Capítulo 28

4K 418 112
                                    

Eu até entendia o lado do Christiano, sabia que não deveria ser nada fácil ser exposto daquela maneira na situação em que ele estava, mas ele não deveria me tratar daquela forma sem ter certeza do que estava acontecendo. Eu agora estava magoado na mesma intensidade que ele sentia raiva. Não quis pensar no que aconteceria dali pra frente e fiz de tudo pra ocupar minha mente afim de não pensar nele enquanto estivesse em casa. Faltei dois dias de aula por pura insegurança, mas não só por causa de Christiano e sim
porque não suportava a ideia de aturar toda aquela palhaçada com o meu nome. Com o passar dos dias minha mágoa migrou para a raiva e qualquer coisinha seria motivo de confusão na escola, então o melhor a fazer era ficar em casa esfriando a cabeça. Mas faltar aula não ajudaria em nada, uma hora eu teria que voltar pra escola e encarar tudo de frente. E foi o que fiz.
Recebi muitos olhares curiosos e ouvi cochichos de fofoca pelos corredores, mas aquela altura já quase não incomodava mais. Christiano não estava na sala de aula durante o primeiro  tempo e só apareceu no segundo, passando direto por mim e sentando bem longe como se não
tivesse me visto. Depois que Christiano passara pela porta minha atenção já não estava mais na aula e sim nele. Toda hora eu o olhava, mas nenhuma das vezes ele me olhou de volta ou deu algum sinal de que estivesse com menos raiva de mim.
No intervalo foi a hora que senti mais falta dele, pois nós sempre ficávamos juntos conversando e comendo, mas agora eu estava sozinho, nem com os meus amigos eu quis ficar naquele dia. Depois de pegar o meu salgado e refrigerante, fui para a mesa de sempre, mas antes
de chegar lá alguém esbarrou em mim fazendo com que meu refrigerante derramasse no chão.

– E agora, vai dar um soco em mim? – disse Gustavo estalando o pescoço.
– Ficou maluco? – eu disse me abaixando pra pegar a latinha de refrigerante do chão.
– Ah agora vai arregar. Vem porra, não quer brigar? – disse Gustavo já se posicionando para a briga. As pessoas começaram a olhar pra nós e uma roda foi formada.
– Eu não vou brigar com você. – eu disse.

Gustavo estava disposto a brigar e eu não estava no clima. Não conseguiria brigar naquele dia, pois não estava com raiva. Gustavo não deu a mínima pro que eu dizia e disparou pra cima de mim com um soco, mas consegui desviar e só senti seu punho de raspão em minha bochecha, mas foi o suficiente pra me deixar amedrontado, pois sabia que ele não iria parar enquanto não tivesse uma boa briga. Gustavo deu um tapa em minha mão e fez meu lanche cair novamente. Desejei que Fernando ou qualquer um dos meus amigos passassem por nós e chamasse alguém pra acabar com a briga, mas todos os rostos que estavam ali a nossa volta não chamariam nenhum professor porque só queriam assistir a briga.

– Ah você vai brigar sim! Não esqueci o soco que você me deu, agora eu quero uma briga decente. – ele disse chegando mais perto.

Ele me empurrou, não com muita força, mas acabei tropeçando no pé da mesa e caí no chão. Eu não soube o que fazer quando ele mirou um soco em mim, eu não tinha nem como levantar e correr, muito menos tentar bater nele. Só me preparei pra receber aquela porrada, mas antes que Gustavo pudesse me bater, Christiano o puxou pela blusa e o tirou de perto. Meio segundo depois Gustavo estava no chão e Christiano deu três socos nele. Gustavo revidou um soco, mas pareceu só enfurecer mais ainda o Christiano.

– Seu merda! – disse Christiano com a respiração ofegante se afastando dele. – Se você me encher a porra do saco mais uma vez eu juro que te mato.

Christiano saiu do pátio esbarrando nos curiosos de plantão que formavam a rodinha e Gustavo se levantou e achei que ele fosse querer brigar comigo de novo, mas percebi que ele
estava tonto demais pra começar qualquer tipo de briga e então ele sumiu como uma fumaça.
Mesmo muito envergonhado com toda aquela atenção voltada pra mim, eu tive a ideia de aproveitar o momento e ir correndo falar com Christiano. O segui até o banheiro e lá estava ele parado de frente para a pia com as mãos apoiadas nela e a cabeça baixa.

– Eu preciso falar com você! – eu disse tentando parecer calmo.
– Quer levar um soco também. – disse ele me olhando pelo espelho.
– Não, Christiano. Eu não quero levar um soco. – eu disse com a voz firme. – Obrigado por não deixar o Gustavo me bater.
– Não fiz aquilo por você.
– OK, Christiano! – comecei a ficar irritado com tanto desprezo. – Eu só quero deixar uma coisa clara pra você: Eu não fiz nada. Eu juro! – Christiano finalmente virou de frente para mim e então eu prossegui. – Você acha que eu gostaria que todos soubessem sobre nós desse jeito? Você
realmente acha que eu gosto de vir pra escola e ouvir gente me zoando e comentando sobre a minha vida? Você acha mesmo? Acabei de quase levar um soco por causa de toda essa palhaçada... Então é bom você parar um pouco e pensar direito. Eu jamais faria isso com você e você deveria saber disso. E outra coisa, você disse que ninguém sabia sobre a gente, mas você esqueceu que recentemente a sua ex-namorada leu uma de nossas conversas e descobriu tudo.
– E como ela enviaria para todo mundo da sala? Ela não conhece ninguém além dos nossos amigos que estavam na festa. – murmurou ele.
– Christiano, alguma vez você já me viu falando com todas as pessoas da nossa turma? Eu só falo com os meus amigos e o resto eu quase nem cumprimento. A Mariana pode ter arranjado os e-mails de várias maneiras diferentes, isso é a coisa mais fácil de conseguir. Por isso ela terminou contigo e ficou tudo muito bem, porque ela já sabia o que fazer pra nos ferrar, mas você simplesmente não para pra analisar os fatos e me acusa de tudo como se não me conhecesse mais... Bom, isso era tudo o que eu tinha pra falar.

Saí do banheiro com a sensação de dever cumprido. Tinha dito tudo que estava engasgado em minha garganta e ele me ouvira calado, pois no fundo sabia que eu estava certo. Fiquei completamente tranquilo depois daquele desabafo, tanto que entrar na sala de aula e ficar longe dele já não era tão insuportável assim. Decidi não correr mais atrás do Christiano, eu já havia falado o que pensava sobre tudo aquilo e agora ele deveria pôr sua cabeça pra pensar só mais um pouco e perceber que estava cometendo um erro ao me culpar por tudo. Agora a próxima iniciativa tinha quer vir dele.

...

Quando finalmente o sinal tocou, peguei minha mochila e saí da sala de aula junto com Fernanda, Lidiane e Fernando. Não quis ficar com eles na praça, pois queria ficar em casa
sozinho sem ninguém olhando estranho pra mim o tempo inteiro. Me despedi deles e antes de atravessar a rua, Christiano veio falar comigo.

– Marcos! – disse Christiano segurando meu ombro.
– Fala. – respondi secamente.
– Pode passar lá em casa hoje? Quero conversar com você.
– Você pode falar agora.
– Não quero conversar aqui no meio da rua. – disse ele olhando em volta.
– Hoje não. Eu não estou com vontade.
– Marcos, por favor.
– Eu não estou bem hoje e não quero conversar com você agora. Amanhã a gente se fala melhor, mas agora eu quero ir para a minha casa.

Ele me olhou nos olhos por alguns segundos com um ar decepcionado e somente depois voltou a falar...

– Tudo bem. Vou respeitar sua decisão. Quando quiser conversar, pode passar lá em casa.

O AmigoOnde histórias criam vida. Descubra agora