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Sabe aquela maravilhosa frase... 'isso nunca vai acontecer comigo...'. Acabei de descarta-la do meu dicionário.

Não esperava por isso nem se alguém me avisasse antes. Nunca desconfiaria que essas tonturas e dores de cabeça eram resultados disso. Imaginei labirintite ou algo assim, mas um glioma no nervo ótico? Nunca! Além de ter esse nome que eu nunca ouvi falar, ainda é no olho e nunca tive problema com visão.

Quando desmaiei na rua e acordei no hospital, foi a pior sensação que já tive, sempre imaginei que cegueira era um preto sem fim no lugar das formas e cores do mundo, mas ao invés disso, é como se nada existisse, sem formas, sem preto, sem breu. A cegueira simplesmente não tem cor.

Desde que cheguei do hospital, não quero nada além de ficar deitada, não está sendo fácil, foi um baque e tanto e sinto que vou precisar de algum tempo para acostumar, ou melhor, tentar acostumar.

Andrew está sendo muito atencioso, ele foi até o hospital me ver e insistiu incansavelmente para que eu me 'mudasse' para um quarto ao lado do seu. Isso foi um ato muito fofo, mas também me deixou desconfortável. Não sirvo pra nada além de um peso dentro dessa casa. Estou aqui simplesmente para extorquir trabalho e despesas de Andrew.

Meu problema não é da conta dele, ele não tem que se responsabilizar por mim. Na verdade... por mais que me doa completamente, vou entender se ele quiser se livrar de mim. Quem ia querer namorar um peso? Quem ia querer alguém que não consegue se vestir sem colocar a blusa de trás para frente, alguém que não consegue se mover sem esbarrar em algo e jogar tudo no chão?

Não posso continuar aqui. Minha consciência está me matando! Considero fortemente voltar e ir morar com Amanda.

Amanda saiu da pensão e alugou uma pequena casa com o salário do pet-shop, além disso, ela está fazendo curso de cabeleireiro e já tem até algumas clientes.

Estou muito orgulhosa dela, ela saiu das ruas por completo, não precisa mais de homens para sustenta-la e não precisa mais fugir de ninguém.

No dia que fui a pensão encontrar com ela, não a encontrei, mas ela deixou eu endereço na recepção caso eu a procurasse. Ela está mais próxima ao seu trabalho agora.

Quando Andrew chegar vou imediatamente contar pra ele que pretendo me mudar, só preciso pensar em um jeito de convencê-lo a me deixar passar pela porta.

Não é um adeus, eu amo demais Andrew e Isobel para me privar de vê-los. Talvez eu volte quando eu melhorar. Se eles me aceitarem, claro. Sei que Andrew não vai querer nada comigo, mas é o certo a fazer. Não vou entulhar e dar trabalho para eles.

Será que estou sendo egoísta? Será que Andrew gosta tanto de mim quanto eu gosto dele? Me dou o direito da dúvida por hoje, estou confusa, está tudo muito confuso para mim.

-Charlotte? –escuto a voz de Isobel me chamando e entrando no quarto, me distraindo dos meus pensamentos.

-Sim, vem aqui, Bel. – Chamo ela tentando olhar em direção da porta.

-Papai disse que você não está enxergando. É verdade? – Ela diz com uma voz meio rouca, ela está triste. Ah... minha doce Isobel.

A cama se mexe e eu presumo que ela se sentou na beirada.

-Sim. Mas não é tão ruim. –Tento acalma-la. – E logo vou ficar boa. –Digo mais pra mim mesma do que pra ela. Não sei se vou melhorar, as chances são poucas e ainda nem sei se tem como operar.

-Promete? –Ela me pede, quase como uma suplica.

-Sim, só precisamos ter paciência.

- Eu não quero que você fique assim. –Ela pula em meu colo me abraçando com toda força que seus bracinhos conseguem. –Você vai ficar boa, papai vai te levar no médico. –Sua voz em tom de choro corta e pica meu coração em milhares de pedacinhos.

Meia Noite e Um - Completo ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora