que nos encontramos no shopping, eu sequer consegui olhar para ele direito, sem virar um pimentão. Bia ficou rindo da minha cara durante todo o trajeto do shopping até em casa. Ela também me congratulou sobre eu ter sido madura o suficiente ao não tocar no assunto, revidando ou causando algum atrito com a namorada dele. Eu não era maluca. Além de não ter vontade de trazer aquele assunto à tona, a Pati não merecia ficar cheia de ciúmes por nada. Ele tinha visto algo sem querer, não era como se tivesse encostado em mim ou nada parecido. E imaginar ele encostando em mim me deixava ainda mais vermelha. Precisava tentar controlar isso.

- Tchau, Isadora. – Meus pensamentos foram interrompidos pela voz dele, dando ênfase no meu nome como se estivesse me desafiando a ignorá-lo mais uma vez. Virei o rosto em sua direção e percebi, pela cara dele, que eu ainda devia estar bastante vermelha, porque o vi abrir um sorrisinho cínico. – É impressão minha ou você está pensando sobre aquele dia na praia?

- O quê? – Perguntei meio chocada, vendo ele chegar um pouco mais perto de mim.

- Você agora fica vermelha toda vez que olha para mim. – Ele ainda estava sorrindo e eu fechei o punho com raiva.

- Tenha um pouco de respeito, por favor. – Sussurrei com raiva. – Se não por mim, pela Pati pelo menos. – Notei que ele pareceu bastante surpreso com minha resposta e se afastou.

- Ei, não... – Mas eu nunca soube o que ele tinha para me dizer porque não me interessava.

- Some daqui. – Falei um pouco mais alto e o empurrei para fora do quarto, fechando a porta atrás dele.

Ele conseguia ser pior do que eu imaginava. No topo de todos os defeitos que me irritavam nele, ainda por cima o cara não tinha o mínimo respeito pela namorada. Claro que eu estava vermelha por ele. Minha mente parecia ter vontade própria e não conseguia distinguir o cara idiota do cara gato demais. Mas eu nunca admitiria isso. Troquei a minha roupa pelo pijama e me joguei na cama, doida para dormir, mas demorei para pegar no sono, pensando no que ele havia dito, no que ele havia visto e no que ele tinha nos próprios pensamentos quando eu o pegara me encarando mais cedo.

No final de novembro, eu já havia feito todas as provas de vestibular para as faculdades que me interessavam, o ENEM e só precisava me preocupar com as provas finais da escola. Um peso enorme havia sido tirado dos meus ombros quando entreguei o último cartão-resposta e saí para conferir as respostas com os colegas conhecidos que encontrei no dia da prova. A Bia e a Paulinha estavam prestando vestibular em outro local, então não estávamos juntas. Passar nas provas da escola não era, nem de longe, difícil como passar no vestibular, então eu já me sentia como se estivesse de férias. Ainda não tinha caído na real sobre o fato de que não voltaria para a escola no ano seguinte. Era uma sensação estranha e diferente. Meus sentimentos ainda estavam confusos. Por um lado, estava empolgada para entrar na faculdade, conhecer gente nova, estudar o que realmente me interessava e não o Teorema de Pitágoras, ligações de carbono ou mitocôndrias. Por outro lado, eu estava com medo do desconhecido. Estava acostumada a ter minhas amigas sempre por perto, lidar com as mesmas pessoas há anos, já saber o que esperavam de mim e quais professores eu deveria temer ou amar.

Ele e Ela [Os Dois Lados da História] [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora